Membros da comunidade de pescadores do Rio Sarapuí, localizado na Baixada Fluminense da Grande Rio, encontram-se em situação econômica precária em razão de uma barreira ecológica instalada no Rio Sarapuí que vem os impedindo de atingir áreas de pesca desde julho. O governo do estado do Rio instalou 17 ecobarreiras em rios ao longo da Baixada Fluminense como parte da promessa de despoluir em 80% a Baía de Guanabara para os Jogos Olímpicos de 2016.
As barreiras consistem em recipientes de plástico presos em grades ligadas por um cabo de aço e têm o intuito de impedir que o lixo flutuante atinja a baía. Ocorre que os barcos dos pescadores não conseguem transpor as ecobarreiras, as grades com os plásticos flutuantes e a massiva quantidade de gigoias que flutuam contra eles. Pescadores que ancoram seus barcos atrás dessas barreiras não sabem mais se serão capazes de chegar aos seus pontos de pesca ou mesmo voltar para casa.
José Vitor do Nascimento Raimundo e Gilciney Lopes, que vem tirando seu sustento da pesca no Rio Sarapuí por toda vida, agora encontram-se forçados a esperar horas e horas todas as manhãs, até que a maré suba e as plantas flutuem para longe, e eles finalmente consigam cruzar a barreira. “Como podemos nos sustentar se não podemos ir e vir? Eu sustento quatro filhos. Como eu vou pagar o gás?” pergunta Raimundo.
Tudo isso por ecobarreiras que somente são capazes de impedir a passagem de 8.8% do lixo que flutua para a baía. Um esforço que o jornalista Emanuel Alencar compara a “enxugar gelo” no seu recente livro Baia de Guanabara: Descaso e Resistência.
A comunidade de pescadores do Rio Sarapuí, anteriormente, não era obrigada a navegar até a Baía de Guanabara para pescar. Porém, devido aos altos níveis de poluição, populações de pescadores estão sendo devastadas. Agora os pescadores precisam ir para mais longe para encontrar águas limpas e saudáveis perto dos manguezais ou da Ilha do Governador. “É lamentável”, diz Raimundo, “caranguejos não sobrevivem mais aqui no rio”.
Lopes diz que a concessionária Gas Verde S/A continua a jogar, de forma clandestina, gás líquido e chorume diretamente no Rio Sarapuí, ignorando a proibição emitida pelas autoridades. Outros culpados pela poluição do rio incluem a fábrica da Bayer, que deposita dejetos no Rio Sarapuí, a Petroflex, fábrica de borracha em Duque de Caxias, o aterro sanitário de Gericinó e o contínuo lançamento de chorume sem tratamento advindo do Jardim Gramacho, o aterro sanitário desativado que já foi o maior da América Latina. Um rio que é formador do Rio Sarapuí ganhou o nome de “Rio das Tintas” em razão das tintas que eram lançadas em suas águas, no passado, pela empresa de tecidos Bangu. Além disso, somam-se ao lixo industrial o fluxo de 18.000 litros por segundo de esgoto não tratado que flui para a bacia hidrográfica do Rio.
Raimundo e Lopes estão cansados de testemunhar os abusos contra o meio ambiente que continuam a devastar o meio sustento deles, pela pesca artesanal. Eles ainda estão lutando para receber indenizações em razão do derramamento de óleo provocado pela refinaria da Petrobras em Duque de Caxias em 2000, o que provocou o derramamento de 1,3 milhão litros de óleo na bacia hidrográfica do Rio. A Federação dos Pescadores do Rio de Janeiro (Feperj) conseguiu indenização para 12.000 pescadores que tiveram seus meios de subsistência prejudicados pelo derramamento de óleo, no entanto, até hoje, nenhum valor foi pago pela Petrobras.
“Eles foram abandonados pelo Estado”, diz Elza Maimone, advogada que tem dado assistência aos pescadores na batalha contra a Petrobras pelas indenizações. “Os políticos usam os pescadores quando querem vencer a eleição. Muitos fazem falsas promessas e depois desaparecem“. Uma das falsas promessas foi a Sarapuí ETE, um centro de tratamento de esgoto inaugurado em 2000, no governo Garotinho, que custou R$37 milhões e que nunca entrou em completa operação por causa, segundo Alencar, da falta de coletores e redes.
Lopes vê a catástrofe atual das ecobarreiras como apenas mais uma ocasião em que o governo do Rio falhou com a comunidade pesqueira:
“O que está acontecendo aqui é um trabalho mal feito das fiscalizações e das autoridades, que permitiram que venham fazer isso aqui no Rio Sarapuí. As coisas não são mostradas nas mídias internacionais e nacionais. A gente está vendo aqui que eles estão fazendo uma Olimpíada para mostrar as coisas bonitas do nosso país, mas aquilo é para um momento e esqueceram que atrás disso aí tem uma comunidade sofrendo.“
Lopes sugere uma solução simples: mover a ecobarreira mais para cima do rio, onde não bloqueasse a área de trabalho deles. “Ninguém consultou os pescadores”, ele diz.