O texto original foi publicado por Thainã de Medeiros em sua página no Facebook.
Vocês são muito legais e inteligente tudo… mas tenho bons motivos para desconfiar que a maioria não lê as notícias que compartilha. Compartilham apenas pelo título e pronto! Colocam um textão sobre o quanto aquilo ali é um absurdo e blá, blá, blá, mesmo o conteúdo sendo sobre outra coisa, ou, como geralmente acontece, a notícia ser de muitos anos atrás. Isso distorce os fatos e cria novas fakenews.
Ainda gastam todo um academicismo pra deslegitimar as camadas mais populares que compartilharam fakenews durante essas últimas eleições.
Também fiquei revoltado com a estratégia do candidato eleito, mas a responsabilidade não é dessa parcela da população. É do candidato! A maioria das pessoas pobres tem pacote de dados apenas para WhatsApp e Facebook e são desses lugares que leem notícias apenas pelo título. Sabe aquele esporro que tu dá no bolsominion pobre: “Joga no Google?” Mas ele não tem acesso ao Google. Foi sujo o candidato ter usado essa brecha pra espalhar notícias falsas.
Você que tem diploma, acesso a um pacote de dados mais amplo, tem Google e não usa. Você eu não perdoo.
Antes de apontar teu dedo para as camadas populares que espalharam notícias fake, aponte para este candidato. E não se esqueça, aponte para você mesmo! Teus diplomas não te isentam de responsabilidade. Porque se de um lado a população mais pobre só tem o Facebook para ter acesso as notícias, significa que você também pode alimentar esta plataforma de notícias verdadeiras e que possam chegar a esta camada. Mas para isso… você precisa ter essas camadas no seu feed. Sabe a diarista que vive postando coisas de Jesus? Também é dela que estou falando. Não adianta estabelecer relação profissional com os amigos do escritório e ignorar que a recepcionista também trabalha no escritório. O “bom dia” que você dá não basta mais. Estamos na era digital, e se o “bom dia” não se tornar também uma expressão nas mídias sociais estaremos errando. E sabe quem dá “bom dia” todo dia nessas plataformas? A diarista do teu trabalho, e você ignora todos.
Ter pessoas de camadas populares em seu Facebook vai te incomodar. A gente adora dar “bom dia” no chat e colocar foto de nosso churrascão de fim de semana com foto sobre nossa favela, da família. Gosta de sair bem na foto e as vezes exageramos nos filtros de Instagram o que deixa um efeito estético ao qual você não está acostumado, algo que você chamaria de “cafona”. Não ligamos, continuamos fazendo porque estamos bem conosco. A gente compartilha notícia toda hora! Muita, muita! Notícias que você não vai concordar. Seu dedo vai coçar pra bloquear essa pessoa. Mas não apenas nosso senso estético tem outro filtro, as notícias que compartilhamos também.
Quer fazer alguma coisa contra fakenews? Admita novas estéticas narrativas em sua timeline, interaja com elas. Ajude a modificar esse algoritmo que nos fez perder essa eleição. Também leia o que compartilha antes de compartilhar, eu sei que você não lê. Clico na maioria das notícias que me chamam atenção e…enfim…vocês definitivamente não leem.
Thaiña de Medeiros é museólogo e jornalista, nascido no Complexo da Penha e residindo há quatro anos no Complexo do Alemão. Atua no Coletivo Papo Reto, um coletivo que usa o audiovisual como forma de fazer disputa de narrativa sobre a favela.