Conselho Consultivo e Povos Tradicionais do Parque Estadual da Pedra Branca Questionam Remoções Marcadas pelo INEA

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O Parque Estadual da Pedra Branca (PEPB), criado em 1974, ocupa 10% do território do município do Rio de Janeiro, o que lhe garante o título de maior Unidade de Conservação do município e uma das maiores florestas urbanas do mundo, sendo quatro vezes maior do que a Floresta da Tijuca.

O Parque da Pedra Branca fica localizado na Zona Oeste do Rio de Janeiro, abrangendo Jacarepaguá, Taquara, Camorim, Vargem Pequena, Vargem Grande, Recreio dos Bandeirantes, Grumari, Padre Miguel, Bangu, Senador Camará, Jardim Sulacap, Realengo, Santíssimo, Campo Grande, Senador Vasconcelos, Guaratiba e Barra de Guaratiba, entre outros.

No dia 12 de dezembro de 2012, foi realizada uma reunião do Conselho Consultivo do Parque Estadual da Pedra Branca com os representantes do Instituto Estadual do Meio Ambiente (INEA), na sede Pau-da-Fome do Parque.

A pauta foi apresentada pelo administrador do PEPB Alexandre Pedroso, tendo o seu ponto chave a questão do Plano de Manejo do Parque.

Reunião do Conselho Consultivo do PEPB – da esquerda para direita Maraci Soares, do Alto Camorim; socióloga Annelise Fernandez; William Hadid do Agrovargem; e o Administrador do Parque Alexandre Pedroso.

Estiveram presentes na reunião funcionários do INEA, pesquisadores da UFRJ, uma advogada da Pastoral das Favelas, moradores da área do Parque e os membros do Conselho, sendo que alguns conselheiros também são moradores de comunidades que estão no entorno e dentro do Parque, sendo eles William Hadid, biólogo, morador do Parque e representante da Agrovargem; Maraci Soares, membro da Associação dos Moradores do Alto Camorim; e José Antônio, Vice-Presidente da Associação dos Lavradores e Criadores de Jacarepaguá, sendo ele agricultor e morador da comunidade Monte da Paz.

Segundo o administrador do parque, o Plano de Manejo do PEPB já está finalizado e nele consta que no Parque não poderá haver moradia e que o cadastramento socioeconômico destes moradores já irá iniciar em janeiro de 2013.

Esta afirmação veio de encontro a todo o processo que o Conselho veio desenvolvendo anteriormente em relação a regularização fundiária das populações tradicionais que vivem na região desde antes da criação do Parque, em 1974, e toda a população de comunidades agrícolas atuais da região.

A questão é de grande complexidade, já que a área é muito extensa e há uma variedade de casos de habitação dentro da área do Parque: condomínios de luxo, ocupações recentes, comunidades agrícolas de culturas tradicionais, cooperativas de agricultores de plantios orgânicos e comunidades urbanas. Se estima que 5000 mil residências poderão ser retiradas do parque.

O posicionamento do Conselho Consultivo do PEPB sobre o Plano de Manejo está em um documento redigido após a reunião anterior do Conselho, em junho de 2012, que norteia-se pela argumentação do jurista Evandro Satlher (2010) que afirma que a criação de uma UC sem a devida avaliação da categoria de proteção mais adequada aos usos existentes ou sem o equacionamento da questão fundiária, produz o que ele define como desterritorialização subjetiva: uma condição de incerteza jurídica em que passam a viver os habitantes de uma UC, pois a despeito de não serem removidos, tem negadas as suas formas de territorialidade e passaram a sofrer impedimentos crescentes a realização de determinadas atividades e usos do espaço.

Moradores do Alto Camorim presentes na reunião

No que diz respeito à questão fundiária do Parque, os conselheiros defendem que os procedimentos devem ser norteados pelo princípio da manutenção das famílias que se encontram no interior do PEPB por várias décadas e vivem da agricultura familiar, e que inclusive vem preservando as áreas verdes ao longo dos anos.

Dentre as razões que subsidiam esta posição ressalta-se a Lei Estadual 2.393 de 20 de abril de 1995 que “autoriza o poder Executivo a assegurar às populações nativas residentes há mais de 50 anos em Unidades de Conservação do Estado do Rio de Janeiro, o direito real de uso das áreas ocupadas, desde que dependam, para sua subsistência, direta e prioritariamente dos ecossistemas locais, preservados, os atributos essenciais de tais ecossistemas e cumpridas as exigências previstas na presente Lei (Art. 1º da Lei 2.393/1995)”.

No entanto, na última reunião do dia 12 de dezembro, o administrador do Parque afirmou que o Plano de Manejo já estava finalizado, apontando para a remoção dos moradores do Parque, o que vem de encontro ao documento feito pelos conselheiros em junho de 2012, durante o processo de elaboração do Plano de Manejo que todos os conselheiros consideravam que estava sendo elaborado de forma participativa.

Annelise Fernandez, socióloga, professora da UFRRJ e secretária do Conselho afirma, em relação a participação do Conselho e das comunidades na elaboração do Plano de Manejo, que: “Em termos formais, a participação é viabilizada nas reuniões do Conselho, nas oficinas de elaboração do Plano de Manejo e na possibilidade de revisão do documento. Na prática isto não funciona, já que os Conselheiros não são consultados (apenas informados) sobre processos decisórios e nada sabem sobre as ações do INEA que envolvem o destino dessas populações, fazendo com que os representantes (moradores conselheiros) sintam-se ‘rendidos’ frente as suas comunidades. Ainda não tivemos acesso ao Plano de Manejo finalizado, após o último pedido de modificações”.

“Apesar de fazer constar no documento (Plano de Manejo) a existência de legislações que garantem o direito de populações nativas e tradicionais em Unidades de Conservação e que devem ser feitos estudos sobre esses grupos, a reprodução da frase ‘todos os moradores serão removidos, em janeiro começaremos o cadastro socioeconômico dessas populações’, sugere que essas condições não serão respeitadas”, ressalta Annelise. “Em documento elaborado pelo Conselho Consultivo é  apontada a necessidade de formação de um grupo de trabalho intersetorial, entre as secretarias da Prefeitura, INEA, conselheiros e membros das comunidades afetadas e que qualquer medida deve ter ampla divulgação e acompanhamento da sociedade e do Conselho”, finaliza Annelise.

Maraci Soares, conselheira presente na reunião do dia 12, é moradora do Alto Camorim, comunidade que vem lutando para obter a titulação de quilombola. Maraci manifestou sua indignação durante a reunião ao ouvir que consta no Plano de Manejo que no Parque não pode haver moradia. A comunidade do Alto Camorim é um exemplo expressivo das comunidades tradicionais existentes na área do PEPB. Maraci relata que “A comunidade do Alto Camorim existe há mais de cem anos, pois o meu primo Moacir Francisco de Azevedo, que mora aqui e tem hoje oitenta e nove anos, foi nascido na comunidade e seu pai Caetano, cujo nome consta no livro de 1936, Sertão Carioca, de Armando Magalhães Corrêa, ficou a serviço de Vitória de Sá, que era dona destas terras, que vão de Camorim até Vargem Grande”.

Hoje, a comunidade é composta de duzentas casas, e tem aproximadamente mil moradores, com muitos tirando o seu sustento da agricultura familiar. Mas a paz destas famílias se transformou na preocupação constante com a ameaça de remoção.