Retrospectiva 2021: Melhores e Piores Reportagens Internacionais sobre as Favelas do Rio [EDITORIAL]

RESUMO DE UM ANO DE REPORTAGENS SOBRE FAVELAS

Com a popularização dos jogos online no Brasil, a representatividade se tornou cada vez mais urgente e o racismo também. Ilustração: Momo Pixels

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Esta é a contribuição mais recente da nossa série anual de matérias analisando as Melhores e Piores Reportagens Internacionais sobre Favelas do Rio, que faz parte do debate promovido pelo RioOnWatch sobre a narrativa e as representações midiáticas acerca das favelas cariocas.

Introdução à Edição de 2021

2021 foi um ano único, inclusive em suas manchetes. Ainda se recuperando da pandemia do coronavírus, o mundo procurou se adaptar às suas consequências quando a crise entrou em seu segundo ano. Despreparado para os efeitos devastadores de um vírus desconhecido e de uma gestão criminosa na parte do seu governo, o Brasil viu o retorno da fome, da pobreza e do desemprego generalizado na pior crise econômica dos últimos 20 anos. Em meio a ecos familiares de problemas antigos, moradores de favelas tinham um vislumbre de esperança de que suas vidas cotidianas seriam isentas de conflitos constantes em seus territórios, uma esperança acesa pela decisão do Supremo Tribunal Federal de agosto de 2020, que suspendeu as operações policiais nas favelas durante a pandemia e levou a reduções drásticas na violência. No entanto, essa esperança acabou rapidamente devido ao flagrante descaso da polícia com o que ficou conhecido como ADPF das Favelas.

Tais eventos são dignos de notícia e precisam ser divulgados. É, no entanto, a forma como chegam ao público que continua a ser uma preocupação e, mais uma vez, a principal constatação deste editorial anual. Cansados ​​de uma cobertura considerada, por vezes, ofensiva, imprecisa ou simplesmente falsa, moradores de favelas têm se organizado cada vez mais para disputar a produção de informações, reivindicando a narrativa de seus territórios e corpos. O crescimento e empoderamento do jornalismo de base comunitária fica evidente por meio do reconhecimento de projetos como o nosso premiado Enraizando o Antirracismo nas Favelas que recebeu ambos um Anthem Award e o Prêmio Megafone de Ativismo Brasileiro. É consenso que uma mudança narrativa é necessária para transformar a realidade e influenciar as políticas públicas, tornando crucial que as informações sobre as favelas sejam pensadas, produzidas e discutidas pelos seus próprios moradores e também por pessoas de fora em diálogo com eles. Em um contexto em que as autoridades optam sistematicamente por negligenciar esses territórios e seus moradores, o papel da mídia internacional deve ser cada vez mais um de compartilhar soluções vindas das favelas e conscientizar sobre as crises que as favelas estão enfrentando.

Ação ‘Maré diz não ao coronavírus', realizada durante a pandemia. Foto por: Douglas Lopes

A Pandemia nas Favelas Segundo as Melhores Reportagens Internacionais do Ano

Nunca foi fácil ser um morador de favela, mas enquanto a economia estava fechada devido ao coronavírus, a negligência do Estado, o desemprego, a morte e a fome ditaram o tom trágico. O número de refeições diárias consumidas por moradores caiu de uma média de 2,4 em agosto de 2020 para 1,9 em fevereiro de 2021. A ABC News divulgou uma matéria com dados de uma pesquisa realizada pelo Instituto Data Favela, uma parceria entre a Central Única das Favelas (CUFA) e o Instituto Locomotiva destacando um cenário crítico: 68% dos moradores de favelas declararam ter problemas para conseguir alimentos por pelo menos um dia, nas duas semanas anteriores à pesquisa.

Grafico da 'Campanha Olhe Para Fome'Com a inflação elevadíssima, o poder de compra caiu de forma generalizada, impactando as famílias de baixa-renda mais do que nunca neste século. Em 2021, 71% das famílias de favelas tiveram que sobreviver com o equivalente da metade de seus orçamentos familiares pré-pandemia, em territórios onde 93% da população não tem poupança. Isso impacta muito na quantidade e qualidade dos alimentos que uma família consome.

Um artigo publicado na revista Borgen descreveu como as organizações comunitárias tiveram que intervir para impedir que os moradores das favelas passassem fome durante o fechamento da economia associado ao coronavírus. Três outras publicações mostraram como as iniciativas de agricultura urbana nas favelas garantiram comida saudável na mesa dos moradores: uma da Al Jazeera sobre um projeto de Manguinhos que estabeleceu a maior horta urbana da América Latina, conforme também relatado pela Reuters, e outra da Sproutwired sobre uma organização chamada Horta Agrofavella, em Heliópolis, a maior favela de São Paulo. Todos os três artigos enfatizam a resiliência e a importância do “nós por nós” das favelas. É possível afirmar que as favelas se salvaram da fome durante a pandemia de coronavírus.

Horta comunitária em Campo Grande. Foto: Movimento Baía Viva

Embora a insegurança alimentar tenha sido constante, com a fome e a pobreza durante a Covid-19 causados pelo negacionismo e inação do Presidente Bolsonaro, conforme retratado por uma série de artigos da BBC, a favela protegeu os seus—e se manteve viva graças a si própria. Com protestos e gritando o agora famoso lema “Nem de Tiro, Nem de Covid, Nem de Fome! O Povo Negro Quer Viver!”, moradores das favelas se revoltaram contra o governo federal que, descaradamente, largou as pessoas para lutarem pela própria sobrevivência, por meio da auto-organização e da força coletiva. Conforme descrito pela Reuters, muitos moradores de favela dependiam totalmente de doações de cestas básicas: pesquisas mostraram que as próprias favelas ajudaram e doaram mais do que os moradores da cidade formal. Em outras palavras: a maior parte da ajuda que os moradores de favelas receberam veio de seus vizinhos e de outros moradores. Essa estratégia de sobrevivência “nós por nós” chegou à CGTN em 2021 por meio da história do compromisso do líder comunitário Thiago Firmino, de desinfetar pessoalmente os becos e escadarias de sua comunidade, o Santa Marta, na Zona Sul do Rio.

Desde o início da pandemia, o governo não produziu dados específicos sobre favelas, sobre taxas de infecção, vacinação ou testagem. Consequentemente (não por coincidência) não forneceu os meios para um distanciamento social eficaz ou assistência hospitalar quando necessário. Nem foi oferecida orientação correta, como a NPR afirmou: a principal estratégia do governo era um coquetel de drogas cuja ação não era comprovada.

Nem de Tiro, Nem de Covid, Nem de Fome! O Povo Negro Quer Viver!

Em 2021, as iniciativas das favelas contra as táticas necropolíticas de Bolsonaro tomaram as bancas de jornais em todo o mundo. O Painel Unificador Covid-19 nas Favelas*, por exemplo, foi mencionado pela Reuters e pela Global Americans como uma solução comunitária para a subnotificação crônica provocada pela negligência do governo.

Com tudo isso, o presidente Jair Bolsonaro viu suas taxas de popularidade caírem para os níveis mais baixos desde sua posse em 1 de janeiro de 2019. Em novembro de 2021, seus índices de aprovação caíram para um recorde de 19%, enquanto seus níveis de reprovação chegaram a 56% no mesmo mês, conforme noticiado pela revista Time e The Brazilian Report.

Reportagem Internacional de Qualidade sobre o Massacre de Jacarezinho e Política de Segurança

O mês de maio começou com o que ficou conhecido como a operação policial mais letal em toda a história do Rio: a Chacina do Jacarezinho. Parte do material publicado sobre a chacina na mídia internacional foi bem feito, detalhado e analítico, muitas vezes oferecendo relatos pessoais profundos que buscavam desnaturalizar o racismo estrutural do Brasil e sua consequente violência racial arraigada. Esse foi o caso de uma fotorreportagem do The Washington Post que expôs o padrão violento e ilegal da atuação da Polícia Militar do Rio de Janeiro durante o massacre. La Prensa Latina retratou a aceitação social da desumanidade das operações policiais mortais, alimentada pelo apoio total do Presidente Bolsonaro e do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro à brutalidade policial e aos assassinatos. Essa opção pela violência foi destacada pelo The Guardian como uma razão subjacente para a carnificina em curso que vem tirando a vida de moradores de favela, em sua maioria negros. Para alguns, este episódio no Jacarezinho foi a gota d’água e, como dito no France 24, desencadeou um apelo urgente por mudanças.

Em um podcast do The Guardian, o correspondente da América Latina, Tom Phillips, descreveu o Jacarezinho como uma comunidade afro-brasileira centenária e vibrante, além de um centro industrial histórico. Ao visitar a favela no dia seguinte aos 28 assassinatos, Phillips conversou com moradores e, dando um relato detalhado do massacre, descreveu o que estava vendo como uma caça às bruxas. “Mesmo não sendo acusado de nada… Se você é um jovem negro, sua chance de ser baleado [aqui] é muito alta.” Ele encontrou vestígios dessa violência generalizada ao longo de 500 anos, refletindo o legado contundente da escravidão africana e afro-brasileira no Brasil. Ele conta que caminhou de sul a norte da comunidade, do rio até a Escola de Samba Unidos do Jacarezinho, conversando com os moradores. O jornalista testemunhou pessoas protestando e lamentando os assassinatos de seus entes queridos. Alguns dos mortos, vítimas da ação policial indiscriminada, foram fortemente defendidos como inocentes por parentes e moradores. Phillips questionou o porquê de supostos criminosos terem sido sitiados e mortos ao invés de presos, como determina a lei.

“A narrativa oficial no primeiro dia era que a polícia estava realizando uma operação para combater o envolvimento de crianças e adolescentes no tráfico de drogas. Bem, crianças e adolescentes infelizmente estão envolvidos em facções criminosas há décadas. Então, porque era necessário fazer esse tipo de operação com base nisso agora, eu não sei… Depois que um policial foi morto nos minutos iniciais da operação [por volta das 6h da manhã], alguns policiais começaram a barbarizar por toda a favela: ativistas chamam de ‘operação vingança’, quando policiais furiosos e fortemente armados decidem perseguir e matar alvos do tráfico de drogas e jovens moradores que podem parecer potenciais traficantes aos olhos dos policiais.” — Tom Phillips

Uma característica muito interessante deste podcast é que, embora seja narrado em inglês, o público pode ouvir trechos em português de moradores do Jacarezinho ao longo do episódio: “ele é de um jornal inglês”; “não sei quem é não, mas o menino está morto”, disse uma mulher em tom baixo e triste; “Não vai papai! Não vai, eles vão te matar!”, gritou uma filha desesperada temendo pela vida do pai. Essas falas não foram usadas para estigmatizar ainda mais as favelas. Ao contrário, esses pedaços de realidade aproximam o público da atmosfera do Jacarezinho durante e logo após o massacre.

Apesar do Supremo Tribunal Federal ter proibido as operações policiais no Rio, a menos que sejam exigidas em circunstâncias excepcionais, incursões policiais das mais letais, como essa no Jacarezinho, têm matado centenas, senão milhares, anualmente, conforme análise do The Guardian. Somente depois da Chacina do Jacarezinho foi que, como noticiou a AP, os ministros do Supremo decidiram rever a proibição das operações policiais nas favelas do Rio durante a pandemia, tornando ela mais rigorosa.

Talento e Criatividade das Favelas Mostrados na Mídia Internacional

Em meio a essas crises, as potencialidades das favelas, principalmente no que diz respeito à tecnologia, esportes e criatividade, também ganharam manchetes no exterior. O projeto brasileiro Gerando Falcões, por exemplo, foi retratado pela revista Forbes como uma possibilidade de erradicar a pobreza por meio de favelas inteligentes. O texto retrata Edu Lyra, um influente líder das favelas de São Paulo, que está tentando criar o que ele chama de “favela inteligente”. Ele quer que centros de negócios de alta tecnologia se tornem marca registrada das periferias do país.

Vários artigos perspicazes enquadram as favelas como centros de solução para problemas urbanos complexos de longa data. Um estudo da Lund University mostrou como a natureza é importante para os moradores de favelas e como muitos buscam preservá-la, tentando encontrar soluções para seus problemas ambientais na ausência do governo. A Wion News preparou uma videorreportagem sobre o potencial de produção de energia solar através do exemplo da cooperativa solar RevoluSolar nas favelas da Babilônia e Chapéu-Mangueira. Considerado que o custo da eletricidade no Rio cresceu 105% na última década, a instalação de painéis solares é cada vez mais vista como uma forma de iluminar casas de favela, conforme publicado pelo Yahoo!.

Enquanto isso, as dez maiores favelas do Brasil criaram seu próprio sistema bancário em 2021. Um vídeo apresentado na CGTN America mostrou o Banco G10, uma instituição financeira de favela que oferece microcréditos a pequenos empresários e cartões de crédito e débito para moradores de favelas excluídos do sistema bancário tradicional. A iniciativa foi coberta pela AFP e acabou também na France 24 e no The India Times.

O esporte sempre foi uma fonte de esperança para as favelas. O jogador de futebol Douglas Luiz disse ao The Guardian: “Tenho orgulho de ser da favela. Eu provei que podemos vencer”. Meio-campista do time inglês Aston Villa e cria da comunidade Nova Holanda, no Complexo da Maré, ele fala sobre o que significa ter sido criado na favela, com toda a falta de acesso e de oportunidades que isso implica. A mensagem dele é que os sonhos podem se tornar realidade.

“Estou feliz porque provei que nós podemos, que conseguimos alcançar nossos sonhos. Clubes me rejeitaram no passado, eu não tinha como me sustentar, mas agora estou aqui.” — Douglas Luiz

Embora muitos, como Douglas, tenham sonhado em se tornar estrelas do futebol, os eSports (esportes eletrônicos) recentemente se mostraram uma fonte de esperança para jovens moradores de favelas. Conforme coberto pela Wired, além de desafios oriundos da exposição à violência, restrições orçamentárias, fome, negligência e exclusão social, os gamers, jogadores de eSports, das favelas também têm problemas com relação ao acesso a dispositivos de qualidade e conectividade à internet. Sem mencionar o acesso pouco confiável à eletricidade.

“Os jogadores das favelas costumam jogar pelo Wi-Fi da casa do amigo, sempre driblando as dificuldades.” — Preto Zezé, presidente da CUFA

A maioria dos gamers no Brasil são mulheres e afro-brasileiras. Nesse cenário, os estúdios de design de jogos vêm criando enredos e personagens que dialoguem com as(os) jogadoras(es) brasileiras(os). A reportagem da Wired afirmou que os times começaram a focar nas favelas para recrutar gamers e que a CUFA organiza um evento anual, a Copa Favelas, que recebe 12 times de todo o país para uma competição de Free Fire, com um público de mais de 120.000 pessoas assistindo o evento ao vivo.

A revista Wired retratou a vitalidade do jogo na favela. Arte: Phellipe Wanderley

Originalmente criada como um campeonato de futebol, a Copa Favelas mudou seu foco em meio à pandemia em 2020 para os eSports. Free Fire foi o jogo escolhido por ser leve e por rodar facilmente mesmo em celulares antigos. É também o jogo mais praticado nas favelas e no mundo, com mais de 150 milhões de usuários ativos diariamente em todo o planeta. Em 2021, cerca de 200.000 jogadores em 1.300 times participaram da Copa Favelas. Há um prêmio em dinheiro e um bootcamp para a equipe vencedora.

O Esports Observer apresentou um artigo sobre o AfroGames, uma oportunidade digital de lidar com a pobreza para jovens de favela ligados à tecnologia criada pela ONG AfroReggae, em Vigário Geral, também na Zona Norte do Rio. É o primeiro centro de treinamento de eSports localizado em uma favela no mundo e é voltado para a qualificação de jovens profissionais de favela para um mercado crescente que, no Brasil, sofre com a falta crônica de mão-de-obra.

Time de League of Legends do AfroGames. Foto: AfroGames

Recebendo uma bolsa de R$1000 por mês, 100 alunos da AfroGames estão aprendendo a programar, jogar e falar inglês para se qualificarem para empregos de alta tecnologia bem remunerados. Durante a pandemia, os alunos puderam ajudar a sustentar suas famílias enquanto faziam algo que amam. Sonhando em se tornarem streamers de sucesso, as equipes da AfroGames de League of Legends e de Fortnite são as favoritas dos alunos. Este projeto de Vigário Geral também oferece treinamento físico e apoio psicológico para ajudar os alunos a lidar com a ansiedade.

Moradores de favelas têm muitos motivos para se orgulharem de seus talentos e criatividade. A cultura é, de longe, o bem mais celebrado da favela. No segundo ano da pandemia, um vídeo da CGTN apresentou uma celebração de Páscoa literária muito especial para crianças do Complexo do Alemão. O clube comunitário de leitura para crianças é organizado pela creche Estrelinha e Otávio Junior, criado nas favelas vizinhas do Complexo da Penha, que é vencedor do Prêmio Jabuti. Este clube foi a salvação para a saúde mental de muitos pequenos durante a pandemia, especialmente os que vivem em casas pequenas, que não vão à escola e que têm acesso limitado à internet.

As favelas também inovaram na tentativa de garantir festas e comemorações típicas. Em nossa segunda Páscoa pandêmica, as tradicionais encenações da Rocinha—a Paixão de Cristo e a Via Crucis—não puderam sair às ruas com seu elenco habitual de indígenas e moradores de favelas como protagonistas. Contudo, em 2021, integrantes da companhia de teatro “Bando Cultural Favelado” decidiram fazer uma Paixão de Cristo bem diferente, respeitando as regras de distanciamento social. De muitos telhados de casas da Rocinha, moradores e indígenas cariocas–dos povos Tupiniquim, Guajajara e Xukuru–ofereceram versões seguras de narrativas bíblicas. Os moradores da Rocinha puderam assistir ao show de suas janelas e terraços enquanto também era transmitido ao vivo nas redes sociais. De acordo com um artigo publicado pelo Republic World, esta apresentação mostrou religiosidade, inventividade, cultura próspera, empatia e solidariedade na maior favela do Rio.

Outro artigo muito bom da AP sobre bens culturais da favela reflete como o trap de cria, o rap e o funk impactam a vida dos jovens. Como os rappers e slammers de favela estão sempre profundamente conscientes das experiências cotidianas da classe trabalhadora e da política do país, MV Bill foi retratado pela Radio Télévision Luxembourg (RTL) não apenas como um rapper, mas como uma importante liderança política.

Piores Reportagens Internacionais sobre Favelas

A qualidade das reportagens sobre favelas melhorou absurdamente ao longo dos anos, embora o uso do termo ‘slum’ continue sendo difundido, mesmo em muitos dos artigos descritos acima: uma palavra que não reflete remotamente o que as favelas são hoje e que estamos advogando contra o uso para descrevê-las há uma década. Quando publicamos o primeiro artigo desta série, em 2013, não havia sequer uma reportagem produtiva sobre favelas para reconhecer da mídia de língua inglesa. Desde então, temos visto melhorias ano a ano a ponto deste ano tomarmos a decisão de não focar esta reportagem nas piores reportagens da mídia sobre favelas, porque eram poucas, porque muitas vezes eram de veículos de baixo alcance, e para não dar mais atenção para elas.

Aqueles que identificamos incluíam artigos que retratavam opiniões—não fatos—compartilhadas por policiais e formuladores de políticas linha dura, e visões tendenciosas e racistas, criminalizadoras da favela, reforçadoras de estigmas, que desonra os direitos humanos e super-representa aspectos negativos das favelas. A desvalorização da favela como comunidade e polo de inovação, de cultura e de soluções também continua sendo uma característica das piores coberturas: ​​persiste a idéia estereotipada, o clichê de que uma pessoa só prosperará quando sair da favela. Ainda há artigos cobertos pela clássica falácia da salvação pelo afastamento da favela (uma versão do complexo do branco salvador), insinuando que as favelas são a barreira para a realização de potenciais, ao invés da fonte de tais limitações estar no descaso e na repressão por parte da sociedade e do Estado brasileiro. Moradores de favelas não precisam ser salvos. O que eles precisam é de serviços públicos de qualidade, oportunidades, igualdade, apoio e ter suas vozes ouvidas.

*O RioOnWatch e o Painel Unificador Covid-19 nas Favelas são iniciativas da ONG Comunidades Catalisadoras


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