Carta resposta à matéria de O Globo “Vidigal terá hotel de charme cinco estrelas”

Edito um blog sobre o Vidigal, o Vidiga!, e rodando pelo morro, há algum tempo que ouço falar da construção de um pequeno hotel de luxo, mais especificamente no espetacular mirante do Arvrão, pelo renomado arquiteto Hélio Pellegrino.

Ouvia, também, à boca pequena, que a obra está em uma área de risco, e que o terreno é instável demais para uma obra tão pesada – que apesar de ter apenas dois andares, contará com uma piscina na cobertura.

Eis que nesta quarta-feira me deparo com uma matéria publicada pelo jornal O Globo, em que o arquiteto esclarecia sua visão inovadora: “O Vidigal sempre foi a senzala da casa grande de Ipanema e Leblon. Agora, todo mundo poderá conhecer o que existe no local, que é maravilhoso”.

Usando a antiga técnica de interpretação de texto aprendida no primário, analiso as partes:

“Agora, todo mundo poderá conhecer o que existe no local”: entendo dois erros aí. O primeiro é que é que nem “todo mundo” pode frequentar um hotel 5 estrelas “de charme”. E é em busca de um Vidigal realmente “para todo mundo” que muita gente vem trabalhando contra a supervalorização dos imóveis, a famosa “remoção branca”, que está afastando, silenciosamente, os moradores.

Também é necessário informar que “todo mundo” JÁ pode conhecer as maravilhas do Vidigal, sua trilha, seus bares, suas festas, sem esperar a construção do hotel. Está tudo aqui e há muita gente subindo, mais até do que a atual estrutura viária do morro pode suportar.

“Senzala da casa grande de Ipanema”: isso demonstra uma visão um tanto colonizadora e principalmente, ignorante sobre o Vidigal. O arquiteto talvez desconheça a vida cultural que existe desde que o morro é morro, os bailes do Águia Futebol Clube, que congestionavam a antiga Estrada do Tambá (hoje Pres. João Goulart), quando o asfalto subia o morro, como faz novamente hoje, para aproveitar a vida cultural do Vidigal. Talvez desconheça, também, as festas que, juntas, chegam a levar, em uma só noite, 1.200 pessoas pro Vidigal: Lamparina (ou Luv) e as festas do Alto Vidigal, ali mesmo no Arvrão.

Outra coisa que me incomodou, profundamente, foi dizer que a obra “terá um pé na sustentabilidade”, e que “é inovador e vai ajudar o pessoal em volta a ver que é possível construiu reaproveitando coisas”, como disse o sr. Antonio Rodrigues, sócio de Pellegrino. Talvez ele pudesse conhecer o trabalho realizado pelo Sitiê Vidigal, onde lixo vira móveis, ou ainda, por Wilson Alexandre, que construiu um condomínio de casas, todas feitas com material reciclado.

A Associação dos Moradores da Vila do Vidigal também emitiu seu parecer. É a favor da entrada de investimentos que desenvolvam o turismo local, mas questiona a estrutura do Vidigal para receber um empreendimento deste porte.

Sou uma moradora feliz pela nova fase de crescimento econômico do Vidigal, mas indignada com a visão colonizadora que o Sr. Hélio Pellegrino apresenta em sua fala.

 

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