EpiCentral Abraça Sustentabilidade e Resiliência na Providência #RedeFavelaSustentável [PERFIL]

Perfil da Rede Favela Sustentável*

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Iniciativa: Espaço de Permacultura da Central do Brasil (EpiCentral)
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Ano da Fundação: 2015
Comunidade: Morro da Providência
Missão: Oferecer um espaço colaborativo para iniciativas de fomento social à comunidade recebendo pessoas engajadas com o propósito de promover eventos, encontros e intercâmbios culturais colaborando para a sustentabilidade.
Eventos Públicos: Sessões do Cineclube EpiCentral, oficinas do Horta Inteligente–educação ambiental para crianças toda 5a feira. Confira a agenda de eventos no EpiCentral na página do Facebook aqui.
Como Contribuir: O EpiCentral busca parceiros para realizar oficinas, atividades e eventos diurnos dentro de seu espaço. Solicitam-se doações de materiais de construção, produtos de limpeza para manutenção, material didático/escolar especialmente para crianças e doações financeiras. O EpiCentral também precisa de ajuda para divulgar que o espaço é aberto, não só para a comunidade, mas também para quem é de fora.

Para este perfil do EpiCentral o RioOnWatch conversou com Isabel de Meiroz Dias, fundadora e gestora do EpiCentral onde atua articulando projetos sociais e mobilizando atividades no Morro da Providência.

Atualmente, o espaço é um importante ponto nodal para projetos sociais. O EpiCentral abraça e reúne grupos engajados na comunidade que dialogam entre si. A gestão do espaço é compartilhada entre os participantes. De acordo com o site do EpiCentral: “Os projetos que ocupam a casa atualmente (Entre o Céu e a FavelaHorta InteligenteProvidenciando a Favor da VidaEfeito Urbano, e Cineclube Revolucionário do Morro da Providência) têm em comum o protagonismo de moradores da Providência: são eles os líderes e o público-alvo destas iniciativas”.

Histórico e Motivação

Em 2015, Isabel, nascida em Brasília, e seu marido Barney Lankester-Owen compraram uma casa no Morro da Providência–por terem se encantado com a casa e o local–e de forma orgânica foram percebendo a vocação que o espaço tinha para ser um espaço comunitário colaborativo. A partir de então, eles iniciaram as reformas de restauro para inaugurar um espaço aberto a parceiros que desejassem o utilizar para trabalhos, cursos, oficinas e vivências ligadas aos temas da sustentabilidade social, econômica e ambiental. Assim nasceu o EpiCentral.

O casal comprou a casa antes das Olimpíadas. Isabel narra as suas principais impressões ao chegar na comunidade e as transformações que ocorreram de lá para cá: “Ainda era gestão do Eduardo Paes, havia muitas obras acontecendo no entorno. Desde então o Boulevard Olímpico foi inaugurado, o VLT começou a funcionar, são coisas positivas para o entorno. Por outro lado, em 2015, quando começamos a trabalhar aqui, o teleférico funcionava, hoje ele parou de funcionar. Também têm algumas transformações na própria comunidade e nas pessoas que transitam aqui. Por exemplo, quando viemos pra cá, a UPP ainda era bem atuante, tinha uma presença no morro, mas ela tem se desmontado, tem perdido força, temos diversas situações de confronto. Mas também noto uma mudança na articulação das pessoas que estão aqui. Quando cheguei, não conhecia a quantidade de projetos, de pessoas atuantes. E eu não sabia que muitos deles não se conheciam ou não estavam em contato. Hoje isso mudou. Felizmente, hoje estamos mapeados, sabemos quem nós somos, a gente se encontra, se fala e estamos no caminho do nosso fortalecimento”.

A compra da casa na Providência levou o casal a se engajar nas questões sociais da comunidade, pois eles queriam se envolver com a comunidade. Isabel conta que “não queríamos ser mais um exemplo de gentrificação predatória sem respeito pela cultura e pelos moradores locais. Nós queríamos fazer parte da comunidade então decidimos transformar o EpiCentral em uma casa colaborativa que pudesse ser apropriada por projetos sociais e culturais na comunidade”.

O Projeto

O primeiro projeto do EpiCentral é a sua própria estruturação. Seguindo a Isabel, “a própria dinâmica de tomada de decisão já é um projeto”, pois na formação das regras, as decisões são feitas coletivamente:

“O EpiCentral atua para fortalecer um modelo de gestão e colaboração e isso é dinâmico. O EpiCentral é um espaço, como se fosse o hardware, e os softwares são os projetos.” – Isabel de Meiroz Dias

O EpiCentral cumpre a sua missão sendo ocupado por ações de vários projetos, tais como: o Favela CineClube; as oficinas da Horta Inteligente; os encontros do coletivo Entre o Céu e a Favelaoficinas de Audiovisual da LACCOPS–um laboratório da UFF; a participação na Virada Sustentável com oficina de Permacultura; e oficinas de marcenaria para mulheres. A casa é aberta e depende da demanda e dos interesses dos participantes.

“Hoje, os projetos atuantes em modo contínuo são o Favela CineClub que acontece mensalmente, e tem se fortalecido muito; tem o Horta Inteligente que faz semanalmente oficina com crianças, que está em um momento de ser abraçado pelas crianças locais, em um momento muito bom. A gente está trabalhando para conquistar a sustentabilidade financeira, que ainda não alcançamos, e temos as reuniões coletivas do Entre o Céu e a Favela que acontecem mensalmente, um projeto dinâmico que não tem começo, meio e fim.” – Isabel de Meiroz Dias

A Dinâmica do EpiCentral

A metodologia de planejamento coletivo é inerente ao EpiCentral, Isabel relata que “estava lendo o Círculo dos Sonhos“–uma dinâmica de gestão que realizaram coletivamente em junho de 2016 que é parte da metodologia de Dragon Dreaming (Dragão Sonhando) de planejamento coletivo–e ficou muito feliz porque viu que o EpiCentral já atingiu muito sonhos, como por exemplo: estar terminando a restauração da casa–que é uma casa antiga–com um orçamento muito limitado; se inserir na comunidade e ver a comunidade se apropriar do espaço, o que para ela “é o principal sonho realizado”.

Em 2016 foi necessário muito trabalho braçal para construir os canteiros e restaurar as paredes. “Houve um tempo longo dedicado às reuniões com os projetos locais. Toda semana tínhamos horário fixo para discutir os projetos, o local, as ações conjuntas. Hoje o EpiCentral já entrou em outra fase, pois os ocupantes estão assumindo mais o dia a dia da casa”, ela nos conta.

Desafios e Sonhos

Isabel afirma que o principal desafio é a geração de renda. “A gente opera no azul porque temos inquilinos residenciais o que permite que continuemos abertos, mas é um desafio que se torna mais complexo por conta dos confrontos e da violência entre a polícia e os traficantes na Providencia. Não é um caso exclusivo daqui, mas acaba atrapalhando a nossa geração de renda”.

A organização se sustenta financeiramente graças aos três casais inquilinos residenciais que vivem nas quatro instalações independentes do EpiCentral. Os alugueis permitem que o local funcione e continue fazendo os acabamentos finais da restauração. Além disso, foi realizada uma campanha de financiamento colaborativo, em 2016, que foi bem sucedida. Também há alguns eventos pagos, como o da marcenaria para mulheres destinado ao público externo (porém, moradores da Providência recebem bolsas). Quando é um projeto que não tem como pagar pelo espaço, como é o caso de projetos locais que fazem eventos sem fins lucrativos, não são exigidos recursos financeiros, mas sim uma contribuição em trabalho ou doação, tais como: envolvimento na gestão, participação em mutirão, doação de material de limpeza ou faxina.

Isabel descreve o seu sonho para a organização:

“Vejo hoje o EpiCentral como uma conquista que não é só minha, mas uma conquista da Providência, é um espaço aberto para eventos culturais, sociais que é uma necessidade e uma carência daqui. O meu desejo é que isso aumente, nosso calendário fique mais cheio de eventos, que a casa seja cada vez mais utilizada pelo público local. Gostaria muito que as pessoas de fora da Providência pudessem frequentar. Um sonho para mim, para a Providência e para o EpiCentral, é que aqui seja um local de paz e que as pessoas frequentem e façam cultura e projetos de desenvolvimento social aqui e em todo o morro.”

Público e Moradores

O EpiCentral tem quatro públicos alvo: os projetos que ocupam o espaço, os moradores da Providência, o público que não tem um projeto, mas quer ocupar o espaço de alguma forma, e há ainda o público que vem para participar dos eventos.

Isabel ressalta que “são os próprios moradores que estão ocupando o espaço. Além disso, é interessante ver o impacto na vizinhança que não está diretamente envolvida, mas está de olho em tudo que acontece. No começo eles tinham muitas dúvidas sobre esse espaço e o que acontecia aqui, achava que a gente era maluco. Mas atualmente ficou mais claro o que representa esse espaço”.

Ela destaca alguns eventos que demonstraram impactos positivos na comunidade: “O Favela CineClube pelo ativismo em trazer temas difíceis de ser debatidos na comunidade como visibilidade lésbica, legalização e/ou descriminalização das drogas, a questão das remoções… Temas difíceis que são debatidos e têm conquistado público. Destacaria o Entre o Céu e a Favela pela sua articulação com os projetos daqui. E também o Horta Inteligente pela questão das crianças terem abraçado o projeto e terem um apetite voraz por aprender sobre a sustentabilidade“.

Sustentabilidade e Desafios Ambientais

O foco da EpiCentral é sustentabilidade, seguido seus gestores, pois o projeto se espelha na permacultura, sendo o seu nome Espaço de Permacultura da Central do Brasil. O projeto busca a sustentabilidade social, financeira e ambiental. Como Isabel descreve: “Utilizamos [estes pilares] como um guia para nossas ações, seja no reaproveitamento de materiais, restauração, seja através da cultura colaborativa e das partilhas justas entre os ocupantes e responsáveis pela casa. Na questão ambiental temos coleta de água da chuva, temos plantas aqui–procuramos plantar plantas comestíveis, inclusive PANCS (plantas alimentícias não convencionais)–além das oficinas da Horta Inteligente que estão plantando sementinhas nas crianças. Elas têm um interesse e motivação para aprender sobre sustentabilidade incrível”.

Isabel também destaca os desafios ambientais enfrentados na comunidade. “O gargalo aqui da Providência é a violência que afeta todo o resto; em segundo lugar, eu diria o saneamento básico: temos problema de esgoto, fornecimento de água, problemas quando chove, não há drenagem apropriada; e em terceiro lugar, a coleta do lixo. Por mais que exista um sistema de coleta de lixo, não é suficiente ou apropriado, então temos muito lixo a céu aberto”, ela afirma, porém aponta uma boa notícia:

“Há projetos de moradores voltados para a sustentabilidade–não é algo que vem de fora. Projetos de gente daqui mesmo que teve essa ideia, essa sensibilidade, arregaçaram as mangas e estão fazendo algo a respeito disso. Por mais que não seja uma consciência predominante aqui, como acredito que não seja em local nenhum, vejo que há pessoas fazendo um trabalho muito importante e muito autêntico. Eu diria que o fato de estarmos aqui é um antídoto para mim em tempos de crise e de tanta má noticia, o que remete à questão da resiliência, estarmos resistindo e continuando, apesar da economia, da política e da segurança pública.”

Resiliência

Para Isabel a resiliência social da Providência e dos projetos é representada pela resistência. “Só o fato de estarmos aqui e continuarmos fazendo os projetos, apesar dos tantos pesares, é um sinal fortíssimo de resiliência. É o que temos feito, acreditando muito que nossa união é o que nos fortalece, é a nossa rede que vai nos fazer resilientes.”

Isabel cita um exemplo do que considera resiliência social, que ocorreu em outubro do ano passado. Ela explica que “um dos projetos da Providência, o Naturalê, de agroecologia, recebeu outros projetos: Efeito Urbano, Entre o Céu e a Favela e fui eu representando o EpiCentral. Nós ficamos trabalhando e ajudando a colher os alimentos, a preparar a terra, pôr adubo… Isso dos projetos se ajudarem, é um exemplo excelente de resiliência social, é se virar com muito pouco. O EpiCentral não existe sem a articulação dos seus ocupantes e seus projetos. Oferecemos a casa, o que vai ser feito depende do que as pessoas enxergam. Sem resiliência social não existe EpiCentral”.

Ela reflete que a proposta do EpiCentral, de ser uma casa colaborativa, é difícil para todos, “pois temos que colaborar de forma horizontal sem ter ninguém ditando regras e dizendo o que se deve fazer. É um aprendizado muito importante, para mim, e acho que para todos nós envolvidos, nossa cidade e país. Trabalhar horizontalmente é a chave para muitos dos nossos desafios”.

*O Permacultura da Central do Brasil (EpiCentral) é um dos mais de 100 projetos comunitários mapeados pela Comunidades Catalisadoras (ComCat)–a organização que publica o RioOnWatch–como parte do nosso programa paralelo ‘Rede Favela Sustentável‘ lançado em 2017 para reconhecer, apoiar, fortalecer e expandir as qualidades sustentáveis e movimentos comunitários inerentes às favelas do Rio de Janeiro. Siga a Rede Favela Sustentável no Facebook.