No dia 17 de junho de 2023, será realizado o lançamento da Exposição de Memória Climática da Rede Favela Sustentável (RFS)*. Para dar um gostinho, estaremos até lá publicando uma série de matérias que resumem a dinâmica de cada roda de memória realizada, em cinco museus comunitários, entre janeiro e março deste ano, que compõe a exposição. Esta primeira matéria da série apresenta a primeira roda, realizada no dia 28 de janeiro, pelo Museu da Maré. O projeto foi desenvolvido pelo Eixo Cultura e Memória Local da RFS, composto por museus comunitários integrantes, aliados técnicos e mobilizadores de diversas favelas do Grande Rio.
As Rodas de Memória Climática da Rede Favela Sustentável têm como objetivo resgatar e registrar as memórias e histórias que guardam os moradores de longa data das favelas do Rio de Janeiro, sobre o tema do clima, para que possamos enxergar formas de nos preparar para as mudanças climáticas que estão por vir. O tema tradicionalmente é raramente abordado, apesar de, como mostraram as rodas, ser muito presente no cotidiano das favelas.
Em uma série de rodas que acontecem ao longo de um dia, desenvolvidas para focar e aprofundar este assunto, os moradores convidados pelos museus trocam visões sobre suas vivências e experiências com as mudanças climáticas, resgatam memórias sobre a relação da formação de suas comunidades com a natureza e clima, dialogam sobre a relação do clima com a realização do direito à moradia, e abordam as soluções e mobilizações feitas pelos próprios moradores, destacando as prioridades equivocadas do Estado, que tende a ver remoção como uma solução.
No dia 28 de janeiro de 2023, aconteceu a primeira da série: a Roda de Memória Climática da Maré, realizada pelo Museu da Maré, com a participação de 57 pessoas, entre os mais antigos do Complexo da Maré, até os mais jovens, alguns deles representantes de importantes coletivos mareenses, como o Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (CEASM), Cocôzap, Muda Maré e Raízes da Mata, entre outros. Outros museus de favela também estavam representados.
Logo na entrada do museu, os participantes puderam conferir uma exposição fotográfica, com banners espalhados contendo fotografias históricas, em preto e branco, que traziam memórias importantes da formação do Complexo da Maré, desde as casas de palafitas até imagens aéreas dos anos 1990, quando a Maré foi oficialmente reconhecida como bairro, apesar de até hoje não ser investida de acordo.
O evento se iniciou com duas dinâmicas afetivas. Na primeira, proposta por Brenda Vitória, jovem ativista ambiental do território, os participantes se dividiram em grupos de três, que se apresentaram e relataram curiosidades sobre si. Criando uma conexão entre os participantes, houve o revezamento entre os grupos, até que todos tivessem tido contato uns com os outros. Depois disso, Marilene Nunes, integrante do Museu da Maré, convidou a todos para o segundo momento lúdico, onde, de dentro de uma bacia, eram retirados nomes de pessoas que levaram objetos pessoais para apresentar aos demais: itens carregados de memórias afetivas, que dialogam com as temáticas propostas no evento.
Dentre muitas falas marcantes, dona Evelina Barth, moradora do Complexo da Maré há mais de trinta anos, emocionou todos ao evidenciar em seu relato um passado de muita pobreza, sua e dos seus semelhantes, e falta de acesso a itens básicos para a sobrevivência, como medicamentos, o que culminou em seu trabalho com plantas medicinais. Há décadas, ela se transformou em uma referência, muito procurada na comunidade.
“Fomos convidados a fazer cursos para poder trabalhar com plantas medicinais. E aí começamos o trabalho na Maré, na Vila Pinheiro. Aí tivemos também ajuda, podendo fazer assim artesanal, bem simplezinha, né, e ali nós trabalhamos até hoje. É o trabalho preferido da minha vida. A fitoterapia que é a planta medicinal, é um chá preventivo, mas ele ajuda realmente a pessoa a ficar boa.” — Evelina Barth
Outro tema de destaque durante a dinâmica foram as remoções ocorridas nos anos 1970, no Complexo da Maré, quando 450 famílias foram retiradas da Praia de Inhaúma e levadas para Antares, favela localizada em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Leonardo Ribeiro de Sousa, cria de Antares, estudante de licenciatura em História e pesquisador, participou da roda como representante do Núcleo de Orientação e Pesquisa Histórica de Santa Cruz (NOPH). Em suas falas Leonardo contextualiza esse processo de remoção, que está ligado intimamente à sua própria história de vida. Ele falou, mostrando o caderno com todas as suas anotações de pesquisa sobre o processo de ocupação da favela de Antares.
“Dentro desse processo, existe a remoção de 450 famílias que foram retiradas da Maré, da Praia de Inhaúma, em março de 1975. Dentre elas, a minha mãe, que saiu daqui da Praia de Inhaúma… Uma vez, eu vim aqui na Maré e tirei uma foto da casa de palafita que tem ali [dentro do museu] e mostrei pra minha mãe. Ela chorou e eu fiquei emocionado… Não participei [desse processo de remoção], eu já nasci em Antares. Mas isso me trouxe uma memória afetiva muito grande, pelas histórias que minha mãe conta pra mim sobre as questões que aconteciam aqui. Meu irmão caiu em uma das passarelas [entre as palafitas, que serviam de ruas sobre as águas da Baía de Guanabara], e aí foi aquela comoção da comunidade inteira pra poder resgatar meu irmão. Então, eu faço essa pesquisa que liga a Maré e Antares, nesse processo de remoção super agressivo. Por isso, fiz questão de colocar essa pesquisa [na bacia, para compartilhar com os participantes da roda]. Eu tô muito feliz de estar aqui, como museu NOPH, como convidado da RFS e aqui na Maré, de onde a minha família veio, parte da minha raiz. Então, eu agradeço muito.” — Leonardo Ribeiro de Sousa
O Que São as Mudanças Climáticas?
Após o momento de introdução afetiva do evento, deu-se início ao ciclo de quatro rodas de conversa e construção coletiva sobre os temas propostos em cada uma. Na primeira roda, com o tema “O que são as mudanças climáticas?”, Gleison Carvalho, jovem morador da Maré e facilitador da roda, convidou os presentes a contribuir com a visão pessoal de cada um sobre mudanças climáticas e como elas afetam o território.
Thamires Ribeiro de Oliveira, da equipe do Museu da Maré, compartilhou uma memória afetiva sobre sua avó paterna, já falecida. Nordestina e moradora da Maré, ela tinha uma ligação com a roça e com plantas medicinais. O poder da natureza sempre esteve ao redor de sua família na Maré. Além disso, relembrou, com saudade, os tempos de infância na favela, tempos em que o contato com os vizinhos, o cuidado uns com os outros e o compartilhamento eram mais intensos que hoje.
Ela também falou sobre outro momento marcante de contato com a educação ambiental, um evento chamado Semana Nacional do Meio Ambiente (SENAMA), que acontecia na Baixa do Sapateiro. Mesmo criança, sem compreender, na época, as dimensões políticas que as atividades promoviam, ela disse ter sido impactada pelas atividades, que lembra até hoje.
Luiz Carlos Santiago é um morador da Maré que atua, há vinte anos, com a promoção da coleta seletiva. Todo seu ativismo tem como base a importância do descarte correto do lixo, o poder da reciclagem e como ela pode se tornar geradora de renda para as famílias. Ele contou aos presentes como começou esse importante trabalho ambiental.
“As pessoas estavam desempregadas… Profissões que vão desaparecendo ao longo do tempo… E aí nós começamos a perceber que as pessoas jogavam material reciclável fora e, muitas vezes, não tinham dinheiro pra comprar o pão. Não entendiam que dava pra vender as garrafas pet e ir na padaria comprar o pão… Então, tantas coisas que a gente joga fora… tinha um valor econômico. Tinha não, tem valor econômico. O que nós pensamos em fazer foi explicar para a comunidade todo esse valor que tem a garrafa pet, a latinha… que poderiam ser canalizados para trazer recursos pra dentro da comunidade… Há 20 anos, geramos trabalho e renda para as pessoas. Há 20 anos, geramos condições para as pessoas irem ao supermercado, fazer suas compras, pagar sua luz, pagar a sua dívida, porque nós trabalhamos com material reciclável. Então, nós precisamos repensar a questão do lixo, sabe? O que é lixo?” — Luiz Carlos Santiago
Luiz Carlos apresentou ainda soluções para a questão do acúmulo de lixo nas ruas das favelas da Maré, problema antigo que atinge a localidade em que mora. Ele refletiu sobre o manejo dos resíduos sólidos e as mudanças climáticas nas favelas:
“As pessoas ainda não acordaram! Nós precisamos, dentro da Maré, de uma usina de tratamento desse material. Outra coisa que a gente precisa pensar, se articular: gente, as mudanças climáticas já chegaram… nós já somos atingidos, mas seremos muito mais, porque nós estamos perto do mar… E aí, por que a UFRJ, que é um centro de pesquisa de excelência do Brasil, a maior universidade [federal do país]… não dá um retorno para a comunidade que está no entorno dela? Precisamos pressionar essa universidade para que nos deem respostas… [temos que] cobrar das autoridades, políticas públicas que, pelo menos, minimizem o prejuízo e a problemática que vamos ter através das mudanças climáticas.”
Antonio Carlos Vieira, nascido no Morro do Timbau e ex-presidente da associação de moradores desta comunidade do Complexo da Maré, questiona o distanciamento das mudanças climáticas, como se fossem algo futuro, à parte da nossa própria realidade. Ele alerta que esse processo já está em curso há anos e é necessário agir.
“Antigamente, no verão, [quando] a gente tinha um dia de calor, o que que acontecia no finalzinho da tarde? Vinha uma chuva, um temporal caía, a gente tomava banho de chuva, era a maior festa. Quem tem isso hoje? Eu lembro na minha infância de ficar quase um mês sem chover aqui no Rio de Janeiro, né? E também essa questão que impacta muito a saúde da gente, né, o aumento nas doenças respiratórias, o aumento dos casos de câncer. O câncer hoje já é uma coisa endêmica, ninguém fala sobre isso, né? Então, a gente tá vendo aí uma escalada de problemas que a gente precisa estar muito atento. Tem a questão do aumento do nível do mar, mas tem outras. Tem outras questões que já estão no nosso dia a dia e que a gente tem que estar atento. O aquecimento global, essa mudança climática, já está acontecendo na nossa vida. Quando a gente era criança, a gente mal tinha um ventilador em casa. Hoje em dia, quem consegue dormir sem um ar condicionado? Então, quer dizer, esses são elementos que a gente tá vendo, que já estão impactando a nossa vida e que a gente precisa estar muito atento.” — Antonio Carlos Vieira
Houve muitos mais relatos de extrema importância, como a fala de Edilene Nascimento, que representava a Associação de Pescadores da Vila do Pinheiro (APEMAR). Ela trouxe à reflexão um pouco dos desafios enfrentados pelos pescadores para realizar suas atividades diárias, como a dificuldade do acesso ao Canal do Cunha, devido à grande quantidade de lixo presente no manguezal. O racismo ambiental impera, pois a falta de atuação do poder público na limpeza e recuperação são “justificadas” por se tratar de local de área de risco.
“Os pescadores ficam mais de duas, três horas, às vezes, tentando acessar a associação. O manguezal é rico, lindo, porém com raízes dos mangues todas cheias de lixo. Conforme a maré sobe, é muito lixo, já fiz algumas gravações. Mas não vem ajuda do poder público. Ninguém quer entrar na área para poder fazer esse trabalho de limpeza, devido eles alegarem que é área de risco.” — Edilene Nascimento
Edilene relatou um histórico de cobranças ao poder público: apresentação de projetos e soluções propostas pela associação, tentativas de acesso a recursos, tentativas de parceria com a UFRJ. Mas o descaso com a localidade continua. Ela finalizou trazendo a importância dos mangues para a qualidade de vida de quem vive ao redor da Baía de Guanabara.
“Quando há esse tratamento, quando vem a revitalização nos manguezais, não vêm só benefício pro pescador, não vêm só benefício pros animais, mas também para os mangues. Eles trazem melhorias pro ambiente [de forma geral]… eles melhoram a qualidade do oxigênio. Então, nós temos algo rico ao nosso redor, que poderia estar sendo bem cuidado… [mas] o descaso de órgãos competentes… está negligenciando [esse ecossistema da favela].” — Edilene Nascimento
Como Se Deu a Ocupação e Qual é a Relação do Território com o Clima e Natureza?
Em seguida, foi iniciada a segunda roda de conversa, com o tema “Como se deu a ocupação e qual é a relação do território com o clima e natureza?”, refletindo principalmente como o histórico processo de formação da cidade do Rio de Janeiro foi fundamental para a construção do Complexo da Maré e do aterramento das ilhas e enseadas que constituíam a Maré.
Claudia Rose Ribeiro, coordenadora do Museu da Maré, lembrou que toda a história desse processo de formação das favelas do Complexo da Maré está registrada em imagens e representações no museu.
“[Nosso acervo] mostra todo esse processo e como o poder público intervém sem um planejamento… [sem] respeitar o ambiente… como se deu na construção da Cidade Universitária da UFRJ que fica na Ilha do Fundão. Na verdade, a Ilha do Fundão era uma ilha menor, um arquipélago, com várias ilhas. Tinha o projeto de ligar essas várias ilhas por pontes, mas o [presidente] Getúlio Vargas mandou aterrar tudo e fazer uma ilha só. Então, a gente vê o quanto os impactos do poder público são os que mais afetam a vida das pessoas… Não é o favelado que faz aterro, que joga esgoto na água no rio… que afeta diretamente esse ambiente e que vai gerar essas mudanças climáticas.” — Claudia Rose Ribeiro
Ainda sobre o papel do poder público nos impactos ambientais negativos que a Maré sofreu ao longo da história, Luiz Carlos Santiago lembrou da beleza natural que abraçava a Maré e as limpas águas do Canal do Cunha e da Baía de Guanabara.
“Esse local aqui era lindo, aqui tinha ilha… aí, jogaram uma refinaria ali e começou a se jogar o óleo dentro deste rio, onde a gente tomava banho, onde as pessoas pescavam… Se você é pobre, tem que morar perto do lixão… Se você é pobre, tem que morar perto da poluição… Por que o lixo tá sempre perto das pessoas pobres?… todas as praias aqui do Fundão eram próprias pra banho. E aí começa o quê? A poluição também nessas praias. Lá no meio, de lá começa a jogar óleo, vão acabando com aquilo ali… acabam com a Praia de Ramos, que era uma praia frequentada por toda a Zona Norte… Outra praia era na Ilha do Governador, Jardim Guanabara, [onde também] a água era limpinha. O que aconteceu? Já sabemos… Nada disso aconteceu por acaso… Isso é planejado… Então, a gente precisa entender que, quando o governo falar ‘olha, vou fazer uma intervenção na Maré’, tem que reunir todo mundo e dizer: ‘Mas que tipo de intervenção? Como é que você vai afetar nossas vidas?’… nós sabemos das mudanças que precisamos.” — Luiz Carlos Santiago
As memórias expostas no museu ganham vida nas falas de moradores cria da Maré. Valdirene Militão, artesã que aplica a reciclagem e reutilização de materiais na confecção de sua arte, moradora da Roquete Pinto, uma das favelas do Complexo da Maré, falou sobre as memórias da remoção das casas de palafitas da região, sobre o aterramento da área e da infância na Praia de Ramos. Ela também chamou atenção para a importância de agir localmente.
“Quando a gente pensa no macro, a gente quer sim fazer uma carta, a gente quer sim fazer mudanças. Mas também, precisa pensar no pequenininho. De verdade, a gente tá falando de responsabilidade [sobre o seu território].” — Valdirene Militão
Como as Questões Climáticas e Ambientais Dialogam com o Direito e Acesso à Moradia?
A terceira roda de conversa, focada na pergunta “como as questões climáticas e ambientais dialogam com o direito e acesso à moradia?”, se iniciou com o relato de Maria da Penha Macena, liderança da Vila Autódromo, que falou o quanto as histórias de formação das favelas cariocas guardam semelhanças entre si, destino fortemente moldado pelo preconceito de classe, racismo estrutural e negligência do Estado.
“Eles não querem que a gente more bem. Por que queriam me tirar da minha comunidade? Porque eu morava na margem da lagoa de Jacarepaguá. Futuramente, ali, vão ser construídos 60 prédios, dentro de onde é o Parque Olímpico… E não queriam pobre morando lá, porque nós pobres nós podemos servir, mas não podemos ser vizinhos.” — Maria da Penha Macena
Facilitadora da mesa, Victoria Alves, integrante do coletivo Raízes da Mata e coordenadora do Cocôzap Maré, denunciou o racismo ambiental nas favelas.
“Tudo isso… tange muito… a questão do racismo ambiental. A gente tá falando da questão do ambiente, mas também a gente tá falando de uma estrutura social. A gente tá falando da não efetivação de políticas públicas… que aqui na Maré, acontece de uma maneira e, no Centro do Rio, de outra.” — Victoria Alves
Nesse sentido, a importância da museologia social no papel de preservação das memórias e da história de luta das favelas, ganhou destaque. É na sua essência um fenômeno cultural que incita a autoestima e o orgulho comunitário, além da sistematização do conhecimento sobre si e sobre os territórios.
“Oportunidade da gente contar nossas próprias histórias, como pobre, como favelado, como negro. Então, a gente vai virando uma grande rede. Isso é fundamental pra que a gente continue nessa força, um respondendo pelo outro, um conhecendo o outro. Essa cultura vai nos modelando e modelando os jovens para que a gente possa ter um futuro melhor, uma sociedade mais justa e cobrar os nossos direitos, resistir e ficar nos nossos territórios, com muito orgulho de ser favelado, de ser negro e indígena.” — Maria da Penha Macena
Quais Saberes a Comunidade Já Desenvolveu para Responder aos Desafios Impostos pela Natureza e pelo Clima?
Facilitada por Valdirene Militão, nesta última gira do debate, os participantes compartilharam experiências e saberes sobre as soluções históricas e iniciativas atuais que já existiram para tratar das questões levantadas pelo clima, no Complexo da Maré. Lorena Froz dos Santos, cria da Maré, técnica em meio ambiente e fundadora do Projeto Faveleira, que atua com comunicação e educação ambiental nas redes sociais, destacou alguns projetos ambientais atuais das favelas da Maré, como o Raízes da Mata, coletivo que atua na revitalização do Parque Ecológico Cadu Barcellos, antigo Parque Ecológico da Maré, e o Muda Maré, que é um projeto de extensão da UFRJ que acontece na Maré, desenvolvendo pesquisas ligadas à questão ambiental.
Também foi lembrada a iniciativa realizada por alguns coletivos, lideranças e moradores da Maré, em 2022, o movimento “Está rolando um clima na Maré”. Reunidos na Lona Cultural do bairro, elaboraram a Carta de Direitos Climáticos da Maré, que discorre sobre racismo ambiental e a luta por direitos climáticos.
Jefferson Silva, professor de biologia, destacou o projeto Reciclagem Solidária, que atuou durante muito tempo abrangendo jovens desde o Conjunto Esperança até a favela da Kelson’s. Eles ganhavam bolsa, recebiam formação sobre educação ambiental e reciclagem, geravam renda e atuavam como multiplicadores nas suas favelas.
Esse e outros projetos de impacto ambiental, foram trazidos para a comunidade por Maria José da Silva, conhecida como Zezé, fundadora da Associação dos Moradores do Conjunto Bento Ribeiro, que falou em seguida sobre a importância de aliar os diagnósticos coletados pelos coletivos, à escrita de projetos e busca de recursos para tirar cada projeto do papel e atuar com ações concretas nas demandas existentes.
Encerrando o dia, o anfitrião Antonio Carlos Vieira, do Museu da Maré, estabeleceu uma importante reflexão sobre o processo de formação. Para ele, a palafita é o maior símbolo de solução para sobrevivência do povo da Maré, uma tecnologia ancestral local.
“Não por acaso o centro do museu é uma palafita. Porque a palafita é uma estratégia de sobrevivência, é um saber, é uma tecnologia pra você saber lidar com aquele fenômeno natural que é a maré, sob o qual você não tem controle… Hoje a gente anda e tudo isso aqui é um bairro, aterrado, mas as pessoas vieram morar aqui e pouca coisa era aterrada. A maior parte das casas foram construídas em cima da maré, em cima da água… As casas não eram leves, tinham que ter estrutura, porque o telhado era de barro. Em geral, se vocês olharem as fotos do museu, vocês vão ver que a maioria das casas era de barro… É um peso muito grande. Então, aquilo ali é uma verdadeira obra de engenharia. Eu acho que a gente não pode perder de vista que este saber é um símbolo, é uma referência que a gente tem aqui na Maré.” — Antonio Carlos Vieira
Leia toda a série “Memória Climática das Favelas” aqui.
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