No dia de 24 de agosto, uma manifestação organizada pelo Movimento Unido dos Camelôs (MUCA) foi realizada no Centro do Rio para protestar contra a violência sistemática do Estado contra os vendedores ambulantes. O protesto aconteceu apenas uma semana após a intensificação dos confrontos entre a Guarda Municipal e os trabalhadores informais, que são particularmente comuns no entorno da estação Central do Brasil. A violência atingiu seu pico em 18 de agosto, quando a Guarda Municipal atacou os camelôs com spray de pimenta e balas de borracha, enquanto os vendedores ambulantes atiraram pedras e tentaram resistir ao confisco de seus bens.
Ser camelô é uma das únicas opções profissionais para uma grande parcela da população socioeconomicamente desfavorecida do Rio. De acordo com dados divulgados pelo município em 2009, 35.000 camelôs foram registrados, mas apenas 18.440 licenças haviam sido emitidas. Devido à natureza informal da profissão, o número real de camelôs é provavelmente muito maior.
A recente tendência de megaeventos esportivos realizados em países com altas taxas de emprego informal (como a Copa do Mundo de 2010 na África do Sul), tem atraído mais atenção ao impacto de tais eventos em vendedores de rua. Atualmente, os Jogos Olímpicos de 2016 estão sendo usados como uma ferramenta contextual e discursiva para enquadrar uma luta de longa duração entre os camelôs e a prefeitura. Manifestantes da passeata da semana passada vêem o atual “projeto de cidade” que está sendo implementado pela prefeitura como um ataque sobre os direitos e os meios de subsistência da população de baixa-renda. Segundo a coordenadora do MUCA, Maria de Lourdes, o modelo representa um amplo consenso entre os diferentes partidos políticos e facções: “Nada muda, só muda o partido, mas a repressão é a mesma”.
Os camelôs suspeitam que o fogo que queimou o espaço do camelódromo, ao lado da Central do Brasil, em 2010, foi um incêndio premeditado destinado a facilitar a remodelação da área. O fogo levou à retirada dos camelôs que vendiam no mercado, abrindo espaço para a construção do teleférico da Providência, como parte do projeto Porto Maravilha. Os camelôs também foram forçados a sair da Praça Mauá, que foi completamente remodelada e é agora o lar do Museu de Arte do Rio.
Sob o slogan de “O camelô não é ladrão, o camelô é trabalhador!”, os manifestantes apresentaram suas demandas: o fim da violência contra comerciantes informais por parte das forças de segurança e da militarização da cidade; um fim à apreensão de pertences dos vendedores de rua; e a legalização e emissão de licenças para os trabalhadores informais. Ativistas do MUCA foram apoiados por outros grupos, tais como membros da Aldeia Maracanã, a aldeia indígena urbana próxima ao Estádio do Maracanã, que passou por uma campanha de resistência longa. Marco, um ativista indígena, fez um discurso emocionado durante a manifestação: “O que está acontecendo aqui é uma manifestação organizada pelos trabalhadores, pessoas honestas que ganham o pão de cada dia”. Unidos com os camelôs, os ativistas indígenas compartilham da visão de que a atual transformação do Rio é excludente, na sequência de um projeto de cidade global no qual as minorias e os cidadãos de baixa renda são marginalizados.
Organizado em nome dos camelôs desde 2003, o MUCA declarou seu compromisso de desafiar a repressão em curso contra os camelôs. No entanto, a natureza da profissão torna a organização mais difícil, pois vendedores ambulantes são comerciantes individuais que trabalham no dia-a-dia, o que torna difícil mobilizar os trabalhadores e simpatizantes a assistir os comícios. Mas os manifestantes que compareceram na passeata da semana passada expressaram esperanças para a mudança política. Como Raimonte, um ativista do MUCA, observou: “A Olimpíada será no ano que vem, mas também haverá eleições”.