Esta matéria de Thaís Cavalcante faz parte de uma série de cinco matérias de opinião sobre o impeachment por comunicadores populares publicadas no RioOnWatch.
Thaís Cavalcante tem 21 anos, é comunicadora comunitária desde 2012 no Complexo da Maré, lugar onde foi nascida e criada. Cursa faculdade de Jornalismo e colabora no Jornal O Cidadão e The Guardian.
Descobri que mais de 300 políticos que vi discursar na televisão na votação do impeachment não foram eleitos por maioria de votos e, sim com “sobra” de votos do próprio partido. A sensação de conhecer cada um pela primeira vez através do discurso foi assustadora. Só percebia mentiras, calúnias e promessas. A noite daquele domingo de abril não era uma noite qualquer. Apesar da culpa cair totalmente em cima do Partido dos Trabalhadores, no Congresso Nacional temos como maioria de parlamentares, pessoas filiadas ao PMDB. Isso mesmo! Essa sigla significa Partido do Movimento Democrático Brasileiro. O que me parece mais piada do que realidade. Afinal, em que democracia, meia dúzia de parlamentares tem mais poder que 54 bilhões de votos?
O problema deixou de ser a escolha de lado político. Agora temos que lutar por direitos. O direito do voto e ao respeito à constituição (ultrapassada inclusive). Não há justiça no processo em que um acusado acusa o outro. Não precisamos de promessas. Precisamos de atuação. Digo isso porque já fui beneficiada pelo até então, atual partido.
Além de tirar milhares de pessoas da pobreza, a aplicação de programas sociais envolvendo a educação, saúde e esporte impactou jovens e famílias. Eu vi isso. É obrigação constitucional o cumprimento de leis que estimulem o crescimento e desenvolvimento do país. Por isso é importante reconhecer os impactos, mas lembrar que isso não é um apoio ao partido e sim mísera coerência. Em algum momento nós iríamos receber isso. Demorou mas chegou. Fui beneficiada diversas vezes por programas sociais ao decorrer da gestão do atual governo. Não tenho vergonha de admitir isso. Recebi Bolsa Família quando estudava em escola municipal, bolsa de estudos para aprender fotografia através do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC), bolsa para estudar inglês básico através do Programa Senac Gratuidade (PSG), bolsa para cursar graduação em Jornalismo através do Programa Universidade para Todos (PROUNI) e também tenho direito ao Rio Card Universitário, cartão com passagens gratuitas para ir e voltar da faculdade.
Isso tudo representa algumas das oportunidades que recebi por não ter condições financeiras para estudar. A educação pública foi o que transformou meu pensamento crítico e aumentou meu desejo por mudança. Por isso, seria hipocrisia simplesmente criticar o governo atual por seus feitos ou mal efeitos, como a maioria dos deputados fizeram no domingo dia 17.
Meus pais têm o ensino fundamental incompleto. Trabalhar na roça exigiu muito tempo e esforço, o que fez com que saíssem da escola e se dedicassem totalmente ao sustento da casa. A decisão de mudar para o Rio de Janeiro também envolveu o meu futuro, apesar do meu nascimento não ter sido planejado. Eu tenho benefícios que, se vivesse a realidade distante do nordeste, provavelmente não teria. Mas a luta de melhorar o ensino público é imensa. Quanto mais ganhava oportunidade para receber conhecimento, mais eu entrava nesse universo de aprender e querer compartilhar o que aprendi. Hoje comunico para informar e também para formar, dou palestras e até ensino. O sentimento que tenho é só gratidão.
Não é justo se apropriar de feitos políticos que dizem respeito ao pobre e não à classe média/alta. Só sei que entre a democracia e a ditadura, os brasileiros já decidiram há tempos.
A jornalista comunitária Thaís Cavalcante foi nascida e criada na Nova Holanda, uma das favelas da Maré. Ao atuar como comunicadora comunitária em sua comunidade, decidiu cursar jornalismo na universidade e acredita no poder da informação para mudar para melhor sua realidade.