Construindo a Favela: A História de Diogo Barbosa da Vila Laboriaux, Rocinha

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Essa é a segunda parte da série Construindo a Favela, uma coleção de histórias que narram como as pessoas constroem suas casas. A informalidade das favelas do Rio faz com que os moradores sejam criativos e usem seus conhecimentos para construírem quase todas as estruturas que existem nas favelas. Essa série nasceu da seguinte pergunta: “Como você construiu a sua casa?”. As respostas variavam de “Contratamos um pedreiro” a “Fizemos fazendo!”. A série tem como objetivo mostrar a diversidade e complexidade dessas histórias, que são milhares.

Nascido no Estado de Pernambuco, Diogo Barbosa, 25 anos, mudou para o Rio de Janeiro com sua família quando tinha dois anos de idade. Eles se mudaram para a Vila Laboriaux, uma comunidade situada no pico da favela da Rocinha, na Zona Sul.

“Na parte baixa da Rocinha, havia um lugar chamado Campo Esperança onde aconteciam muitas enchentes e outros problemas. [O governo] decidiu construir a Vila Laboriaux num lugar que era um pequeno caminho, uma trilha mesmo. Eles construíram 75 casas aqui, para remover o pessoal que vivia na Vila Esperança. Foi uma remoção pacífica, talvez até uma coisa boa. As pessoas gostaram da ideia de que elas estavam sendo reassentadas dentro da mesma comunidade.”

The calm, quiet street of Vila Laboriaux where Diogo lives.

Quando Diogo e sua família chegaram, os 75 lotes originais ainda existiam, mas a Vila Laboriaux começou a se expandir de forma orgânica, à medida que mais pessoas estavam se mudando para a Rocinha. A mãe de Diogo se casou com um morador do Laboriaux e juntos eles passaram muitos anos construindo a casa em que Diogo cresceu. A área é aberta para a densa floresta do Parque Nacional da Tijuca.

Atualmente, Diogo está construindo a sua própria casa, ao lado da casa de seus pais, com a ajuda de construtores locais, uma nova tradição nas favelas que aumentou com a melhora da condição econômica dos moradores. Até recentemente e, em muitos casos ainda, casas são construídas através de mutirão.

“Eles construíram juntos a casa onde eu cresci. Demorou muito, talvez 15 ou 20 anos. E aqui, onde minha casa está sendo construída, era o quintal. Era uma lote vazio. [A construção] foi se expandido quando minha mãe construiu uma casa para a minha tia… Ela veio de Pernambuco, e eles construíram para ela não ter que alugar, mas talvez, em pouco tempo, ela irá pagar aluguel. E esse era o primeiro piso dessa casa.”

“O segundo piso foi somente uma laje por muitos anos. E essa aqui embaixo, à minha direita, é a casa do meu primo. Era só uma laje, com um contrato que lhe permitia construir uma casa aqui. Mas tinha que deixar aquela parte da laje para a minha tia. E essa parte diferente aqui na laje, esteve sempre vazia. Minha mãe me deu e eu comecei a construir esses dois últimos andares. Essa aqui com a cozinha e a sala é [a próxima] que vai ser para os quartos. É uma longa história, não é?”

Diogo, que está desempregado depois de seu restaurante ter fechado, está nesse processo da construção ha mais de um ano, mas ele afirma que o sacrifício vale a pena. Ele é um dos organizadores do programa Favela Verde que oferece caminhadas ecológicas através da floresta.

“A primeira coisa, realmente, foi guardar dinheiro e investir na construção da casa, porque o investimento é muito alto. Você tem que decidir que quer uma casa e investir quase toda a sua renda nisso. Então você tem que contratar um construtor local, sabe? É normal fazer isso. Geralmente contrata pessoas que você já conhece e que já conversou antes, e então chega num acordo sobre os custos do projeto. Você trata sobre o material que vai ter que comprar, calcula e vê se tem dinheiro o suficiente, e é isso. A maioria dos pedreiros mora na Rocinha, então de uma forma ou de outra, você conhece o trabalho deles.”

“A parte mais fácil foi investir no projeto. Não necessariamente guardar dinheiro, mas investir e pagar. Para mim foi fácil, porque eu sabia que teria um bom retorno no investimento da casa. Mesmo que eu queira alugar ou vender a casa, qualquer coisa que eu queira fazer–o que eu gastei ou o que eu vou gastar–nunca perderá o valor, o valor vai sempre aumentar. Então, para mim, é fácil gastar na casa. Eu fiz um grande sacrifício por essa casa. Eu ainda não tenho tudo o que eu preciso na minha vida, mas eu escolhi a casa como minha prioridade. A parte mais difícil foi administrar o projeto, todo o material, os recursos, comprar, poupar, limpar, contratar os pedreiros, explicar o que eu queria. Sabe, administrar todas essas coisas.”

Com vistas incríveis como a Lagoa Rodrigo de Freitas na frente e a Pedra da Gávea e toda a Rocinha nos fundos, Diogo explica os fatores que influenciaram no processo de concepção da casa.

“Sim, a concepção deu trabalho, mas eu já vinha pensando nisso há muito tempo. Na verdade, eu me preocupo com isso desde que eu era adolescente. Eu queria que a minha futura casa fosse confortável. Por causa disso, eu estava sempre pensando como poderia fazer o melhor, mas ao mesmo tempo com espaço limitado… Eu continuo satisfeito com o projeto. A cozinha teve que ficar virada para o lado da rua, porque eu vou passar menos tempo lá comparado com a sala de estar. Eu acho que entrar pela cozinha é meio chato mas também tem o barulho das motos e outras coisas que influenciaram na localização da cozinha. A sala de estar teve que ficar aqui [do outro lado] por causa disso.”

Mesmo ele tendo gasto bastante tempo economizando e planejando, o processo de contratação de trabalhadores, a escolha de materiais e a gestão e constantes mudanças no projeto é muito trabalhoso.

“Até agora eu gastei R$22.000,00, porque são dois andares. Primeiro minha mãe, que é de uma outra geração, queria que eu construísse apenas um andar igual à casa debaixo. É mais barato, mas eu pensei no futuro e disse não, é muito mais confortável ter a cozinha e a sala aqui embaixo e o quarto e a varanda em cima. Acho que quando estiver tudo pronto vou ficar ainda mais feliz por ter feito desse jeito.”

“Acho que troquei de pedreiros cinco vezes. Um fez essas colunas, um outro fez essa primeira laje, outro fez as colunas no segundo andar e um outro fez as colunas [no outro] andar. Depois eu contratei esse pedreiro de agora para impermeabilizar o telhado. Funcionou bem e eu decidi contratá-lo para fazer as paredes e agora todas as outras pequenas coisas, para fazer direito. É menos stress. Eu também contratei outra pessoa para fazer todo o encanamento e hidráulica. Depois disso vou precisar encontrar mais gente também: alguém para acertar o piso, outro para pintar e alguém para instalar a iluminação.”

“No total, vou gastar R$50.000,00. Vou comprar janelas, armários para a cozinha e coisas para o banheiro para ter uma casa completa, totalmente pintada. Custa bastante dinheiro, não? Mas eu nunca tive todo o dinheiro de uma só vez… Eu sempre tive só o que eu precisava para fazer o próximo cômodo. Na verdade, acho que é melhor fazer assim porque você pensa melhor antes de fazer. Talvez, se eu tivesse todo o dinheiro de uma só vez, eu fizesse de um jeito que não pareceria exatamente como a minha casa; seria como a casa do construtor ou do arquiteto. Eu também não teria aprendido tudo o que aprendi. Eu brinco com os meus amigos que agora eu vou ter um passatempo, como arquiteto ou engenheiro. Eu também cuidei da parte financeira e contratei todos os trabalhadores. Deu muito trabalho.”

Diferente das áreas formais da cidade onde é obrigado a seguir leis de zoneamento e códigos de construção, construir na favela envolve apenas algumas restrições, mas há forte sentimento de consideração com os vizinhos e planejamento prático.

“Eu não tenho o direito de construir mais em cima, seria errado e muito alto. O limite aqui são três andares. As regras são geralmente colocadas de acordo com o bom senso da comunidade, primeiramente porque todo mundo sabe que existe risco com o morro… Ninguém vai controlar você, mas você tem que saber o que está fazendo.”

Diogo tem boas lembranças sobre crescer em uma casa tão próxima da natureza e ter um quarto só para ele e o irmão. Sobre o futuro, ele está otimista sobre a sua casa no Laboriaux.

“Eu quero que minha casa tenha dois andares, o que é super confortável, onde eu possa viver minha vida feliz e relaxado, porque é o lugar onde você passa a maior parte do tempo: comendo, relaxando, dormindo e recebendo visitas, você sabe? Vai ser fácil relaxar com essa vista incrível e perto da natureza.”