Perfomances artísticas transformando vidas em Bangu

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São 4:00hs de uma tarde de quinta-feira, e uma mistura de hip hop e ritmos brasileiros tradicionais ressoa através das janelas do segundo andar do Centro Cultural Caixa de Surpresa, em Vila Aliança, uma favela em Bangu, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Estudantes de dança ensaiam coreografias e aproveitam os intervalos para dançar livremente. Enquanto isso, no primeiro andar do teatro, jovens atores repassam esquetes.

Waldemir Correia, diretor e fundador do Caixa de Surpresa, com sua surpreendente energia e juventude, é uma presença constante em todos os espaços do Centro Cultural, brincando no pátio com os jogadores de pingue-pongue da tarde, a gritar lembretes sobre bons modos e as próximas partidas de futebol no corredor, brincando e abraçando todas as crianças que passam.

A cada semana, o Caixa de Surpresa oferece dança, teatro, percussão e aulas de artes marciais para crianças e jovens em comunidades próximas. A organização tem trabalhado com mais de 1.000 crianças e adolescentes desde o final dos anos 1970, quando ela evoluiu de uma banda conhecida por letras revolucionárias para um grupo dedicado a atividades musicais de boas-vindas a juventude local.

No final dos anos 90 o espaço de trabalho do Caixa de Surpresa era a varanda da casa de Waldemir. Preocupado com a prevalência de dança sensual em uma idade ainda muito jovem entre as crianças locais, Waldemir e Leidimar Alves Machado, Coordenador de Projeto do Caixa, começou a convidar as meninas para dançar em sua varanda. “Waldemir colocou um clássico para elas ouvirem. Ninguém queria saber de clássico; queriam dançar funk. Na verdade foi uma conquista. A gente não sabia dançar, mas conseguimos fazer alguns movimentos com as crianças. Deu tão certo que as crianças foram embora e voltaram no outro dia, e voltaram no outro, e voltaram no outro.” Explica Leidimar.

 Desde 1970, o Caixa tem formado parcerias com inúmeras instituições locais e internacionais e tem visto muitos dos seus participantes se transformarem em professores. Uma ex-aluna, Michele Ferreira de Souza da Conceição, compartilha: “Houve esse crescimento e foi bem legal, porque a gente transferia o que a gente aprendia para as outras crianças, e com foco, sempre com essa proposta de vida. Hoje como professora a maior parte do meu tempo é falar sobre a vida.” Através de sua participação no Caixa, Michele foi premiado com a oportunidade de viajar para o Canadá e Rússia para dançar. Ex-participantes atestam o que faz a diferença no Caixa: Leidimar e Waldemir se preocupam com todos os aspectos da vida dos participantes. “No começo, a gente achava aquilo chato, mas a gente passou a depender disso.” Explica Michele, que conta histórias de como ela continuou a contar com Leidimar mesmo no dia de seu casamento.

Um tema comum ao Caixa é a transformação. Líderes comunitários transformado pelos resultados de seu trabalho, os professores transformados por estudantes, alunos por professores, comunidades por projetos locais, artistas pela arte. Leidimar fala de crescimento pessoal através de seu papel de liderança no Caixa: “Larguei tudo o que eu fazia. Eu me entreguei. Entrei de cabeça. O maior crescimento foi eu conseguir me libertar e conseguir me dar como eu estou me dando hoje. E isso tudo é graças ao trabalho que eu desenvolvo. Hoje eu estou realizada como pessoa.”

 Waldemir fala do Caixa como o catalisador para “uma simbiose entre eu e a arte” dentro dele: “A troca que eu consegui fazer com a arte é o que me mantem vivo. Eu acordo, eu durmo, percebendo a arte como uma necessidade dentro dessa necessidade maior de transformação que as nossas comunidades, as nossas periferias precisam. A comunicação do Caixa de Surpresa sempre utiliza a arte como forma de comunicação para estarmos tentando minimizar essa vulnerabilidade que as nossas comunidades vivenciam.”

Edson José Ferreira, professor de teatro do Caixa, traz sua própria história de sacrifício pessoal e auto-transformação através do teatro para o seu trabalho no Caixa, depois de ter usado dinheiro recebido de presente de Natal e vender rifas para pagar suas próprias aulas de teatro quando era adolescente.

Edson decidiu que os seus alunos de teatro iriam montar Romeu e Julieta para concluir o curso de teatro básico: “Eu resolvi fazer esse texto primeiro porque é um texto universal. Todo mundo gosta de Romeu e Julieta, seja em qualquer tempo. Mas na verdade, não é todo mundo que tem acesso ao teatro. Então para esse pessoal da comunidade foi uma oportunidade de conhecer Romeu e Julieta.” Após toda a preparação, incluindo o figurino produzido a partir de materiais reutilizados e reciclados, Edson conta como foi gratificante ver um público repleto de espectadores de toda a cidade e que ainda mais gratificante foi presenciar a transformação pessoal entre os atores: “Usamos três ou quatro Julietas, dois Romeus, isso para diversificar cada quadro, para que cada uma tivesse a oportunidade de ser Julieta por uma vez, e com Romeu a mesma coisa.” Explica ele.

Ex-alunos afirmam essas transformações e reconhecem o papel que a arte desempenha no Caixa. Dayane Conceição atesta a suas descobertas e convicções pessoais: “Eu encontrei na dança uma maneira de falar. Através do meu corpo eu podia levar uma mensagem bacana para alguém. Os melhores momentos da minha vida é quando eu estou dançando. Através da arte a gente pode falar, sim. A gente pode transformar. A gente pode revolucionar.”

O Caixa de Surpresa usa a arte como ferramenta de transformação. Dayane destaca o que as artes são realmente para o Caixa: “O objetivo aqui nunca foi formar grandes bailarinas nem grandes atrizes não. O objetivo é simplesmente transformar essas meninas em pessoas capazes de estar a frente das suas histórias. A gente não tinha aquela responsabilidade de brilhar. Brilhar é a partir do momento que você está feliz, fazendo o que você gosta, independente de você dançar bem ou não.”

 

No dia 16 de outubro de 2011, o Caixa de Surpresa comemorou quatro anos no atual Centro Cultural, um edifício público que os organizadores do projeto reativaram após anos de abandono. Saiba mais sobre a Caixa de Surpresa no Facebook Facebook  ou como uma solução no WiserEarth.

 

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