Dirigido por Kátia Lund e Lili Fialho e produzido por Luis Lomenho, o filme Assó! Adorei o Jongo evoca a magia da dança, da música e da cultura na prática afro-brasileira do jongo. Parte do Festival Reimagine Rio, da ONG Rise Up & Care, o documentário conta a história da arte e da femininidade do jongo. No dia 13 de agosto, o filme estreou na Casa do Jongo da Serrinha na favela Serrinha em Madureira na Zona Norte do Rio, exatamente no lugar onde o filme foi feito e onde a cultura do jongo foi preservada ao longo dos últimos 50 anos.
Jongo, uma dança tradicional afro-brasileira, sempre acompanhada pela batida dos tambores, “engravidou em Angola e nasceu no Brasil”, de acordo com um canto do jongo tradicional. Quando o jongo foi, primeiramente, praticado pelas comunidades de ex-escravos conhecidas como quilombos, era muitas vezes associado com espiritualismo e era praticado exclusivamente pelos mais idosos da comunidade. No quilombo da Serrinha, a prática de percussão era dominada pelos homens. Isso mudou quando Mestre Darcy, um dos os líderes de longa data do Jongo da Serrinha, deixou Luiza, atual coordenadora-geral da organização, tocar percussão. Após a abertura do mundo do jongo para mulheres, ele começou a passar a cultura para as crianças do bairro. “Eu persisto porque eu sei que essa cultura não vai morrer na Serrinha“, diz Darcy.
Assó! Adorei o Jongo mostra as crianças da Serrinha em suas aulas de jongo e destaca entrevistas com os professores de jongo da comunidade. Suellen, por exemplo, chama a si mesma de “guia” ao invés de professora–ela diz que ajuda as crianças a viver ao invés de aprender. Para ela, o jongo é um estilo de vida. Ela fala de sua importância como uma ferramenta de comunicação durante a época da escravidão, um aspecto do jongo que ela acredita ser importante ainda hoje para os moradores da Serrinha.
Ao longo dos anos, a cultura e a arte de jongo sofreu forte preconceito. Em um país onde o racismo ainda prevalece, religiões afro-brasileiras como o Candomblé e práticas culturais como o jongo ainda são muito estigmatizadas. “Basta ser de preto, basta tocar tambor que as pessoas já acham que é macumba“, diz Suellen.
As mulheres da Serrinha lutaram ativamente contra o racismo e o ódio religioso. Para muitas delas, o jongo é mais uma prática cultural do que especificamente espiritual. Tia Maria, aos 95 anos uma das líderes mais velhas na comunidade, é ela mesma católica. Luiza opõe-se veementemente ao estigma contra o jongo, dizendo que percussão e a bateria sempre existiram e estão presentes antes mesmo do nosso nascimento sob a forma do coração de nossas próprias mães.
Destacando as comoventes vozes do grupo cantando as mais famosas músicas do Jongo da Serrinha, Assó! Adorei o Jongo leva os espectadores a uma jornada através da história de uma forma de arte cheia de história e cultura. “Pisei na Pedra” é uma das canções mais conhecidas entre as crianças da Serrinha. Escrita por Mestre Darcy, a canção evoca e pede pela atual resistência cultural: “Levanta meu povo / Cativeiro se acabou”.
Os realizadores do Cinema Nosso e Jabuti Films capturaram a força e a beleza do jongo e as transpuseram diretamente para o filme. A importância do movimento e a dedicação das mulheres da Serrinha são capturadas com grande sensibilidade e profundidade e é uma documentação importante de uma significativa prática cultural afro-brasileira tanto para os envolvidos, quanto para o público em geral.
“Para mim é muito importante ver esse filme nos cinemas, pois assim aqueles que não conhecem até hoje o que é o jongo conhecerem, e viram visitar a nossa casa para a gente poder passar essa cultura para as pessoas, para as crianças também. Esse era o desejo da minha avó e do meu tio, passar essa cultura para as crianças, e para quem não a conhecia”, disse Deli Monteiro, atual diretora do Jongo da Serrinha cuja avó e tio foram fundadores do grupo, após a estreia do filme no dia 13 de agosto.
Suellen, que também participou da estreia, disse que a experiência de participar deste filme foi única e permitiu que ela e outros participantes vissem eles mesmos e sua comunidade, como protagonistas. “É um espaço também marginalizado, de periferia, mas que também tem muita coisa boa e positiva para acrescentar“, ela afirmou.