Em Rio das Pedras, Exposição de Memória Climática das Favelas ‘Muda a Visão Que a Gente Tem Sobre Nosso Pertencimento’

'É Muito Importante Para As Pessoas Conhecerem Essa Garra dos Moradores'

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Após seu tour por Acari, Zona Norte do Rio de Janeiro, em agosto, a exposição ‘Memória Climática das Favelas‘ chega em Rio das Pedras, na Zona Oeste. Com um tour organizado pelos coletivos comunitários Conexões Periféricas RPSemeando Amor e Recanto da Areinha, a exposição fica disponível aos moradores entre 1 e 14 de setembro, circulando por importantes projetos, espaços culturais, escolas e sedes de coletivos do território.

Assista ao vídeo da exposição em Rio das Pedras acima, ou clicando aqui.

De forma interativa e afetiva, com relatos inéditos e dados históricos, a ‘Memória Climática das Favelas’ apresenta as relações entre clima, natureza e território de dez favelas fluminenses. Em Rio das Pedras, o tour seguirá o seguinte trajeto: Semeando Amor (dias 1-2 de setembro), Recanto da Areinha (dia 3), CAIC Euclides da Cunha (dias 4-5), Pré-Vestibular comunitário (dia 6), Cine e Rock (dia 7), Centro Cultural Celinho (dia 9), GET Mestre Diego Braga (GET de Rio das Pedras) (dia 10), EDI Professora Emília Maria Vieira de Oliveira (Rua Velha) (dias 12-13) e Feira Engenheiro (dia 14), passando por todas as regiões da quinta maior favela do Brasil. 

Espaço Semeando Amor foi o primeiro de Rio das Pedras a circular a exposição ‘Memória Climática das Favelas’ no território. Foto: Bárbara Dias
Espaço Semeando Amor foi o primeiro de Rio das Pedras a circular a exposição ‘Memória Climática das Favelas’ no território. Foto: Bárbara Dias

O espaço do Semeando Amor sediou a estreia da exposição em Rio das Pedras, no dia 1. O morador e articulador, Fernando Barros, que conduziu a roda de memória climática de Rio das Pedras, em setembro de 2024, que gerou os depoimentos de Rio das Pedras inclusos na exposição, contextualizou o processo de construção junto dos moradores.

“O dia da conversa da roda de memória, pra mim, muito interessante e muito importante pro coletivo. Foi essencial para nossa formação coletiva, nosso fortalecimento. Algumas carinhas conhecidas na roda de conversa, de algumas pessoas bem queridas, nesse dia eu tive a oportunidade de conhecer uma parte da minha terra, do Rio das Pedras, [através delas]. Compartilharam naquele momento [um] pedaço da nossa história de batalha. Eu já tinha um carinho por essas pessoas, só que saber que eles fizeram parte de uma luta, de uma resistência, de uma conquista… muda pra gente a visão que a gente tem sobre algumas pessoas e a visão que a gente tem sobre o nosso pertencimento aqui na favela.” — Fernando Barros

Maria Wellen, moradora do Rio das Pedras e voluntária do Semeando Amor e do coletivo Conexões Periféricas RP, compartilhou sua experiência como participante da roda de memória climática.

“Na roda, eu lembro da gente ter falado… [da] ansiedade climática. A gente citou tópicos importantíssimos e aqui, nessa exposição, eu estou até encarando ela ali: a Bacia das Memórias. [Ali na instalação] tem fotos reveladas de acontecimentos importantes para cada local (favela). E ali, tocando em umas fotos que tem do Rio das Pedras, que… falam bastante dessas ansiedades climáticas, desabamento, locais que queimaram… Acho que é bastante importante para colocar você na realidade, tirar um pouco daquele ‘ah, não, é passado’.  E ali, está bem ali do seu lado, você vendo o que aconteceu. A gente ouve, assim, como se fosse um mito. E aí, vendo [as fotos] a gente se toca [de que] realmente aconteceu, né?” — Maria Wellen

Moradoras interagem com a Bacia das Memórias e observam fotos históricas das favelas participantes da exposição. Foto: Bárbara Dias
Moradoras interagem com a Bacia das Memórias e observam fotos históricas das favelas participantes da exposição. Foto: Bárbara Dias

A abertura da exposição em Rio das Pedras contou com a visita de moradoras antigas, como Dona Marilene Veras, que vive há mais de 30 anos na comunidade. Ela se recorda de Rio das Pedras no início de sua ocupação.

“Aqui era lagoa, não tinha [moradia] aqui. Nós começamos com nosso barraquinho lá no final. De lá pra cá… só era água pura. O Rio das Pedras era água, aqui mesmo, só lagoa… Aí foi fazendo luz—era um bico de luz ali—tinha jacaré, né? [Era] barraco de madeira, só madeira. Não tinha piso, nem pensar naquela época, né? Não tinha um negócio de cimento, não tinha. Então, naquela época, era muito bom.” — Marilene Veras

Moradores interagem com o mapa confeccionado pela artesã Marli Damascena, cofundadora do Museu da Maré, na estreia da exposição em Rio das Pedras. Foto: Bárbara Dias
Moradores interagem com o mapa confeccionado pela artesã Marli Damascena, cofundadora do Museu da Maré, na estreia da exposição em Rio das Pedras. Foto: Bárbara Dias

Carlos Silva, morador há 44 anos, lutou por melhorias durante anos e trabalhou por 18 na Associação de Moradores de Rio das Pedras. Durante a roda de conversa que resultou na exposição, prestou diversos depoimentos que compõe a exposição final. Ao ver o resultado na exposição, enfatizou a importância do engajamento dos moradores de favelas na construção de uma mobilização popular por melhorias na qualidade de vida das pessoas.

“[Essa exposição] é muito importante para as pessoas conhecerem essa luta, essa garra [dos moradores], cada um nas suas periferias, nas nossas conexões periféricas, Cidade de Deus, Acari, Penha. Inclusive eu conheço todas elas… É importante essa visita aqui de conhecimento de luta das pessoas, né? De moradores com as suas lutas pelo direito à moradia, que todos nós temos que ter o direito à moradia digna, saneamento básico, urbanização, pavimentação, com área de esporte, lazer, cultura e saúde… Eu falo que eu sou um dos crias daqui, eu entrei nessa comunidade em 1979, participei dessas lutas de moradia, de sustentabilidade, voltadas para que as pessoas tivessem suas casas dignas.” — Carlos Silva

Carlos Silva e Marilene Veras, moradores de longa data de Rio das Pedras, compareceram à abertura da exposição no Espaço Semeando Amor. Foto: Bárbara Dias
Carlos Silva e Marilene Veras, moradores de longa data de Rio das Pedras, compareceram à abertura da exposição no espaço do Semeando Amor. Foto: Bárbara Dias

Também moradora de Rio das Pedras e participante do projeto Semeando Amor, Claudia Santos contou como sua trajetória de vida se mistura com a história do território.

“Eu cheguei aqui em Rio das Pedras no dia 19 de julho de 1991, então estou há bastante tempo aqui. Já vi o Rio das Pedras crescer em proporção gigantesca, e ter um evento desse na comunidade, para mim, que estou participando pela primeira vez, é o máximo. Está sendo muito gostoso contribuir com a história, com a poesia que a gente fez no ano passado. É uma pena que as pessoas ainda não entenderam o propósito disso, porque o lugar tem história, nós temos histórias… É muita emoção [participar da exposição]. Sabe o que eu queria? Que cada um dos moradores estivesse aqui para contribuir… Eu estou aqui participando, contribuindo, com vontade de trazer meus netos, meus parentes… O Rio das Pedras é um lugar que tem muita história, não é só a tragédia, nós temos pessoas trabalhadoras que criaram seus filhos, seus netos, chegaram aqui e fincaram o pé na lama, sabe, para construir, para levantar o seu lar.” — Claudia Santos

Confira aqui e não perca o itinerário da exposição ‘Memória Climática das Favelas’ em Rio das Pedras, que circula pelo território até 14 de setembro: Semeando Amor (dias 1-2 de setembro), Recanto da Areinha (dia 3), CAIC Euclides da Cunha (dias 4-5), Pré-Vestibular comunitário (dia 6), Cine e Rock (dia 7), Centro Cultural Celinho (dia 9), GET Mestre Diego Braga (GET de Rio das Pedras) (dia 10), EDI Professora Emília Maria Vieira de Oliveira (Rua Velha) (dias 12-13) e Feira Engenheiro (dia 14). 

Veja o álbum da exposição em todos seus pontos durante seu tour por Rio das Pedras:

Exposição 'Memória Climática das Favelas' no Projeto Social Semeando Amor, Rio das Pedras, 01 de setembro de 2025

*A Rede Favela Sustentável e o RioOnWatch são ambas iniciativas gerenciadas pela organização sem fins lucrativos, Comunidades Catalisadoras. A exposição de Memória Climática das Favelas reúne 1.145 depoimentos de 382 moradores de dez favelas da capital fluminense, coletados e sistematizados ao longo de três anos de construção coletiva. A exposição foi desenvolvida por onze museus e coletivos de memória de favelas integrantes da RFS: Museu da MaréMuseu SankofaNúcleo de Orientação e Pesquisa Histórica de Santa CruzMuseu de FavelaNúcleo de Memórias do VidigalAlfazendo (Cidade de Deus), Centro de Integração da Serra da MisericórdiaMuseu do HortoFala AkariConexões Periféricas (Rio das Pedras) e Museu das Remoções.

Sobre a autora: Bárbara Dias, cria de Bangu, possui licenciatura em Ciências Biológicas, mestrado em Educação Ambiental e atua como professora da rede pública desde 2006. É fotojornalista e trabalha também com fotografia documental. É comunicadora popular formada pelo Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC) e co-fundadora do Coletivo Fotoguerrilha.


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