Aproximadamente 500 pessoas foram às ruas do Complexo do Alemão, na manhã do dia 4 de abril, pedindo o fim da violência na comunidade após a morte de cinco pessoas em 24 horas. Dentre as vítimas, estava uma criança de 10 anos, Eduardo de Jesus Ferreira, atingido por um tiro de um policial enquanto estava nos degraus da porta de casa e Elizabeth Alves de Moura Francisco, morta dentro de casa por uma bala perdida.
Os manifestantes se mobilizaram para lembrar as vítimas da violência em curso no Alemão, onde intensos tiroteios acontecem diariamente há meses.
Moradores do Alemão e simpatizantes de outras partes da cidade se reuniram, às 10 horas da manhã na entrada da Grota, no Complexo do Alemão. Vários moradores e líderes da comunidade fizeram discursos, aclamados pela crescente multidão que gritava “Queremos paz!” e pedia o fim da UPP. Dentre os oradores convidados de fora da comunidade, estava o atual presidente da Anistia Internacional Brasil, Atila Roque.
A moradora Rosilene de Oliveira, do Morro da Baiana, no Alemão, disse que estava cansada de ver violência em uma comunidade que costumava ser pacífica. Diz ela: “Estou aqui porque eu estou cansada de tanta violência numa comunidade aonde antes nós podíamos ir e vir sem nos preocuparmos com a hora de entrar em casa, hoje em dia não é assim. Estamos perdendo várias ONGs que têm projetos no Alemão, os funcionários das ONGs não conseguem entrar aqui, estão com medo. Moradores que trabalhavam no teleférico estão sendo mandados embora porque estão diminuindo o quadro de funcionários, porque quando começa o tiroteio tem que parar. Então chega né, está na hora de dar um basta nessa violência toda”.
Muitos manifestantes usavam branco e levavam balões com a palavra “paz” escrita. Alguns seguravam cartazes dizendo “Nós merecemos viver sem medo”, “Chega de tantas mortes” e “A favela pede paz”, dentre outros dizeres. Crianças carregavam faixas pedindo por “menos balas, mais amor”.
O protesto terminou com uma chamada das crianças que foram mortas no Complexo do Alemão. A multidão respondeu gritando “presente” enquanto cada nome era chamado.
Às 11h a multidão de cerca de 500 pessoas começou a caminhada, partindo da estrada principal, Estrada do Itararé, parando o trânsito e seguindo adentro da comunidade Nova Brasília. Um grande grupo de moto-taxistas, que perderam um colega para a violência policial em maio de 2014, liderou a marcha. Os manifestantes foram acompanhados por policiais a pé e seguidos por cinco carros da polícia UPP. Um helicóptero da polícia, que era visto circulando a comunidade, foi vaiado todas as vezes que se aproximava da manifestação.
A moradora Simone Nunes expressou preocupação com a representação midiática da violência na favela. Ela disse: “Quando algo acontece, eles dizem que há envolvimento com o tráfico de drogas quando não há. Dizem que [a vítima] tinha uma arma quando não tinha. Então, se uma pessoa morre na favela ou é bandido ou está envolvido em alguma coisa. Eles sempre acusam o morador de estar conivente com os traficantes. Muitas vezes [as vítimas] estavam brincando quando o tiroteio começa”.
Muitos moradores se queixaram do fato da grande imprensa nunca entrevistar os moradores ao vivo, o que dá o poder da mídia de controlar a narrativa como quiserem. Simone Nunes disse: “A gente não tem mais onde recorrer porque a mídia faz a reportagem do alto de seus helicópteros e nunca bota o microfone para o morador falar ao vivo porque eles preferem editar e colocar aquilo que eles preferem. Então, a gente está cansado, é só isso o que eu tenho para falar”.
Um caminhão de som acompanhou a passeata, disponibilizando espaço para discursos e música. Muitos manifestantes cantaram junto as letras do Rap da Felicidade (de Cidinho), que tocou repetidas vezes enquanto o protesto continuava: “Eu só quero é ser feliz/ Andar tranquilamente na favela onde eu nasci”.
Raull Santiago, parte do coletivo de mídia comunitária Papo Reto, disse que estava no protesto para lembrar das pessoas que perderam suas vidas para a violência. Ele disse: “Eu estou aqui hoje para pedir pela vida, para lembrar cada um dos nossos que sangrou não só todos esses anos no Complexo do Alemão, mas principalmente desde 1º de janeiro. São mais de noventa dias de tiroteios diários. Muito sangue, muita morte, e eu estou aqui pra pedir que isso pare, para que as pessoas parem de sangrar, para que parem de matar”.
Os manifestantes se dispersaram até chegarem a uma grande praça em Nova Brasília, onde voltaram a se unir em oração por aqueles que foram mortos. No fim do protesto, foi feito um anúncio de alto-falante a respeito de relatos sobre um tiroteio acontecendo na Grota, onde a passeata havia começado apenas algumas horas antes, evidenciando a importância da manifestação.