Quinta-feira, 9 de julho, a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (CDURP) realizou o último encontro de uma série de encontros semanais, com a temática sobre a elaboração de um plano de habitação popular para a região do Porto do Rio de Janeiro.
O primeiro encontro da série aconteceu no dia 10 de junho e foi organizado pela Secretaria Municipal de Habitação (SMH). Nas semanas seguintes, um grupo de moradores da região do Porto, movimentos sociais, acadêmicos e jornalistas participaram de encontros liderados por Aberto Silva, presidente do CDURP, para discutir a demografia da área e as necessidades daí decorrentes, as melhorias das condições de vida, e finalmente, em 9 de julho, o conceito de aluguel social. Todos os encontros tiveram como objetivo atender as necessidades dos moradores atuais da área, e em seguida as necessidades das pessoas que querem mudar para a área a fim de estarem mais próximas de seus trabalhos.
Após a introdução, o Professor Orlando Santos Junior e Mariana Werneck, ambos do Observatório das Metrópoles, um grupo de pesquisa da UFRJ, fizeram uma pequena apresentação a respeito do aluguel social. O conceito é relativamente novo para os brasileiros, com São Paulo sendo a única cidade brasileira na qual tal ação foi implementada de modo mais extensivo. O professor começou relembrando ao público que “existe uma legislação internacional assim como nacional reafirmando que todas as pessoas têm direito a moradia. É tão fundamental como o direito de viver. E é a partir dessa concepção que nós podemos observar as várias experiências nacionais e internacionais a respeito do aluguel social”.
A Secretaria de Assistência Social e de Direitos Humanos do Rio de Janeiro (SEASDH) define aluguel social como uma solução temporária, benéfica para famílias que foram afetadas por catástrofes e desastres, como nos muitos casos de municípios na Região Serrana, além de Niterói e São Gonçalo, afetados pelas chuvas fortes em 2013. O aluguel social tem sido usado quando comunidades são removidas devido a implementação de projetos de revitalização urbana, incluindo casos no Complexo do Alemão, Manguinhos e Pavão-Pavãozinho, os quais receberam os projetos do PAC.
De janeiro a abril de 2015, mais de 12.000 famílias no estado do Rio de Janeiro receberam aluguel social do SEASDH, com o valor mensal variando entre R$400 e R$500.
Orlando Santos Junior sugeriu: “O aluguel social também poderia ser utilizado como uma solução permanente para moradia, garantindo o direito a moradia sem a necessidade da propriedade. Neste caso, a pessoa tem acesso a moradia pública ou coletiva, paga uma taxa para manutenção, e têm plenos direitos de moradia”. [Para diferenciar a solução temporária a solução permanente, usaremos o termo ‘locação social’ para a proposta de um subsídio de aluguel permanente.]
Ele ofereceu uma série de estudos de caso de locação social em vários países europeus, onde as políticas de habitação social variam de ofertas em complexos de habitação pública–os quais podem ser tanto públicas como pertencentes a agentes creditados (geralmente sem fins lucrativos)–até a distribuição de subsídios que permitam aos moradores alugarem no mercado privado. Neste caso, o direito de receber tais subsídios está ligado a uma certa situação social, tal como desemprego ou baixa renda. “A principal diferença entre Europa e Brasil”, diz Orlando Santos Junior, “é o fato de que a propriedade privada na Europa, sem incluir os países do leste europeu, está em declínio, com somente 56% das moradias sendo privadas, enquanto no Brasil as pessoas ainda vivem com a mentalidade que prega que ter uma moradia própria é um objetivo fundamental da vida”.
Mariana Werneck prosseguiu apresentando o caso de São Paulo, onde um programa de aluguel social composto de cinco projetos foi lançado em 2002. De acordo com os pesquisadores, o sucesso do programa se deu “em grande parte devido a sua pequena escala assim como uma certa forma de participação no processo de gestão do projeto, tanto que a construção do projeto acabou sendo ajustada para as necessidades específicas do grupo”. Aldair, da Central de Movimentos Populares (CMP), destacou este elemento do programa, sublinhando a importância da correspondência do programa com “o perfil das pessoas que têm o direito de adquirir o aluguel social”.
De acordo com Alberto Silva, a locação social é “um instrumento de regulação dos preços dos alugueis, neste caso, na área central do Rio de Janeiro, torna disponível um estoque de moradia, representando uma alternativa para as famílias que vivem na área central, perto de seus trabalhos”. No caso da área portuária, a prioridade para moradia acessível seria dada aos moradores do Porto dentro da Área de Interesse Especial Urbanístico Porto Maravilha (AIEU – Porto Maravilha). A locação social encorajaria uma renovação urbana focada em moradia, aumentando a densidade de prédios na área.
A ideia a respeito da locação social foi bem recebida pelo público. Alguns participantes, embora, criticaram o fato que o plano discutido parece não considerar outros fatores que são cruciais e necessários para a subsistência, além da moradia. Muitas pessoas apontaram a falta de instituições educacionais, supermercados e feiras livres na área e insistiram que a prioridade deveria ser construir para as pessoas que moram ali, mais do que construir novos museus e feiras descoladas para atrair turistas e cariocas da Zona Sul. É tudo maquiagem”, diz Ana, moradora do Bairro da Saúde, na área do porto.
A primeira versão completa do plano participativo será apresentada ao final do último encontro desta série de encontros que será realizado nas próximas semanas. O documento então será enviado ao Conselho Gestor do Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social. Felipe Nin da Fundação Bento Rubião, no entanto, está preocupado com os próximos passos, e disse: “Está previsto que a população possa acompanhará a execução do plano? Estas reuniões não devem acabar aqui. Precisamos seguir os exemplos apresentados pelo Observatório das Metrópoles onde as reuniões participativas são parte de um rotina, e precisamos ter a possibilidade de seguir todo o processo até ao fim“.