No dia 28 de junho, mulheres bem-sucedidas das áreas de ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) lotaram o Olabi, um espaço de coworking focado na tecnologia, em Botafogo, para imaginar um futuro mais inclusivo e representativo para STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática). O painel de discussão intitulado “Mulheres Negras Pautando o Futuro” foi formado pela diretora do projeto Olabi, Silvana Bahia; a repórter da Agência Pública e Coordenadora de Comunicações da Rede Umunna, Gabriele Roza; a professora de física experimental, Dra. Sonia Guimarães; e a diretora executiva da Anistia Internacional Brasil, Dra. Jurema Werneck.
As palestrantes ressaltaram a falta de mulheres negras na criação de novas tecnologias como um problema cada vez mais crescente, pois as tecnologias que definirão a vida no futuro estão sendo desenvolvidas hoje em dia. Sem toda a sociedade estar representada neste processo, essas tecnologias apenas irão “reproduzir o status quo” em termos de estruturas sociais, advertiu Silvana Bahia. No Brasil há falta de estatísticas sobre a representação racial nas áreas de STEM. No entanto, em uma dúzia ou mais histórias contadas pelas participantes, durante a noite, com o tema comum sobre ser a única mulher negra ou mesmo estudante negra em uma faculdade, fica claro que os negros e principalmente as mulheres negras continuam isoladas nas salas de aula nas universidades e nos postos de trabalho científico no Brasil.
Com a ideia que “tecnologia é mais sobre pessoas do que sobre máquinas”, como disse Silvana, o espaço de coworking Olabi e o seu projeto de coleta de dados PretaLab busca “estimular outros protagonistas” na área. Um exemplo do “que é possível com mulheres negras com tecnologia nas mãos”, nas palavras de Silvana, é Safira Moreira, uma jovem cineasta negra que mostrou o seu aclamado curta metragem, Travessia, que documenta a sua genealogia até onde ela pode traçar, que foi até a sua bisavó, como forma de resistência ao “apagamento da população negra”.
A Dra. Jurema Werneck, nascida e criada no Morro dos Cabritos na Zona Sul do Rio, ressaltou a importância de reconhecer que “a gente nunca foi a primeira e a gente nunca esteve sozinha” na quebra de barreiras. Recontando a sua história como a única estudante negra de medicina durante os seus estudos, nos anos oitenta, ela elogiou as gerações das mães negras que incentivaram os seus filhos a estudarem e trabalharam dia após dia para tornar aquele sonho realidade. Ela contou que era constantemente motivada e lembrada do investimento geracional na sua jornada para se formar na faculdade por uma mulher negra idosa que morava a algumas casas da sua e a cumprimentava dizendo “bom dia, doutora” e “boa tarde, doutora” todos os dias no seu trajeto.
Aquele investimento continua hoje em dia e dá cada vez mais frutos. Gabriele Roza falou da sua esperança para o futuro: “Tendo tudo isso [tecnologia] nas mãos, a gente pode entregar para essas meninas de três, quatro, cinco anos um futuro que… a gente está ajudando a construir também”. Gabriele, atualmente estudante de comunicação, observou: “A gente já tem a primeira professora [negra], a primeira mulher negra na tecnologia”, mas, “essa menina que está crescendo… já vai poder chegar nos espaços [de tecnologia]” como em quaisquer outros espaços. Ela maravilhou-se: “Se eu que estou aqui já consegui muita coisa por conta desse passado… imagina essas meninas”.
No entanto, os caminhos para este mundo, assim como as trajetórias percorridas pelas mulheres inovadoras que vieram antes, não serão fáceis. “Sempre tentaram provar que eu não deveria estar nessa posição”, explicou a Dra. Sônia Guimarães, PhD em física da matéria condensada, e primeira professora no famoso Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA)–antes mesmo que as mulheres pudessem candidatar-se ao colégio militar–Sônia enfatizou a coragem necessária para dar estes passos à frente. Face à escassez de modelos negros femininos nos espaços acadêmicos e profissionais, e a total resistência de alguns que são privilegiados devido a essa exclusão, ela urgiu: “Vá usar o que você aprendeu para você subir na tua carreira”. Enquanto reconhecia o papel das cotas e pedia cotas nos programas de graduação, ela insistiu que as jovens negras continuem a lutar pondo seu pé coletivo na porta para o futuro. “Eles não conseguirão tirar nenhum conhecimento da gente, e é assim que ocuparemos estes espaços”.