Na manhã de terça-feira, 8 de janeiro, representantes da prefeitura chegaram sem anúncio prévio à Favela do Metrô-Mangueira para demolir casas, causando pânico e desespero entre centenas de pessoas que atualmente residem no local. Cerca de doze casas foram demolidas, algumas ainda com os pertences dos moradores dentro.
Indignados, moradores do local realizaram uma manifestação durante a tarde e a noite, obstruindo durante várias horas a Rua Radial Oeste, a rua principal que passa pela Metrô-Mangueira e o estádio Maracanã. Violência eclodiu entre policiais e manifestantes, com policiais atirando balas de borracha, spray de pimenta, gás lacrimogéneo e bombas de flash, enquanto alguns manifestantes atiraram pedras e garrafas. No meio do tumulto, um policial chegou a apontar a arma para um rapaz.
“Era uma cena de guerra”, explicou Marilene, uma jovem mãe que mora numa casa abandonada na favela há um ano e meio. “A polícia atirou gás lacrimogêneo para todo lado. Crianças ficaram doentes. Foi terrível”. Como a maioria dos que moram na favela do Metrô, Marilene ocupa uma casa que foi desocupada durante um longo e demorado processo de remoção que começou em novembro de 2010.
A Favela do Metrô-Mangueira foi fundada há 35 anos por trabalhadores do nordeste do Brasil que estavam empregados nas obras de construção da estação de metrô do Maracanã. Em 2010, as 700 famílias que construíram e desenvolveram a favela ficaram sabendo que a comunidade estava sob ameaça de ser removida. No dia 4 de novembro de 2010, uma equipe de demolição chegou ao local e 107 das famílias mais vulneráveis foram realocadas para um condomínio do programa Minha Casa Minha Vida a 70km em Cosmos, na Zona Oeste. As famílias que ficaram resistiram, mas depois de dois anos vivendo entre entulhos e vivenciando altos níveis de roubo e insalubridade, que foram os resultados das primeiras remoções, foram realocadas para apartamentos de melhor qualidade do lado nos complexos Mangueira I e II e próximo, em Triagem. Contudo, depois que todas essas famílias partiram no começo do ano passado, a terra e muitas das estruturas ficaram abandonadas e os planos da prefeitura para a região ainda eram incertos e não foram divulgados. O resultado disso é que nos últimos anos, centenas de famílias mais pobres e vulneráveis ainda ocuparam as habitações que foram desocupadas.
A situação atual é resultado direto da negligência e má administração da prefeitura. Depois de remover moradores de longa data para unidades de habitação popular sem nenhuma consulta pública sobre o uso da terra, o que é exigido pela lei, a prefeitura deixou a terra e as habitações existentes para serem ocupadas por aqueles que sim, realmente estavam na necessidade desesperada de habitação pública. Habitação pública é, em teoria, especificamente destinada aos mais pobres e necessitados, e não os trabalhadores com casas consolidadas como foi o caso da maioria de ex-moradores da Metrô-Mangueira. E agora, as famílias extremamente vulneráveis que vivem atualmente no local parecem estar destinados a receber nada.
Na terça-feira, enquanto casas de alguns moradores foram demolidas, todos foram avisados que precisavam sair de suas casas até sexta, porém nenhuma acomodação alternativa ou solução foi oferecida. No entanto, todos aqueles com quem o RioOnWatch falou afirmaram que o Prefeito Eduardo Paes, pessoalmente, prometeu que ninguém seria deixado sem-teto em uma reunião realizada na igreja da comunidade há alguns meses.
Mas a confusão e desespero continuaram ontem para os moradores que têm pouco e nenhum lugar para ir. Dona Valéria, uma catadora de lixo reciclável e mãe de oito filhos, entre 4 e 20 anos, que vive com sua família na Favela do Metrô por quase três anos, diz: “Para procurar um lugar para morar é preciso ter alguma coisa, e o que eu tenho? Nada”. Ela continua: “Todo mundo precisa ter seu próprio canto. Eu não sei para onde eu vou, se eu sair daqui. Se eu tivesse outro lugar para ir, eu já teria saido daqui”.
Alguns moradores relatam que assistentes sociais ontem encorajaram aqueles que recebem o Bolsa Família para ir e registrar-se para um apartamento do Minha Casa Minha Vida, mas como os moradores em seguida apontaram, tal pedido pode levar anos para ser processado.
Localizado ao lado do estádio do Maracanã, sede futura da final da Copa do Mundo, a razão original para a remoção da Metrô-Mangueira se acreditava ser para um estacionamento para o torneio. Somente em setembro do ano passado foi a confirmação por decreto municipal que a terra será destinada a um polo automotivo com 96 unidades comerciais e um parque com ciclovia, rampa de skate, academia para idosos, parque infantil e 400 árvores. O projeto vai custar R$30,5 milhões. Mesmo assim, há rumores de que está sendo usado para um centro comercial ou outros equipamentos desse tipo, mostrando como as comunicações municipais são problemáticas e pouco claras com o público.
Mas agora, centenas de moradores vulneráveis, muitos dos quais vieram das ruas ou abrigos para ocupar casas na Metrô-Mangueira, estão potencialmente enfrentando outro episódio de violência brutal como tropas de choque da polícia militar que estão atualmente no local. Uma advogada voluntária do Instituto de Defensores dos Direitos Humanos esteve presente na quarta-feira para registrar moradores a fim de preparar um mandado de segurança coletivo para questionar a legalidade deste despejo. Ela explica: “A justiça tem que tomar conhecimento deste ato, porque são vidas humanas que estão sendo colocadas em jogo. Há crianças, mulheres idosas, mulheres grávidas que não têm para onde ir… Houve negociações em que o prefeito se comprometeu a conceder assistência a essas pessoas e este acordo não está sendo honrado. É importante não deixar essas pessoas de lado, sem ajuda”.