O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal Brasileiro foi fundado em 2007 com a declarada missão de auxiliar o crescimento econômico, através de um investimento substancial em infraestrutura. No Rio de Janeiro entre outras coisas, o programa urbaniza favelas através da melhoria de saneamento, habitação, transporte e acessibilidade aos serviços públicos.
No caso da Rocinha, a maior favela da América Latina, o PAC estabeleceu objetivos ambiciosos: construir um complexo olímpico, uma clínica da saúde, a troca da passarela na entrada da comunidade, ampliar as Ruas 1, 2 e 4 permitindo um melhor acesso entre a vizinhança, remodelar o mercado popular, e cobrir o esgoto a céu aberto conhecido como valão.
O projeto completo do PAC pode ser visto da Auto Estrada Lagoa Barra, que passa pela Rocinha e vai até São Conrado. A passarela da Rocinha é agora uma graciosa parábola de concreto desenhada pelo famoso arquiteto Oscar Niemeyer e o complexo de esportes nas cores brilhantes azul e branca, e mais a clínica que vem servindo a comunidade por um ano e meio. A reurbanização da Rua 4 é um dos exemplos de renovação urbana na cidade do Rio de Janeiro, novos projetos habitacionais e espaços públicos complementam o estilo arquitetônico da comunidade encaixando-se perfeitamente ao ambiente de em torno. Mesmo a mal falada pintura arco-íris dos prédios de frente a auto estrada parecem harmoniosos.
Não é surpresa, entretanto, que os projetos inacabados sejam menos glamorosos, porém mais urgentes.
Em Julho de 2011, o jornal O Globo publicou que todos os projetos da Rocinha deverão parar até nova ordem. Enquanto o Departamento de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro espera a verba de R$51.000.000 do governo federal, o PAC já gastou R$219.300.000 na Rocinha. O Departamento afirma que o estouro do orçamento se deu na reurbanização da Rua 4, a transformação da mesma em uma rua mais larga criou problemas de drenagem não previstos. A rampa que liga a Rua 1 no alto do morro até a rua principal, não será concluída. Ao invés de ligar a Rua 2 à rua do Valão na entrada da Rocinha, o governo propôs a construção de um teleférico similar ao do Complexo do Alemão, mas não deu prazo para esse projeto.
Carlos Pereira de Jesus, um morador antigo da Rua 2, não sabia que as obras do PAC haviam parado, pois o governo não fez nenhum tipo de comunicação. Ele ficou indignado quando soube que o PAC gastou R$15.000.000 na passarela antes de fazer melhorias na comunidade e no
valão. A Rua 2 continua estreita e congestionada sem uma conexão direta com as outras ruas da Rocinha.
O valão precisa urgentemente da ajuda do PAC. A vala é na parte inferior da
Rocinha, o lixo e o esgoto dos moradores de partes mais altas drenam para o local. Ele é constituído por um canal de concreto de 12m de profundidade e 15m de diâmetro e seu fluxo são dificultados pelo lixo e detritos. A água cinza marrom sobe de forma alarmante após a chuva. Há seções esporádicas em que o valão é coberto por vergalhões e capa de madeira, mas na sua maioria o esgoto corre a céu aberto. Não é raro ver crianças pulando no esgoto atrás de bolas caídas ou pescando eletrônicos. A vizinhança mergulhada no mau cheiro do esgoto tornando-se a parte menos desejada da Rocinha. Grupos do saneamento público da cidade (CEDAE) trabalham arduamente na drenagem do valão nos últimos meses, mas nenhum progresso efetivo ocorreu.
A revitalização do Boiadeiro, um espaço aberto entre o valão e a Viia Ápia é outro projeto que nunca começou. Aos domingos o Boiadeiro fica cheio de barracas que vendem produtos, especiarias, carne fresca, artigos domésticos e animais de estimação; durante a semana é ponto de moto- táxi e barracas de comida. O Boiadeiro em seu estado atual é suficiente, mas como em toda Rocinha precisa de nova pavimentação e coleta de lixo frequente. Depois da feira de domingo, as ruas estão cheias de frutas podres, ossos de vaca, e não existe recipiente para coleta de lixo.
A primeira vista, o Complexo Esportivo da Rocinha parece ser uma das maiores conquistas do PAC. É parte de uma iniciativa municipal para incentivar os esportes em homenagem aos jogos Olímpicos de 2016. O complexo é formado por piscina, campo de futebol, ginásio de ginástica aberto e oferece gratuitamente capoeira, judô, aulas de boxe para adultos e crianças. Todos os instrutores são da comunidade e são distinguidos de acordo com sua área. Infelizmente as instalações não são ideais para os instrutores do complexo.
Dionísio Lazário ex- campeão dos médios do boxe brasileiro, é instrutor de boxe do complexo. O lutador é conhecido como o “Mike Tyson da Rocinha”, ele teve vários conflitos com a administração do PAC. Depois de convidar Lazário para participar do projeto com intuito de cultivar novos campeões e lutadores olímpicos, os oficiais do PAC disseram a ele que o boxe não era um esporte viável. Várias vezes eles mudaram os horários ou cancelaram as aulas sem aviso prévio. Em uma ocasião quando lutadores americanos e alemães visitavam as aulas, um oficial disse que todos deveriam sair porque o complexo estava fechando. Lazário não foi considerado de confiança para guardar as chaves do armário de luvas, forçando-o a manter seus alunos esperando. Lazário disse: “Eles me deixaram de mãos atadas”.
Mais uma vez o problema do saneamento básico, não foi devidamente abordado. O valão escoa por baixo da Auto Estrada Lagoa- Barra, formando uma grande vala a céu aberto no centro do complexo de esportes a poucos metros da sala de artes marciais. O cheiro de esgoto no inverno é desagradável, porém insuportável no verão. As frequências nas aulas caíram, pois os alunos se sentiram mal em exercitar-se próximo ao esgoto, os professores reclamaram que o cheiro permanece em suas roupas durante todo o dia. O fato mais alarmante foi quando as pessoas encontraram tapuru (um verme que entra pelo pé) muito comum em esgoto. Para piorar as coisas os tanques sépticos para a limpeza dos banheiros do complexo estão na sala de aula de boxe. Dionísio Lazário tentou discutir essas falhas no projeto com os engenheiros do PAC, durante a construção, mas eles o ignoraram.
As ambições do PAC para a Rocinha foram impressionantes, mas sem um financiamento ou um planejamento coerente o programa estará muito longe das expectativas da comunidade.