No sábado, 3 de março, o evento Favelas em Foto—Imagens por Direitos juntou moradores do Morro da Providência e fotógrafos da região para uma troca sobre a prática fotográfica e o papel da fotografia na criação de histórias da primeira favela. Reunidos em uma igreja ao lado da estação de teleférico desativada, os participantes usaram imagens de fotógrafos profissionais e registros históricos como ponto de partida para conversas sobre a memória da Providência.
Moradores compartilharam lembranças variadas, ora dolorosas, ora afetuosas. Algumas antigas, remetendo ao estabelecimento da favela há 120 anos, outras recentes, sobre políticas públicas, racismo, partidas de futebol, remoções e personagens memoráveis do morro.
Um dos participantes, Diego Deus, refletiu sobre como suas experiências crescendo no morro o levaram a se tornar fotógrafo.
Além dos adultos, as crianças participaram de todas as etapas do encontro. Observaram as fotos, compartilharam suas impressões e até fotografaram o evento.
Daniel Oliveira, de 7 anos e cria do morro, registrou diversos momentos do encontro, como o sorriso de um dos participantes.
Na parte da tarde, o evento trouxe falas de fotógrafos da região. Henrique Zizo apresentou o trabalho do Coletivo Foto Expandida, que promove oficinas de fotografia na Zona Portuária do Rio. “É um projeto sobre o processo de criação da imagem”, disse ele. Explicou que no início das oficinas, muitos participantes não se interessam pelas imagens produzidas, normalmente capturadas por uma câmera pinhole. Mas que ao passarem por todas as etapas de criação, que inclui a impressão das fotos em uma sala escura, os participantes desenvolvem um apreço enorme pelos registros.
Maurício Hora, fotógrafo renomado da Providência e responsável pela Casa Amarela, refletiu sobre sua prática fotográfica. Falou do foco de sua arte na documentação e das dificuldades em fotografar na favela devido à presença dos poderes armados (paralelo e estatal). Também refletiu sobre a inacessibilidade da fotografia para os moradores. “A comunidade participa muito pouco. A fotografia é muito filosófica e intelectualizada.”
Já Aline Mendes, também moradora, falou de seu esforço de reunir o acervo fotográfico de Sebastião Pires, que segundo ela, “fotografou o período de ouro da Providência”. Tião, como é mais conhecido, registrava batizados, primeiras comunhões, confraternizações nos botecos e toda sorte de evento cotidiano do morro. “Boa parte da história das famílias da Providência foi registrada pelo Tião”, explicou. O acervo do fotógrafo foi exibido no Museu de Arte do Rio (MAR), na exposição Constelação de Tião, e permanece no museu, para fins de preservação. Mas Aline fez questão de reforçar: “O lugar do acervo é aqui. Ele pertence à Providência”.
As trocas iniciadas no sábado terão continuidade na Providência e em outras favelas cariocas. Na Providência, o fotógrafo Fábio Caffé irá conduzir, em abril, uma oficina de fotografia para moradores. Interessados podem se inscrever pelo email favelaemfoto@gmail.com. E entre abril e maio a série de encontros Favelas em Foto terá edições na Vila Kennedy, Manguinhos e Santa Marta. O evento final será em junho e reunirá o conteúdo discutido em cada uma das favelas para gerar uma reflexão geral. Os encontros são uma realização do Favela em Foco e da Fundação Rosa Luxemburgo.