Da praia de Ipanema, eu via o morro onde nem eu e nem muitos cariocas havíamos subido. Era o ano de 2006 e eu precisava morar perto do meu local de trabalho, a referida praia.
Subindo aquela ladeira, indagava por casa pra alugar. Havia aos montes. Um lugar violento, desassistido pelo poder público, em estado de guerra por disputa de território. Preço barato, podia escolher à vontade.
Me mudei para um apartamento que estava vazio há três anos, devido ao medo da guerra. Eu nem tinha ideia do que era aquela guerra. Não demorei duas semanas pra saber. Era sinistro, tiroteio quase toda noite. Por duas vezes vivi a experiência de subir morrendo de medo de levar uma bala perdida, e ver os moradores da parte mais alta terem que passar a noite no pé do morro. Quando a facção da Rocinha finalmente ocupou o território, os tiroteios diminuíram e o morro foi ficando numa aparente paz.
Aos poucos começamos a ver pessoas voltando a se mudar. Uma classe meio média, uns gringos meio pobres. O mercadinho ocupando um espaço bem maior, aumentando a oferta de consumo. Os alugueis, aos poucos, sendo valorizados.
Aí veio a UPP com a promessa de segurança, o poder público entrando na favela, iluminação, a TV a cabo, internet, a legalização do gás, a ordenação do moto táxi, o fim dos “gatos de luz e net”. A TV local (VdgTV) saiu do ar, sem concessão e começou o processo de cadastramento das casas pelo Iterj dando promessa de concessão de uso por 99 anos e mais a promessa de vários projetos sociais que seriam implementados etc., etc., etc.
Realmente, as ruas ficaram bem iluminadas. As casas começaram a pagar pelo consumo de luz, as contas começaram a chegar. Um susto, R$100,00, R$200,00, R$1.000,00, que loucura! Não se pode mais usar ar refrigerado. Pobre tem que morrer de calor.
E as casas? Com a enorme procura por moradia, os preços dos imóveis aumentaram astronomicamente. Os inquilinos tendo que sair das casas que antes custavam R$200,00 ou R$300,00 e agora custam R$800,00 ou R$1.500,00 e que continuam subindo a cada mês.
Os imigrantes nordestinos viram aí uma excelente oportunidade de voltar pra sua terra e estão vendendo suas casas por R$100.000,00 em diante. Esse dinheiro no nordeste faz um cara rico. Resultado: os gringos estão fazendo a festa. Atualmente fala-se duas línguas na favela.
Outras pessoas, que não querem voltar pro Nordeste, vendem suas casas achando que vão fazer um bom negócio e compram na Baixada, longe do trabalho, longe do seu local de identidade, longe das suas amizades, longe de tudo…
Os proprietários estão construindo, aumentando seus imóveis para viverem de aluguel. Há muita gente subindo o morro, passeios ecológicos e muito mais lixo. Tanta cultura diferente, tanta gente querendo “ajudar”. A cada dia vemos o lugar perder sua identidade original. Vidigal virou moda internacional.
É como uma represa que foi aberta. Uma inundação de oportunidades e oportunistas.