Pelas escadarias, entre as muitas casas marcadas pela Secretaria Municipal de Habitação (SMH) para remoção no Morro da Providência, moram milhares de vidas repletas de sonhos e expectativas. Há crianças, adolescentes, jovens e idosos amantes da comunidade onde construíram uma parte de suas histórias de vida.
E caminhando pela Providência, encontramos Viviane Neves, sentada na escada com seu filho caçula. A jovem de apenas 25 anos, vendedora de roupas, moradora da comunidade desde que nasceu, contou um pouco da sua trajetória até hoje.
De luto há 2 semanas pelo seu padrasto, Paulo Sérgio, 56 anos, que faleceu de fibrose muscular. Atordoada com a saudade e as lembranças, Viviane diz ver vultos do padrasto pela casa todos os dias. “Ele foi meu herói. Me criou desde quando eu era pequenininha. Era na dor, na alegria, na angústia, ele estava sempre ali comigo” conta a jovem, emocionada.
Ela relata um pouco das suas travessuras vividas ao longo de sua adolescência na Providência. Engravidou quando tinha apenas 15 anos do seu primeiro namorado que, segundo ela, era machista e infiel. “Foi um desespero quando eu descobri que estava grávida. Eu namorava a pouquíssimo tempo e nem gostava dele tanto assim. Quando minha filha nasceu, eu nem sabia cuidar dela direito. Minha mãe que cuidava e eu não queria nada com a vida,” diz ela.
Viviane teve mais de 10 namorados na Providência e engravidou mais de 4 vezes. “Queria encontrar o homem certo nos lugares errados. Me descuidava e engravidava,” explica ela.
Aos 18 anos, ela fez um aborto, com 6 meses de gravidez, após ver seu namorado beijando outra menina em um baile. “Eu fiquei com muita raiva, aí pensei: ‘pra que mais um filho para sofrer no mundo?’ Aí meu amigo me emprestou R$2.000 e eu fiz o aborto” confessa ela. Aos 20 anos, engravidou novamente de gêmeos de um outro namorado, mas com 3 meses teve que abortar, pois as crianças estavam fora da bolsa de gestação. “Foi muito doloroso e sofrido para mim. As vezes acho até que foi um castigo de Deus pelo aborto que tinha feito 2 anos antes”, opina ela.
Sua infância na Providência foi muito divertida. Ela vivia aprontando pelo morro e recebendo surras do seu padrasto. “Eu catava brinquedos no lixo, aí minha mãe me apelidou de ‘maria-lixo’, espiava casais transando de madrugada, bebia cerveja escondido…”
Hoje, Viviane teve seu segundo filho e dizia finalmente ter encontrado o amor da sua vida, até descobrir que ele era casado há 12 anos. “Tive várias paixões, mas amor foi só uma vez. Ele me enganou, mas eu tinha decidido perdoá-lo desde que ele se separasse da mulher para ficar comigo, mas isso não aconteceu”, relata o jovem.
A casa de Viviane está marcada pela SMH e após a morte de seu padrasto, ela e sua família estão sem renda fixa. Seu destino é uma incógnita, mas ela não desanima e garante ir até o fim pelos seus filhos. “Eles são tudo pra mim e não quero que eles passem pelo o que eu passei”, conclui ela.
Já do outro lado do morro, temos a história de Luís Gomes, 50 anos, que ficou paraplégico há 20 anos atrás, quando reagiu a um assalto em Nova Iguaçu. “Dois pivetes foram vieram me abordar, e eu acostumado com os bandidos daqui, não podia aceitar aqueles moleques me ameaçando. Então eu reagi e fui baleado no peito e na coluna com 8 tiros”, explica ele.
Ex trabalhador do Porto, aposentado por invalidez, Gomes diz ter esperança de voltar a andar. Está fazendo fisioterapia a alguns meses e aos poucos está recuperando alguns movimentos. Dependente de seus amigos para ajudá-lo a descer as escadarias, ele sente uma pessoa muito limitada. Sua família se espalhou por Sepetiba após a morte de sua mãe, que sofria de insuficiência respiratória.
Apesar de sua casa não estar marcada pela SMH, ele sofre pelos seus amigos e vizinhos que vão ter que se espalhar. A comunidade tem muitos fundadores e dentre eles, destaca-se Dona Isaura, sua avó que faleceu de insuficiência respiratória, a mesma doença de sua mãe.
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