Um grupo comunitário localizado na região da Vila Laboriaux na Rocinha, recebeu um prêmio do mesmo governo que já tentou remover a comunidade.
O Movimento Preserva Laboriaux foi escolhido como um dos 85 vencedores do Prêmio de Ações Locais da Prefeitura do Rio de Janeiro, iniciativa que integra as celebrações do aniversário de 450 anos do Rio. Havia 828 inscritos no concurso.
O Movimento Preserva Laboriaux promove o desenvolvimento sustentável da Vila Laboriaux e de suas 600 famílias, que moram na área da Rocinha vizinha à Floresta da Tijuca. O Movimento Preserva Laboriaux é coordenado pela ONG Favela Verde.
A organização estabeleceu uma parceria com a Associação de Moradores liderada por José Ricardo Duarte, eleito em 2012 pela grande maioria dos moradores.”Quanto à questão da Prefeitura reconhecer, acho que está mais do que na hora”, disse Ricardo ao comentar a conquista do prêmio. “Porque o poder público, ele tem que reconhecer as pequenas ações e tem que reconhecer aquilo que parte do povo. Porque a gente, na realidade, em alguns momentos, substituiu a falta de ação do poder público”.
Este é certamente o caso da Vila Laboriaux, uma comunidade que foi ameaçada de remoção pela Prefeitura após os deslizamentos de 2010. O Movimento Preserva Laboriaux é apenas um exemplo de ação comunitária na região.
Desde o seu primeiro evento–a limpeza coletiva de 1,5 toneladas de lixo abandonado–até hoje, a instituição trabalhou de forma participativa, consultando e implementando prioridades elencadas por moradores. Outras atividades organizadas pelo grupo são: arte urbana, hortas comunitárias, atividades culturais e educação e preservação ambiental.
Gabriel Voto do Favela Verde descreve como em sua primeira visita à comunidade “o fantasma da remoção era muito forte…. Era uma coisa muito ruim, muito pesada. A gente viu por exemplo que os moradores não pintavam as casas porque não tinham expectativa, não sabiam se tinham perspectiva de futuro, se iriam ser removidas uma semana depois”.
Tanto Ricardo quanto Gabriel concordam que as dificuldades enfrentadas pela comunidade de alguma forma contribuíram para o que Gabriel chama de “riqueza social” da região, como também para a sua clara “riqueza ambiental”.
O recurso do Prêmio de Ações Locais apoiará o financiamento de dez eventos em 2015, que já foram acordados em reuniões comunitárias.
O primeiro deles foi o Fala Mulher no dia 28 de março–um evento para mulheres se reunirem e dialogarem. O evento incluiu tratamentos de beleza gratuito da Embelleze e atividades artísticas para crianças oferecidas pela Escolinha de Arte Urbana. “A gente percebe que há essa oportunidade para a gente trazer as mulheres para mais perto do Movimento Preserva Laboriaux”, explica Gabriel.
Moradora do Laboriaux, Aurini foi uma das muitas mulheres que participaram dos debates e tiveram suas unhas feitas gratuitamente. “Gostaria que tivesse mais vezes. Nem sabia que ia ter o que tem aqui. Pensei que só era para a gente falar as coisas da comunidade. Achava que era só isso. Cheguei aqui, fiquei surpresa, gostei”.
O próximo evento na lista do Movimento Preserva Laboriaux será um dia de ação coletiva, um mutirão para reformar a sede da Associação de Moradores. Eles planejam transformar o prédio em um centro social comunitário para abrigar atividades e oferecer espaço para outras instituições.
A Prefeitura havia prometido à Associação um novo espaço, após ter permitido que um grupo de ocupantes permanecesse na antiga sede da Associação, mas o espaço oferecido era um porão escuro tomado por esgoto a céu aberto. “Eles prometeram a sede e entregaram esse espaço… É tão ridículo que eu não consigo explicar com palavras”, comentou Ricardo. “Está faltando tudo”.
Mas não está nos planos esperar que a Prefeitura limpe o prédio.
“Tem uma escala de prioridades que tem que ser respeitada”, disse Ricardo, referindo-se às outras demandas da Associação de Moradores, como contenção de encostas, regularização fundiária e melhoria dos sistemas de água e esgoto. “Se eu continuar cobrando e perturbando a Prefeitura pela reforma da sede, aí o que que a Prefeitura faz? A reforma da sede e cala nossa boca, e aí pode ficar mais difícil a gente cobrar o restante”.
É uma situação incomum: o recurso do prêmio sendo usado para cumprir a promessa que a própria Prefeitura fez para a Associação de Moradores.
Gabriel acha que o prêmio pode ter uma força social mobilizadora visto que “é mais um entendimento de que a gente não precisa do Estado, não precisa esperar o governo mais uma vez vir aqui realizar o que tem que realizar”.
O Movimento Preserva Laboriaux, dentre outros programas, vem debatendo e planejando a criação de um centro ambiental para a comunidade.