No sábado, 28 de maio, moradores do Vidigal, na Zona Sul do Rio, se reuniram para se despedir do artista local Wilson Alexandre. Depois de dez anos transformando um terreno baldio de 600 metros quadrados em um espaço vibrante e cheio de arte reciclada, Wilson e sua parceira Sarah Milsom estão agendados para se mudarem no final de junho, uma vez que o proprietário de sua casa e studio-galeria vendeu a terra e está despejando-os. Apesar da difícil batalha, o Vidigal tem trabalhado para resistir às pressões da especulação imobiliária e da gentrificação.
A despedida de Wilson refletiu sua arte de várias maneiras: foi interativa, comunitária e colorida. O dia começou às 10h com uma oficina sobre arte com material reciclado para crianças, explicando sobre os materiais e as técnicas que transformaram sua casa de cima a baixo usando madeira, embalagens plásticas, latas de alumínio e objetos de cozinha antigos.
Após a oficina, membros do grupo local de teatro Nós do Morro realizaram uma esquete homenageando Wilson e seu trabalho, contando a história de Wilson como um rei que coletava lixo para seu castelo e que o transformou em um “reino muito poderoso”. Membros do grupo de teatro afirmaram que a arte de Wilson é “inestimável”, “absurdamente criativa” e “seriamente incrível” e que a comunidade sentirá sua falta. “Será um verdadeiro vazio para o local”, um membro do grupo confirmou.
O trabalho de Wilson é único e ele adora o modo que as crianças participam e reagem. Moradores contaram como eles mudam seus trajetos só para passar em frente da casa de Wilson e ver sua arte. Wilson afirma: “A arte faz coisas incríveis para as pessoas”.
No sábado, ao serem perguntadas sobre o trabalho de Wilson as crianças sorriram e compartilharam seus sentimentos de felicidade e criatividade. Uma menina de 12 anos disse que ela ficava tão inspirada que corria para casa para desenhar e pintar. Outra moradora, uma mãe e funcionária da creche comunitária, disse: “As crianças da creche que passam na frente [da casa de Wilson] com suas mães serão bastante afetadas pela perda”. A creche local espera receber de Wilson algumas de suas esculturas de robôs para continuar alimentando a imaginação das crianças.
Wilson quer garantir que seu trabalho continuará a beneficiar as crianças da comunidade. Assim como doações para a creche, ele planeja deixar suas esculturas de robôs de lata e suas aranhas de garrafa plástica em áreas visíveis pelo Vidigal para divertir as crianças. Ele espera que algumas ruas possam conservar suas obras e guardar memórias.
Ao longo dos últimos 20 anos, Wilson viveu em vários lugares do Vidigal e conhece bem os moradores. Antes de se mudar para seu mais recente espaço dez anos atrás, o qual foi construído sobre 300 pneus por ser mais econômico do que fundações em concreto, ele trabalhou com skimboard e dava aula para as crianças na praia. Ele fixou suas obras nas pranchas e começou a ficar conhecido na área. Este ano a escola de samba local Acadêmicos do Vidigal usou as aranhas de Wilson no seu carro alegórico para o desfile de carnaval. Dois meses atrás Wilson realizou um projeto com a Caminhos Language Centre onde ensinou 15 crianças a usarem materiais recicláveis.
Gentrificação no Vidigal
A saída de Wilson da comunidade deve-se a uma tendência preocupante, dado que moradores estão se mudando devido aos altos custos no Vidigal, famoso por sua vista para o mar e vizinho do Leblon e São Conrado. Em janeiro de 2012, a UPP foi instalada no Vidigal. Antes da UPP, Wilson pagava um aluguel mensal de R$100. Após a instalação da UPP, ele passou a pagar R$1.000 de aluguel. Com a presença da UPP, pessoas de fora se sentiram mais confortáveis para entrar na comunidade e o valor dos bens imobiliários cresceu. Empreendimentos hoteleiros abriram no topo do morro. Muitos moradores estão vendendo seus imóveis por causa do aumento da procura por casas e os locatários estão sofrendo com os aumentos dos preços dos alugueis em consequência dos valores cobrados aos estrangeiros e as pessoas de classe média que estão chegando à comunidade.
Além disso, enquanto artistas locais estão sendo forçados a sair da comunidade, a mídia internacional está chamando a atenção para um famoso artista brasileiro, Vik Muniz, e seu projeto de abrir uma escola de artes no Vidigal no final do ano. De acordo com o Wall Street Journal, esta é uma maneira de Vik Muniz “se reconectar com o menino pobre que [ele] deixou aqui”.
Contudo, moradores do Vidigal relatam que Muniz possui há mais de um ano um estúdio de dois edifícios no topo do morro que está vazio e fechado e sem “personalidade”. Wilson protesta frente a situação, dizendo: “[Artistas locais] não podem simplesmente sair e aí chegar um artista famoso que entra na comunidade sendo o único a ter um espaço. O Vidigal tem uma forte história artística. Alguns artistas estão trabalhando na comunidade há 40 anos, mas não têm espaço para expor seus trabalhos por causa do aumento nos custos dos imóveis”.
Wilson critica a maneira como alguns projetos de artes são conduzidos por pessoas de fora da comunidade sem o reconhecimento de artistas locais. Ele diz: “Pessoas chegam no Vidigal para criar um projeto e [parece] que eles não querem saber que artistas locais existem. Eles apenas entram e fazem suas coisas, sem consultar moradores e outros artistas”.
Sobre as recentes transformações no Vidigal devido à gentrificação, o turismo crescente e novos negócios, ele diz: “Essa mudança foi muito rápida. E agora com as Olimpíadas, muito [mais] estrangeiros irão chegar. Eles irão conhecer o Vidigal e irão querer voltar e morar aqui”.
Por enquanto, o artista está ocupado usando os materiais restantes para terminar alguns projetos finais. Ele diz com alguma tristeza que teria muito mais a oferecer para o espaço e a comunidade como um todo. Em sua maior parte, Wilson está otimista. Depois de dez anos vivendo de aluguel, ele espera poder comprar seu próprio terreno ou casa em um futuro próximo e está à procura de um lugar dentro da comunidade, mas teme não ter condições de permanecer no Vidigal.
O evento de despedida de Wilson no sábado terminou com performances de diversos rappers organizadas por Thiago Oliveira do grupo de rap Poesia da Pista e um conjunto de DJ, todos moradores do Vidigal.