Habitação sem Construtoras

Veja a matéria original em inglês no FAVELIssues aqui

Na semana passada o Studio X Mumbai realizou um workshop de um dia intitulado provocativamente “Habitação sem Construtoras”. Como elaborado em seu site, o workshop tentou desafiar a aparente inevitabilidade de soluções baseadas no mercado, para os problemas que eles mesmos associaram a privatização do mercado de habitação. Os participantes do workshop discutiram como o desenvolvimento das favelas na Índia e as habitações públicas no ocidente desafiaram as normas aceitas de soluções baseadas no mercado. Este blog não resume os vários pontos relevantes discutidos pelos ativistas do assunto, urbanistas e acadêmicos no workshop, mas discute alguns conceitos que me faz pensar sobre habitação e política na cidade.

Aspiração:

São frequentemente usados como argumento e como bem sucedidos os esquemas de remodelação das favelas de Mumbai, nos quais os próprios moradores “aspiram” viver em apartamentos e têm vergonha da favela que habitam. Asher Ghertner denomina “Estética Governamental”. A tese de doutorado de Liza Weinstein em Dharavi (a maior favela da Índia) mostra como essa aspiração estética fica mais em evidência para as pessoas por causa dos processos estatais. Ela explica que as demolições das favelas de Mumbai em 2005, não expulsaram apenas os moradores “ilegais”, mas também aqueles que tinham documentos e que os tornaram elegíveis para habitação gratuita. Como não havia nenhuma maneira de separar as suas casas das outras na favela, o governo expulsou o lote inteiro.

No entanto, em um nível mais profundo, a aspiração utilitária de sobreviver na cidade desafia imediatamente essa aspiração estética. Ela nos permite aprender um pouco mais sobre como a forma de habitação e a localização, se refere à sobrevivência diária e ao bem estar. Este não é apenas um exercício que se relaciona com os pobres nas favelas. Em minhas conversas diárias com amigos e familiares, me deparo com casos em que as pessoas expressam seus desejos incontroláveis em quebrar os apartamentos esteticamente agradáveis ​​que passaram a habitar. O desejo de trabalhar em casa; o desejo de não ter nada, mas ter um quarto na cidade; o desejo de compartilhar uma sala de estar, mas não a cozinha com a família; querer uma porta extra; uma pequena casa, mas com uma grande sacada etc. Mesmo mantendo-se a estrutura de propriedade e a localização dentro da cidade, como sendo uma constante na lista de desejos formais quanto mais cavamos, mais se complica a aspiração estética de possuir um apartamento padrão na cidade.

Equidade:

ImageIsso me leva ao próximo ponto. Se aspirações e necessidades são tão variadas como vamos então imaginar habitações com essas aspirações e como podemos imaginar uniformidade na habitação? Qual é o tamanho certo, tipo e posse que deve ser a base mínima para todos? A apresentação do arquiteto Kamu Iyer na conferência destacou que não há consenso na Índia, para o tamanho mínimo básico de uma unidade de moradia. Como explicou, o tamanho das moradias chawl britânica foi derivada da extensão máxima da madeira que estava disponível para essa altura. Ainda hoje, o tamanho de habitação mínimo proposto pelo esquema do governo para reconstrução, está constantemente sob fluxo e é dependente da economia e da política que está em torno dos projetos individuais.

Então, se o tamanho mínimo básico em si está sob fluxo e  às necessidades são subjetivas, por que tipo de habitação os ativistas devem lutar? Com que tipo de moradia deve se parecer? Prasad Shetty propôs que é mais fácil lutar por igualdade de infraestrutura – tais como direitos para saneamento, água, transportes, saúde e educação, ao invés do valor do imóvel. Na verdade, lutando por um tipo de habitação ideal eventualmente joga-se para demandas de remodelações e apaga-se a pluralidade na forma de moradia, estrutura e propriedade fornecida pela favela. Mumbai talvez precise rever os sistemas de degradação da favela, ao invés de empurrar para as remodelações.

A Contradição:

Este é o ponto em que as conversas sobre habitação dos EUA e da Índia convergem. Lembro-me de estar sentado em uma aula de economia em Berkeley e ouvir meu professor falar do ponto exato contra a habitação pública nos EUA. A habitação pública carrega o fardo do estado fornecer um certo padrão, saudável, de tamanho, qualidade e estabilidade, e talvez, os moradores repassassem o imóvel  para retornar para habitações de qualidade mais barata, porém melhor localizada. Assim vai o argumento de que a habitação pública, apesar de nobre em sua intenção, não é o modelo mais eficiente para garantir moradia para as massas. Apesar de não ser a solução de mercado “tradicional”, a favela esta sendo usadacomo um caso semelhante contra a remodelação de habitação em Mumbai.

Qualidade de vida básica e a equidade contra a pluralidade de escolha individual, deixou-me desconfortável. No final da conferência, no entanto, fiquei pensando sobre a declaração de Prasad: “Não é que a equidade não seja importante, apenas não é uma tática para eu lutar agora”.