Iniciativa: ReciclAção
Contato: Facebook | Email
Ano de fundação: 2013
Comunidade: Morro dos Prazeres, Santa Teresa
Missão: Orientar as pessoas para um modo diferente e mais consciente de ver o meio ambiente através da educação ambiental e reciclagem.
Eventos Públicos: Oficinas de reciclagem, aulas de educação ambiental para todas as idades, cafés da manhã abertos para discutir problemas e soluções atuais.
O projeto ReciclAção começou em 2013, no Morro dos Prazeres, favela no alto do bairro de Santa Teresa, para engajar moradores através da educação ambiental com reciclagem, a fim de conscientizar e melhorar o meio ambiente da comunidade. O ReciclAção foi lançado pela organização comunitária Prevenção Realizada com Organização e Amor—PROA.
O PROA foca em questões de saúde, incluindo a prevenção da propagação de doenças sexualmente transmissíveis e a sensibilização da comunidade para a saúde através da educação. Como uma das iniciativas do PROA, o ReciclAção naturalmente também se concentra no bem-estar físico das pessoas. Ele surgiu da necessidade de lidar com o acúmulo de lixo não recolhido em torno da favela. O lixo não coletado levou à tragédia de 2010, na qual um deslizamento de terra causado em parte por detritos acumulados na encosta matou mais de 30 pessoas e danificou estruturas. Moradores decidiram tomar uma atitude para evitar que isso acontecesse novamente. Em 2011, uma coalizão de grupos ativistas, ONGs, incluindo UNICEF e CEDAPS, e jovens moradores da comunidade iniciaram uma ação para mapear a presença e os riscos de depósitos de lixo num conjunto de dez favelas, inclusive nos Prazeres.
A partir dessa experiência, um grupo de 25 jovens do Morro dos Prazeres decidiu que precisava iniciar uma ação para aumentar a conscientização sobre o lixo, com foco em sua produção, seus riscos e em como dispor adequadamente do mesmo. Ao procurar inspiração, perceberam que era difícil encontrar organizações trabalhando com educação ambiental. Todas as organizações que encontraram estavam lidando com a coleta de lixo e a limpeza para melhorar o saneamento, reparando apenas os efeitos do acúmulo de lixo em vez de trabalhar em sua causa primordial: a baixa consciência ambiental.
A partir dessa descoberta, Cris dos Prazeres, moradora da comunidade, explica que o grupo de jovens moradores chegou à “ideia de trabalhar a educação ambiental com uma nova tecnologia, pensando sobre os moradores, pensando de dentro pra fora, pensando no poder público, pensando em todos os desafios nos lugares urbanos”.
Como um dos fundadores do ReciclAção, ela define a iniciativa como “uma tecnologia social que inclina o ser humano a um outro olhar, mais consciente, sobre a questão ambiental. E é sempre de dentro pra fora”. Com a educação como sua atividade principal, a equipe do ReciclAção se esforça para conscientizar a população a ser parte ativa do ambiente que a cerca, e para criar incentivos para que cuidem dele como algo que lhes pertence.
Desde sua fundação, o ReciclAção tem organizado reuniões, palestras públicas e cafés da manhã abertos nos espaços públicos do Morro dos Prazeres, para discutir ideias, desafios e próximos passos. O grupo também distribui folhetos com mensagens educacionais ou positivas por toda a comunidade, como o ilustrado à direita, no qual se lê “O lixo que você joga no chão não fala, mas ele diz muito sobre você…”
A abordagem de três vertentes da ação para lidar com o lixo é baseada nos três R’s: reduzir, reutilizar e reciclar. A equipe instalou quarenta eco bags em eco pontos pela favela para que os moradores joguem fora seu lixo. Essas enormes sacolas ecológicas são esvaziados diariamente e seu conteúdo é separado em materiais recicláveis e não-recicláveis, para serem enviados para destinação adequada. ReciclAção também organiza oficinas para que as pessoas aprendam a reutilizar materiais, transformando-os em objetos que podem ser vendidos ou utilizados ao invés de serem descartados, dando uma sobrevida ao produto. Os participantes dessas oficinas aprendem que é possível economizar e até mesmo ganhar dinheiro com essas atividades.
Outro membro da equipe, Orlando Dato, relembra que nos primeiros dias do ReciclAção os moradores viam os jovens participantes correndo incansavelmente para cima e para baixo da favela, recolhendo lixo e limpando o espaço durante o dia todo. Esse entusiasmo e essa crença na mudança provavelmente influenciaram outros membros da comunidade, que lentamente, mas naturalmente, começaram a contribuir e jogar seu lixo nas eco bags. Cris dos Prazeres explica: “Se você quer exemplo, você precisa dar o exemplo. Você precisa mostrar que a gente acredita para que o outro também possa acreditar”.
Além de persuadir pelo exemplo, contudo, a equipe também lidera iniciativas educacionais diretas, ensinando nas escolas para incutir consciência ambiental nos hábitos diários desde a infância. Eles começaram programas educacionais em escolas da cidade e colaboraram com universidades, até mesmo nos Estados Unidos. Através da educação, eles desafiam a tendência à apatia. Os membros da equipe observaram que a visível falta de cuidado do governo com o saneamento e a saúde ambiental nas favelas foi adotado por alguns moradores, que não vêem o valor de cuidar eles mesmos dos próprios espaços de vida coletiva. Por esse motivo, ReciclAção trabalha para construir uma relação entre os moradores e o espaço que os rodeia, visando encorajá-los a considerar esses espaços como seus e merecedores de valor. Orlando explica que “esse conhecimento que o projeto compartilha é para criar uma mudança, e é por isso que não é um projeto, mas um programa que dura, porque ele quer criar uma transformação inesgotável”.
Atualmente, o ReciclAção conta com três coordenadores: dois educadores e um administrador. Eles recolhem o conteúdo das 40 eco bags espalhadas pela favela e enviam mais de 1.5 toneladas de material por semana para reciclagem. Eles removeram 140 toneladas de lixo de um ponto de acumulação que hoje se tornou um jardim com plantas medicinais, um motivo de orgulho para a comunidade. Várias mulheres da comunidade se aproximaram da iniciativa perguntando como reutilizar materiais e solicitando a participação nas oficinas do ReciclAção para produzir objetos e vendê-los no comércio. Os membros da equipe do ReciclAção têm orgulho de dizer que trouxeram uma mudança social no interior da favela, sugerindo que agora, mais do que nunca, as pessoas cuidam de suas casas e espaços de vida coletiva, e cultivam plantas em suas janelas. Eles acreditam que as pessoas estando mais conscientes sobre como cuidar do ambiente pode ter um efeito positivo no resto de suas vidas.
O ReciclAção enfrentou muitos desafios ao longo dos anos, entre os quais um contínuo risco de violência. Cris diz que, em 2015, uma publicação declarou o Morro dos Prazeres a favela mais limpa do Rio de Janeiro, mas, com o recente aumento da violência e tiroteios na comunidade em 2015 e 2016, as operações de limpeza tornaram-se mais difíceis. Ela reflete, entretanto, que “durante esse período de violência, só o ReciclAção continuou. Todos os projetos fecharam, mas as pessoas continuaram a deixar material para reciclar nas eco bags. Então ele tinha que continuar a trabalhar, mostrando que é importante para a comunidade”.
Outro desafio é a sustentabilidade financeira do programa. Atualmente, o salário daqueles que trabalham na iniciativa é pago pelo Instituto BRF–o braço da responsabilidade social corporativa da empresa global de alimentos BRF–bem como recebem apoio de outras parcerias. O objetivo é alcançar a sustentabilidade financeira em 2018.
Cris e Orlando dizem que estão “completamente positivos sobre o sucesso e o desenvolvimento futuro do ReciclAção”. Para eles, o projeto está alcançando a mudança social que eles querem e eles podem ver seu trabalho sendo apreciado e abraçado pelos jovens que influenciaram. Ambos também trabalham ativamente em outros projetos na comunidade. Cris é membro do PROA bem como de outras iniciativas e Orlando é presidente da Associação de Moradores, além de trabalhar como instrutor de esportes. Cris diz que o projeto ReciclAção mudou sua vida, não apenas na esfera pública, mas também em sua própria casa. Ela diz: “Agora economizo mais água, economizo dinheiro, na porta de casa tem plantas de temperos”. E ver as conquistas do ReciclAção deixa ambos os líderes otimistas com a possibilidade de que mais e mais pessoas irão entender a importância da educação ambiental e se engajar em promovê-la.
Confira os três primeiros anos de atividades do ReciclAção:
*ReciclAção é um dos mais de 100 projetos comunitários mapeados pela Comunidades Catalisadoras (ComCat)–a organização que publica o RioOnWatch–como parte do nosso programa paralelo ‘Rede Favela Sustentável‘ lançado em 2017 para reconhecer, apoiar, fortalecer e expandir as qualidades sustentáveis e movimentos comunitários inerentes às favelas do Rio de Janeiro. Siga a Rede Favela Sustentável no Facebook.