Ao cair da noite da quarta-feira, 13 de setembro, os moradores da comunidade do Horto na Zona Sul do Rio realizaram uma reunião urgente para discutir as novas circunstâncias na luta constante contra a remoção. As lideranças comunitárias da Associação de Moradores e Amigos do Horto (AMAHOR) informaram ao grupo, com cerca de 50 moradores, os recentes desenvolvimentos dos esforços do vizinho Jardim Botânico para remover as famílias das suas casas. Emília Maria de Souza, ex-presidente da AMAHOR, avisou ao grupo reunido que nos próximos dias “a comunidade toda tem que ficar alerta”.
Ela explicou melhor os dois eventos que levaram à reunião de emergência, que foram anunciados pelo WhatsApp e Facebook no anoitecer anterior. Ela informou ao grupo que no dia anterior, terça-feira, 12 de setembro, um morador havia avistado “gente do IBAMA aqui na área do Caxinguelê, da Margarida e do Grotão”. Ela continuou: “Estavam fotografando e fazendo anotações. Eu falei: ‘Gente! Esse povo tem que ser abordado para nós sabermos que mapeamento é esse que eles estão fazendo na área'”.
Mais preocupantes, ela explicou, foram as notícias de que o presidente do Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico, Sergio Besserman Vianna, tomara medidas para envolver a Polícia Militar na remoção dos moradores do Horto. Emília disse que tinha sido informada no dia anterior através de uma fonte confiável que o presidente “já tinha articulado com o batalhão de choque para eles darem suporte para fazer remoções”. No entanto, ela disse, “eles só podem vir fazer essa operação aqui na comunidade com a autorização do batalhão da área, que é o 23º. Então ontem à tarde, os procuradores do Jardim Botânico foram levar um ofício no 23º batalhão. Só que a partir daí, a gente não sabe qual vai ser o parecer do comandante do 23º sobre essa solicitação”.
Estas palavras evocaram imagens da violenta remoção de Marcelo de Souza e de sua família por tropas de choque no último mês de novembro. Emília de Souza avisou que desta vez o Jardim Botânico pediu a remoção simultânea de cinco famílias em várias partes da comunidade, o que é típico da estratégia de remoção da prefeitura de remover casas em locais variados para criar uma generalizada sensação de pânico entre moradores. A operação poderá ser iminente se for aprovada pela Polícia Militar.
O Horto tem resistido à remoção em múltiplas frentes desde os anos 1960. O Jardim Botânico empregou moradores do Horto durante a história de mais de 200 anos da comunidade, dando-lhes o direito de estabelecer as suas casas no seu contorno. Entretanto, agora a instituição argumenta que eles são “invasores“ e devem ser removidos para aumentar a área do Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico e “proteger” a mata circundante. No ano passado, durante o governo de Michel Temer, uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), que aprovou a remoção dos moradores do Horto, reforçou a cruzada do Jardim. Este fato fez voltar atrás um plano prévio que garantiria a permanência da comunidade ao lado da expansão do Jardim.
A gentrificação dos bairros circundantes da Gávea e do Jardim Botânico e a conveniência dos arredores exuberantes do Horto também aumentaram a especulação imobiliária. Emerson de Souza, o presidente atual da AMAHOR, explicou na reunião que “existe áreas de interesse da especulação imobiliária e o Horto todo está nesta área. Sem exceção, ele está sofrendo e vai sofrer com as especulações imobiliárias daqui para frente… estão especulando sobre nossa área, especulando sobre nossas vidas, e querem, de forma criminosa, retirar 521 famílias aqui do Horto Florestal”. O gigante da mídia, Grupo Globo, informou que a propriedade do Horto está avaliada em R$10,6 bilhões (atualmente US$3,4 bilhões). A localização da sede da Globo adjacente à comunidade e os seus laços com o Jardim Botânico exercem mais pressão sobre o Horto. As notícias do Globo falsamente enquadraram a existência da comunidade lá como “ocupação irregular“.
Emília de Souza afirmou na reunião que “eles estão aliados: o Jardim Botânico, a prefeitura, esse povo aí da Globo. A nossa luta, gente, as nossas vidas não têm nada a ver com a questão ambiental. Aqui estamos brigando contra o poder da especulação imobiliária”. Os outros moradores concordaram que a motivação de obter lucro por trás dos esforços de tomar a terra do Horto está movendo o Jardim Botânico, a Globo e as autoridades do governo. Emília apresentou atualizações sobre os esforços de resistência política e jurídica da comunidade. Estes incluem combater as ordens de remoções individuais no tribunal por meio de uma parceria com estudantes de Direito da PUC-Rio e da UERJ, pressionando membros do governo federal a apoiar a causa do Horto, e reunindo-se diretamente com a Comissão de Direitos Humanos na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ).
Os moradores não sabem quando ocorrerão as–recentemente reveladas–remoções previstas das cinco famílias que estão em perigo. Pode acontecer a qualquer momento. Na reunião, Emerson e Emília e outros moradores pediram mobilização renovada sob a forma de barricadas físicas e protestos, técnicas que a comunidade já usou anteriormente para permanecerem unidos diante da remoção. “A gente têm que pôr os pés no chão, a favela do Horto está na lista de remoção do Jardim Botânico”, concluiu Emília. Ela argumentou que a oposição absoluta e unificada seria essencial para prevenir remoções futuras. O grupo se dispersou com planos de se encontrar novamente e manter a força da resistência necessária para confrontar as ameaças contínuas ao Horto.