No dia 8 de junho, o grupo Rocinha Sem Fronteiras convidou a Deputada Estadual e presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da ALERJ, Renata Souza (PSOL) para conversar sobre o tema Direitos Humanos em Tempos de Violência. Na reunião, que aconteceu na Paróquia Nossa Senhora da Boa Viagem, na Rocinha, Zona Sul, moradores ouviram as considerações iniciais da deputada, e em seguida, houve uma conversa entre todos sobre o tema.
Renata Souza é a primeira mulher negra presidente da Comissão de Direitos Humanos. Em suas considerações iniciais, a deputada comentou sobre a importância da sua presença naquele espaço de poder e dos ataques sofridos recentemente. “Eu recebo muitos ataques. Acredito que por ser mulher negra, favelada e ocupando a mesma posição de muitos deles, onde a maioria é homem branco. Realmente incomoda bastante.” Ela explica que direitos humanos vão além de impedir a morte, pois é o direito ao básico para viver: “Não é normal que uma pessoa morra por falta d’água, que fique sem luz por dias, não tenha saneamento básico, que crianças e adolescentes fiquem sem aula e que também sejam vítimas de bala perdida. Nós precisamos nos atentar a isso, porque o morador de favela passa constantemente por essas situações e não pode se acostumar. Isso não é normal. Então, eu acredito muito na política participativa, em ouvir e agir para que essas coisas sejam evitadas”, afirmou a deputada.
Durante a conversa que também abordou assuntos como moradia, água, educação, saúde, saneamento básico e ações da polícia militar em comunidades, os moradores interagiram expondo suas opiniões sobre o tema. O professor de História, Roberto Lucena, 53, morador da Rocinha e articulador do grupo Rocinha Sem Fronteiras, acredita que falta um olhar mais humano do Estado para as favelas. “Eu sinto os direitos humanos violados, principalmente, quando saio de casa para comprar pão e vejo a presença da polícia com armas de guerra. Recentemente aconteceu deslizamento de encosta nas favelas, muitos moradores perderam suas casas ou a Defesa Civil as interditou. As Clínicas da Família estão cada vez mais precárias. Na educação, há salas de aula fechando pois não contratam professores. Por fim, o Estado se faz presente nas favelas e periferias com material bélico e despreza o essencial: saúde e educação”, comentou o professor.
Como articulador do grupo, Roberto também reforça a importância da discussão do tema. Para ele, a explicação sobre direitos humanos é essencial: “O grupo Rocinha Sem Fronteiras considera os direitos humanos um instrumento em defesa dos mais necessitados, porque abrange todas as classes sociais, orientação religiosa, sexual, etnia, etc. Por isso, a reunião foi importante. Precisamos urgente restabelecer a democracia, pois estamos vivendo um regime político ‘teocrático’ e não democrático”, completou.
Michele Lacerda, 31, que trabalha diretamente como assessora parlamentar da Deputada Renata Souza, também é moradora da Rocinha e compareceu a reunião. De acordo com ela, atualmente há uma visão distorcida sobre o que são os direitos humanos: “É triste dizer isso, mas as pessoas estão perdendo a humanidade. O que se fala hoje é que direitos humanos são para defender bandidos, mas os bandidos também são seres humanos. Então, acho que o maior desafio é mostrar que os direitos humanos são para humanos e isso independe de onde vem, onde mora, o saldo da conta bancária, etc. Temos direitos a ser respeitados e não violados, é o Artigo 5º da Constituição e precisa ser respeitado”, ela afirmou.
Michele que é nascida e criada na Rocinha—sobrinha do pedreiro Amarildo de Souza, que desapareceu após ser detido por policiais da UPP da Rocinha, em julho de 2013—comenta que se sente feliz por ter uma reunião dentro da comunidade, um lugar vulnerável, onde não tem tanta informação a respeito desses assuntos: “É de um valor enorme ter e participar de uma reunião que fale sobre direitos humanos dentro da favela. A gente consegue ter uma possibilidade maior de respiro, mas principalmente de se sentir amparado e não se sentir sozinho nessa luta por direitos. Uma reunião deste nível, dentro de uma favela, dá forças para continuar”, disse Michele.
Muitos moradores se sentiram felizes com o resultado do encontro, alguns até emocionados por terem votado em Renata Souza e pela oportunidade de poder discutir diretamente com ela sobre pautas em comum. Foi o caso do designer Pedro Paiva, que visivelmente emocionado, comentou o privilégio que era estar presente naquela reunião e poder sentir que alguém no poder se preocupa com a população das favelas: “É muito importante quando um representante do poder público vem à favela e o diálogo pode se dar de maneira direta e sincera. No caso da Renata é incrível poder falar com a presidente da Comissão de Direitos Humanos, que mediou a audiência pública na ALERJ que tratava sobre as violações dos direitos humanos nas operações policiais em favelas. Esse tema é extremamente necessário de se debater para que possamos lutar contra os excessos cometidos pelo Estado e entender como nos proteger contra esses ataques”, ele afirmou.
Ao fim da reunião, muitos se sentiram esclarecidos sobre os temas colocados em questão e democraticamente decidiram quais assuntos são importantes colocar em pauta. As reuniões do Rocinha Sem Fronteiras acontecem mensalmente e têm como objetivo buscar soluções efetivas para os problemas da comunidade através de discussões com representantes dos temas escolhidos.