João Victor Teodoro, morador do Pavão-Pavãozinho, tem trabalhado ativamente em sua comunidade, para tornar o mundo um pouco melhor. Através do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) ele ingressou no Curso de Relações Internacionais na Faculdade Estácio, o que veio a ampliar cada vez mais seu horizonte de ação. Conheça neste perfil um pouco da história de João Victor. Conheça perfis de outros cotistas publicados no RioOnWatch aqui.
O jovem de 26 anos nasceu no Pavão-Pavãozinho, na Zona Sul do Rio, mas aos dois anos sua família se mudou para Botafogo, bairro de classe média. Filho de líder comunitário, João decidiu voltar a morar no morro aos 20 anos, quando saiu de casa devido a conflitos com familiares. O pai de João já havia falecido, mas ainda era muito querido no Pavão-Pavãozinho e Cantagalo, por ter tentando unir a favela durante seus anos na frente da Associação de Moradores.
Foi quando se mudou para o Pavão-Pavãozinho em 2012 que João percebeu os problemas que existiam na comunidade: “Quando eu vim morar aqui, eu falei: ‘Caramba, esse povo sofre há tanto tempo, alguém tem que fazer alguma coisa’”. Então, começou a fazer críticas pelo Facebook reivindicando direitos e melhorias de infraestrutura e saneamento básico, e a promover reuniões comunitárias e eventos culturais nas favelas. O objetivo, segundo João, também era de unir pessoas de diferentes lugares: “Eu sou muito morro e sou muito asfalto, por conta da minha criação, então tento sempre ir linkando as duas coisas e quebrar a nítida barreira invisível que ainda existe entre os dois ambientes”.
Mas um projeto social não foi o suficiente para João. Por isso, no ano seguinte ele decidiu criar uma página no Facebook com o objetivo de ajudar trabalhadores que não possuem estabelecimento próprio e de promover algumas discussões sobre o despejo irregular do lixo e gerar conscientizção coletiva. Neste mesmo período ele trabalhou como articulador em um projeto promovido pelo Museu de Favela (MUF). Depois, em 2016, João trabalhou para a Secretaria de Estado de Esporte, Lazer e Juventude no programa Caminho Melhor Jovem, que trabalhava com jovens em situação de vulnerabilidade social. “Muitos saíram do tráfico, muitos abriram o próprio negócio”, conta, “tanto que quando o Estado acabou com o programa, nossa, foi horrível! Porque alguns voltaram ao tráfico, outros ficaram perdidos”. Mas esses jovens não eram os únicos: João ficou desempregado, entrou em uma crise financeira e em depressão: “Eu via pessoas, que a gente conseguiu arrancar do tráfico, voltando [ao tráfico] e parecia que o nosso trabalho tinha sido jogado no lixo”. Após o primeiro semestre de 2016, João ficou sem trabalho fixo durante dois anos. Porém, foi convidado a ser colaborador na mídia comunitária Voz das Comunidades.
Enquanto trabalhava informalmente e se candidatava a outras vagas, João ingressou em julho de 2017 no curso de Relações Internacionais, com o objetivo de se aproximar de sua meta de vida: “Eu quero entender como acontecem os conflitos em outras partes do mundo. Eu acho que a minha missão de vida é ajudar pessoas”. O ingresso na Estácio, que é uma faculdade privada, foi possibilitado pelo FIES, um programa de financiamento estudantil do Ministério da Educação, que arca com 80% dos custos da mensalidade, valor que ele precisa devolver depois que terminar os estudos. João é grato pelo apoio do governo e o considera fundamental: “O mínimo é oferecer uma ajuda financeira porque assim todo mundo cresce—as pessoas e o Estado”.
No seu curso universitário, João encontrou exatamente o que lhe convém: “Minhas matérias preferidas são Integração regional na África e Resolução de Conflitos”, diz. Ainda passou em um processo seletivo das Nações Unidas, para fazer parte da delegação do Brasil no The Global Festival of Action, onde participaria de debates entre jovens sobre sustentabilidade e desenvolvimento global em Bonn, Alemanha. Infelizmente, por não ter condições de pagar a passagem aérea, não conseguiu ir.
A falta de dinheiro também afeta sua vida cotidiana: apesar da ajuda financeira do Estado, sua vida de estudante foi inicialmente muito difícil, porque João não tinha dinheiro suficiente para pagar os 20% restantes da mensalidade e os demais custos de vida. Hoje ele lembra: “Se não fosse minha família, nem sei como teria sido, talvez até acho que teria passado fome”. João relata outra dificuldade à seu acesso à universidade: “Pensei em parar os estudos por causa dos tiroteios regulares no Pavão-Pavãozinho”. Mesmo assim, ele não desistiu.
Em outubro de 2018, João finalmente encontrou um novo emprego. Agora ele trabalha no Favela Hub, no Cantagalo, que desenvolve atividades sociais para crianças e jovens da favela e do asfalto. “Bati muito na porta para conseguir esse emprego aqui, fiz amizade com porteiro, fiz amizade com faxineiro, fiz amizade com a recepcionista. Vinha todo dia aqui, até que surgiu uma oportunidade de entrevista e acabei passando”, conta. Agora ele é o “garoto do networking”, visita lugares para falar do projeto e traz moradores da favela para o espaço. João ficou muito emocionado quando percebeu que tinha um chefe preto: “Eu falei para ele: ‘Você é meu primeiro chefe negro, se você conseguiu, eu vou conseguir também’”.
Um dos objetivos principais de João é trabalhar na organização Médicos Sem Fronteiras até o final do curso da faculdade. Conhecendo João, essa meta não parece impossível, pois, como ele reafirma: “O ‘não’ não existe no meu vocabulário”.