Aumenta o número de africanos que deixam o continente, em particular angolanos que escolhem o Brasil ao invés de destinos tradicionais como Europa e América do Norte.
Aos sábados à tarde, um pequeno número de imigrantes africanos se reúnem no Aterro do Flamengo para o futebol e churrasco. Quase todos são homens jovens de Angola, mas há alguns da Costa do Marfim, Camarões e Guiné Bissau. A conversa entre eles vai e volta entre português e francês. A maioria mora no Brasil há alguns anos e pode confortavelmente chamar o Rio de sua casa. Embora a maioria viva no Complexo da Maré, o Aterro do Flamengo é um bom ponto de encontro para um futebol no final de semana.
Esses jovens fazem parte da crescente diáspora africana que escolhe destinos na América Latina ao invés dos destinos tradicionais de imigração na Europa. Em agosto de 2011, o relatório da Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiados, verificou que o Brasil atualmente hospeda 4.400 refugiados requerentes de asilo e apátridas, 64% desses requerentes de asilo são de países africanos e 40% desses são de Angola (aproximadamente 1.125 angolanos).
As razões para a crescente importância do Brasil como destino para imigração africana são múltiplas e uma das razões é que os destinos na Europa estão perdendo rapidamente seu apelo. Para imigrantes de Angola e outras ex-colônias de Portugal (Guiné Bissau, Moçambique, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe), o país tem sido a escolha convencional para aqueles que fogem da pobreza ou conflitos civis. A economia em Portugal está passando por momentos de crise e há poucos empregos para imigrantes. Na verdade cidadãos portugueses também estão migrando para o Brasil, por causa da sua economia crescente.
Além disso, o clima político na Europa está se tornando cada vez mais xenófobo e muitos imigrantes descobrem que o sonho europeu já não vale mais a pena. Enquanto isso o panorama político brasileiro não é anti- imigração e há exigências relativamente baixas com relação a anistia política e para os vistos de trabalho e estudo.
Fabrício Dom artista e designer de moda angolano, consegui anistia política no Brasil e achou todo o processo de apelação e visto surpreendentemente fácil. Dom veio de uma família que tradicionalmente tem apoiado a UNITA (União Nacional para Independência Total da Angola), o movimento de oposição ao MPLA ( Movimento popular pela Liberação da Angola), ele fugiu em 1999 durante o último suspiro de violência na guerra civil angolana que dura décadas entre os dois lados. Apesar dele mesmo não ser apontado pelo MPLA e não ter sofrido qualquer abuso dos seus direitos humanos, foi dado a Dom um visto que permite que fique no Brasil por tempo indeterminado.
Refugiados e requerentes de asilo, compõem apenas uma pequena parcela da comunidade diáspora africana no Brasil. De acordo com Leandro de Almeida, Vice- Cônsul e Liaison da comunidade no consulado da Angola no Rio de Janeiro, a maioria dos cidadãos angolanos do país estão no país com visto de estudante ou trabalho. Isso fica evidente, entre os jogadores que jogam no Aterro, a maioria é composta por estudantes.
Um aluno de graduação da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Bernardo Manuel, 30 anos, faz parte da crescente comunidade angolana no Rio. Com uma bolsa de estudos do governo brasileiro reservados para estudantes africanos, Manuel é capaz de morar e estudar Relações Internacionais no Brasil. Manuel vem residindo e trabalhando no país há alguns anos e espera um dia retornar para sua família em Luanda, capital da Angola.
Almeida, do Consulado Geral de Angola, informou que muitas das pessoas que vêm como estudante, usa a oportunidade também para trabalhar, mas encontrar emprego é o maior desafio para os angolanos que vivem no Brasil.
Esse fato é confirmado por Fabrício Dom, que disse que muitos de seus conterrâneos não foram tão afortunados como ele, que encontrou um meio de viver no Brasil. Dom, que conhece pessoalmente imigrantes de vários países africanos informou que muitos que chegam ao Brasil permanecem desempregados e vivem na pobreza. Muitos moram em favelas como o Complexo da Maré e a pressão para se juntarem ao narcotráfico é grande.
Isso se torna mais enfático para imigrantes que entram no país de forma ilegal, ou não são procedentes de países que tem o português como língua nativa. Dom contou a história de um amigo seu, que manteremos anônimo, ele fugiu da República Democrática do Congo escondendo-se em um container de navio sem saber a duração e o destino da viagem. Quando o container foi aberto no porto do Rio de Janeiro, ele escapou para as favelas da cidade e continua sem documentação. Atualmente, ele está aprendendo português e trabalhando em “bicos” no setor informal e vive em condições de pobreza.
Dom sente que foi capaz de se adaptar a sociedade brasileira, porque como é angolano, fala português. Ele sente que há um conhecimento geral da cultura e história da Angola entre os brasileiros. Seus amigos da Nigéria e da República Democrática do Congo não foram tratados com a mesma cordialidade e conseqüentemente tiveram mais prejuízos como imigrantes e mais dificuldades em encontrar trabalho.
Os laços culturais entre Brasil e Angola vem dos tempos do tráfico de escravos e da expansão colonial portuguesa. É estimado que quase 40% de todos os escravos trazidos para as Américas ficaram no Brasil e quase 40% dos escravos que cruzaram o Atlântico eram do que hoje é Angola. Séculos de escravidão e genocídio corromperam a língua, religião e os costumes dessa diáspora, mas grande parte da tradicional sociedade brasileira é de origem angolana.
O Samba é a marca da música brasileira, mas sua origem encontra-se nos ritmos do Semba Angolano. Uma combinação das artes marciais e dança chamada Capoeira, foi desenvolvida pelos escravos angolanos era um meio de entretenimento e resistência a hegemonia cultural portuguesa. Mas alguns historiadores insistem em afirmar que a Capoeira veio de Angola e não começou entre os escravos.
Essa herança em comum tem um papel na forma como os brasileiros recebem os angolanos no país. Um dos jogadores de futebol e estudante de graduação, Abel, 27 disse que sente uma forte conexão e isso faz uma diferença na sua experiência e identidade como angolano vivendo no Brasil.
Outro jovem angolano vestindo uma camisa de futebol americana, falou sobre a semelhança com os negros brasileiros.” Não é só porque eles são negros, eles parecem angolanos, parecem da família!”. Para esses homens é um sentimento de boas vindas chegar ao Brasil e reconhecer pequenas sutilezas como gestos e expressões faciais que os fazem lembrar os membros da família que estão em casa.
Fabrício Dom, está orgulhoso em dividir a cultura africana e sua própria cultura angolana com os brasileiros e tem mostrado seu trabalho pela África, América Latina e Europa. Sua arte e design demonstra uma mistura da África tradicional e moderna, uma África tanto orgulhosa da sua herança tanto quanto criativa e voltada para o olhar exterior. A África moderna não é mais limitada pelos laços europeus deixados pelo colonialismo. Ele mostra como os africanos podem finalmente encontrar formas mais criativas de se adaptar ao mundo globalizado.
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