No dia 24 de maio, a Redes da Maré organizou um debate no Galpão Bela Maré—um centro cultural na Maré, na Zona Norte—para discutir maneiras de melhorar o tratamento da saúde mental nas favelas. A discussão faz parte de uma série de atividades e mobilizações contra os manicômios no Brasil em comemoração do Dia Nacional de Luta antimanicomial, em 18 de maio. O movimento antimanicomial busca não apenas reconhecer os direitos dos cidadãos com problemas de saúde mental, mas também criar novos espaços sociais para ajudar no tratamento dessas questões. O evento discutiu a criação de tais espaços, particularmente nas favelas, e também abordou o problema crescente da privatização dos serviços de saúde e o fechamento de centros de tratamento na cidade, e como isso é especialmente prejudicial para moradores de favelas.
Muitas vezes negligenciadas em comunidades com recursos limitados, doenças mentais e abuso de substâncias tóxicas afetam profundamente a vida pessoal, familiar e laboral de moradores. Aqueles que não dispõem de recursos adequados para procurar tratamento podem perceber que o tratamento de saúde mental é um luxo oferecido apenas aos ricos. Na ausência de cuidados acessíveis, muitos indivíduos de baixa renda sofrem ao longo de suas vidas com problemas como depressão, ansiedade e abuso de drogas e álcool sem tratamento adequado, o que muito afeta a vida familiar e a produtividade dessas pessoas.
A conversa foi mediada por Luna Arouca, coordenadora do Espaço Normal, projeto da Redes da Maré que funciona como o primeiro centro projetado especificamente para moradores de favelas afetados pelo abuso de drogas e álcool, com sede na Nova Holanda, Maré, e que também serve outras comunidades ao longo da Avenida Brasil. O principal objetivo é criar uma ampla rede de centros de atendimento na área, a fim de fornecer alternativas para combater os efeitos prejudiciais da guerra às drogas.
A palestra contou com o depoimento de Lillian Leonel, frequentadora do Espaço Normal. Lilian falou sobre as várias maneiras pelas quais o Espaço Normal a ajudou a combater os problemas decorrentes do abuso de drogas e da falta de moradia. Ela descreveu o Espaço Normal como uma rede confiável que ajuda a acessar o apoio de Centros de Atendimento Psicossocial (CAPS) e profissionais de saúde. Mais importante, ela enfatizou a diferença entre o tratamento manicomial e os tratamentos oferecidos pelo Espaço Normal. “[Aqui], somos considerados como doentes [e precisando de tratamento]”, afirmou ela. “Vamos fazer o que no manicômios? Eles não vão nos ajudar. Eles vão nos parar, vão nos parar de viver a vida”.
Outra palestrante de destaque, Renata Souza, deputada estadual, e também da Maré, descreveu a criminalização do abuso de drogas como parte do racismo estrutural que está enraizado na cidade e como algo que afeta predominantemente as comunidades negras de baixa renda nas periferias da cidade. Ela descreveu os manicômios como outro meio de controlar os negros pobres, em vez de tentar tratar os problemas de saúde mental. Ela afirmou: “Se o preto e pobre não for morto pela ponta do fuzil, ele é encarcerado. Ele vai ser encarcerado dentro dos manicômios. Ele vai ser encarcerado dentro do sistema penitencial”. Renata Souza enfatizou a necessidade de continuar a luta contra os manicômios para evitar o encarceramento continuado de negros pobres da periferia.
Os outros palestrantes que estiveram no evento foram Daniele Menezes, psicóloga do Centro de Atendimento Psicossocial Miriam Makeba em Bonsucesso; Daniel Souza, organizador e fundador da Street Clinic no Jacarezinho; e Beatriz Adura, psicóloga e integrante do coletivo Niterói Sem Manicômio.
A palestra terminou com uma sessão de perguntas e respostas com os convidados, bem como uma atividade cultural e leitura de poesia. O evento forneceu com sucesso informações e ampliou o entendimento dos modos pelos quais a saúde mental deveria ser discutida e tratada nas favelas. Este foi apenas um dos muitos eventos antimanicomiais e pela luta por melhores tratamentos de saúde mental que ocorreram no Rio neste dia.
O Espaço Normal oferece banheiro, cozinha, roupas, centro de conversação e atendimento sociojurídico para quem procura assistência.
Endereço: Rua das Rosas, nº 54 – Nova Holanda, Maré
Contato: +55 (21) 3105-4767
Horário visita: de segunda a sexta das 14-18h