“É como se houvesse uma festa na nossa casa e o mundo inteiro fosse convidado, mas nós não pudéssemos participar”. É assim que o líder comunitário Carlos Alberta Costa, conhecido como Bezerra, descreve seus sentimentos em relação aos Jogos Olímpicos. Com o parque olímpico a menos de um quilômetro de distância, a comunidade Asa Branca tem sofrido os impactos da preparação da infraestrutura para os jogos e o resultado é o crescimento da insegurança na região. Assim sendo, por conta própria, a comunidade está instalando 23 câmeras de segurança ao redor da comunidade.
O projeto de segurança está em consonância com a história da Asa Branca, uma favela em que os moradores sempre trabalharam, eles mesmos, para fornecerem serviços básicos. É uma comunidade pequena, com aproximadamente oito mil pessoas, que foi construída ao longo de um pequeno número de ruas paralelas sem saídas, que se interceptam apenas com a estrada principal (Salvador Allende) que passa de um lado da comunidade. Portanto, a vigilância é um trabalho viável.
“Todos conhecem uns aos outros, olhamos pelos outros e pelas crianças. É como uma grande família”, disse Paulo, de 18 anos. Ele ajuda a manter os vizinhos seguros através do seu trabalho voluntário no portão da entrada da favela. “Quatro pessoas fazem o trabalho de ‘porteiro’, em turnos de 12 horas”.
Stephan, 16 anos, amigo de Paulo, compara o sistema com o dos condomínios fechados que estão ao redor da Asa Branca. “Os portões são como nos condomínios em volta da gente. Todo mundo é vistoriado antes de entrar e nós sempre sabemos quem sai”. Desta forma, os portões contribuem para a sensação de segurança: “É uma espécie de falsa sensação de segurança para os moradores. Todo mundo ainda pode entrar, mas agora eles têm que passar por aqui primeiro. Isso pode assustar alguns estranhos de passagem”, Bezerra explica.
Pessoas desconhecidas chegam com mais frequência ultimamente. Bezerra acredita que seja por causa da nova linha BRT Transcarioca. “O BRT faz conexão com toda a cidade a partir deste ponto. Nós vivemos em uma comunidade pacífica, mas temos medo da violência que pode surgir com essa movimentação de pessoas desconhecidas. Também temos notícias de que pessoas viciadas vivem próximo daqui causando confusões e problemas. Elas não são capazes de trabalhar e acabam roubando e usando drogas. O governo não está tratando o vício como uma doença, logo eles não são ajudados”.
Por outro lado, os portões mantêm as crianças dentro da comunidade, elas não podem brincar perto das perigosas vias do BRT sem supervisão.
Durante as Olimpíadas, a comunidade historicamente segura, de quase 30 anos, pode vir a ser, injustamente, alvo da polícia. “Essa é uma comunidade sem traficantes, sem nada. Porém, a polícia continua entrando aqui com a ideia de que a favela é extremamente perigosa. Eles usam a violência contra os moradores que não são bandidos. Eles não sabem nada sobre a comunidade, não respeitam as famílias e não sabem em quem se pode confiar ou não. O nosso pessoal não aceita ser tratado com ignorância. E também, qualquer coisa que acontecer próximo daqui irá afetar a nossa reputação”.
A comunidade Asa Branca se reuniu para buscar uma maneira para lidar com esse problema. Bezerra ilustra o processo mostrando as notas e as assinaturas da reunião, a conclusão foi instalar câmeras de segurança como um dissuasor de crimes e para caso algo aconteça se tenha provas.
Bezerra não se preocupa tanto com o que acontecerá durante os Jogos Olímpicos, mas com os meses seguintes ao grande evento. Ele afirma: “Esse será o lugar mais seguro do mundo. Nós teremos uma segurança rigorosa. Eu me preocupo com o que acontecerá depois dos Jogos”.
Bezerra também critica o modo como as Olimpíadas têm causado impactos na comunidade e na área em volta. “Sim, temos uma melhor infraestrutura agora e isso é só por causa das Olimpíadas, mas isso deveria ter acontecido há 20 anos. Está acontecendo agora porque (as autoridades) precisam disso. Como podemos agradecer por isso? Várias famílias foram removidas por causa do BRT, temos que ficar de olho nas crianças o tempo todo. Nós mudamos a nossa rotina, tivemos que viver com a poeira em nossos olhos por quase dois anos e não tivemos nenhuma recompensa por isso. Nenhum ingresso para os jogos!”.
Paulo acrescenta: “Os jogos são realmente ótimos! Eu amo esportes! Mas infelizmente, esses eventos não são feitos para nós. Temos um Parque Olímpico próximo, mas não podemos usar nenhum espaço para esporte ou lazer”.
Há o sentimento de que os Jogos Olímpicos estão trazendo insegurança e perturbação a essa comunidade coesa e tranquila, sem nenhuma compensação ou convite para os jogos. “É igual a todos os eventos no Brasil, eles são para os ricos e poderosos, mas nós pagamos o preço. Nenhuma comunidade em torno daqui está satisfeita com o modo que está sendo realizado os preparativos para os Jogos, especialmente a Vila Autódromo (que fica nas imediações)”.
Com a proximidade dos Jogos Olímpicos a comunidade está começando a instalar câmeras para garantir a sensação de segurança. O projeto serve como exemplo de mais uma solução criativa que os moradores da comunidade Asa Branca desenvolveram para atender as suas necessidades básicas.