Um novo Cesarão

Com suas sete mil casas, o Cesarão, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, já era o maior conjunto habitacional da América Latina em 2001. Ficou ainda maior quando integrantes do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) fincaram sua bandeira vermelha na área hoje denominada Nova Palestina, derrubando a mata na qual as crianças se reuniam para soltar pipa e os bandidos executavam suas vítimas.  Naquele momento, os moradores do Cesarão a chamavam de Invasão.

Os vizinhos das Rua 64 estranharam quando inúmeros maltrapilhos desceram dos ônibus e caminhões e começaram a levantar acampamento. “Eles chegaram tranquilos, sem incomodar os moradores, tranquilos até demais para as as invasões que a gente vê dos Sem Teto”, conta Marcos Vinícius Lima, 30 anos, que mora do outro lado da rua do terreno que foi invadido. O estranhamento deu lugar à preocupação quando os invasores começaram a trocar as lonas pelos primeiros barracos de madeira.  “O pessoal estava falando mal, temendo uma nova favela”, diz Luan Pereira Ramos,21 anos, morador da rua 63. Não conhecer os “invasores” incomodava os moradores do Cesarão, que não faziam ideia se poderiam herdar problemas junto com os novos vizinhos. “Ainda não sei de onde vieram”, ressalta Luan.

Uma das primeiras moradoras da Nova Palestina, Ana Cristina Andréia de Campos, de 48 anos, lembra do papel de seu Manel para a consolidaçãoda nova comunidade. “Ele convidou as pessoas do Santa Margarida (conjunto habitacional de Cosmos) e de Sepetiba”, lembra ela, que naocasião morava em uma invasão do outro lado do Cesarão, da qual participaram cerca de 10 famílias da própria localidade. Os novos moradores não foram rechaçados de maneira ostensiva, mas sofreram com o preconceito.  “Quando eu disse que viria morar aqui, as pessoas me chamaram de maluca, achavam ruim, pensavam que era um monte de favelados”, diz a mesma Ana Cristina, que ainda não viu motivos para o comportamento dos antigos moradores do Cesarão. “Até agora não teve nenhum problema, adoro isso aqui, conheço todo mundo. ”

Nenhuma autoridade se interessou pela nova comunidade, nem as oficiais nem as do chamado poder paralelo. Mas para Ana Cristina essa passividade se deve muito mais às virtudes do movimento que liderou a invasão do que ao desleixo das autoridades. “Nunca tentaram tirar porque foi muito organizado”, conta a moradora. Os técnicos da Prefeitura só deram as caras quando os líderes da Nova Palestina solicitaram a sua visita, para darem entrada no processo de legalização das casas. “A maioria dos moradores tem o documento da CEHAB-RJ (Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro)”, conta Ana Cristina. A união do grupo também foi fundamental nos seguidos mutirões organizados pelo movimento. “Eram todos juntos pra fazer as casas e organizar tudo, agora só falta regularizar a água e a luz“, completa Ana Cristina.

Com o tempo, a nova comunidade foi assimilada pelos moradores do Cesarão. “Não me incomodam”, diz Marcus Vinícius.  Luan foi um pouco mais além, fazendo inclusive amigos na nova área do conjunto habitacional. “Não tenho nada contra eles, até tenho amigos lá hoje em dia, já são parte do Cesarão “, conclui Luan. A boa convivência permite que Ana Cristina sonhe com dias ainda melhores para a Nova Palestina. “Estamos tentando fazer uma praça para as crianças”, conta ela, que acredita que a comunidade vai estar plenamente assimilada pelos vizinhos em no máximo cinco anos.

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