Na minha primeira visita ao morro da Providência, conheci o Seu Mangará, Manga do forro, Manga verde ou José Pedro, que iniciou comigo uma conversa em lamentos versados, sobre o que a vida lhe proporcionara tempos atrás. Tempos esses contados em anos, meses e dias. Fazia naquele dia 11 anos, 5 meses e 21 dias que sua esposa havia falecido.
José Pedro, Mangará, como era conhecido no meio em que frequentava, tocando forrós e curtindo churrascos por toda a comunidade, mesmo quando havia as facções, contou-me que chegou ao Rio de janeiro em 21 de maio de 1974 e morou durante 11 meses com o irmão numa casa ao lado da qual vive hoje, a qual por sinal não está marcada para remoção, a casa atual do seu Mangará está marcada para a remoção. Na época, a casa era alugada pelo irmão de Mangará que se chama Antônio Pedro e que agora tem uma casa própria na comunidade. Seu irmão não estava em casa, no momento da entrevista, porque trabalha com empreitadas e estava no meio a uma em Macaé na Região dos Lagos.
Vindo do Ceará, onde vivem suas 4 irmãs, ele tem no Rio de Janeiro a presença de seu irmão mestre de obras, e seus próprios filhos. O filho de seu Mangará mora na comunidade da Providência e a filha em São Conrado na comunidade Vila Canoas Zona Sul do Rio.
Seu Mangará sofre de diabetes, que diz ter surgido em função do uso excessivo dos remédios que precisou tomar após um acidente que sofrera em 2001 onde perdeu a visão do olho esquerdo. Mangará afirma: “a diabete é uma doença degenerativa” e relata que tudo em seu corpo cresceu desde a cabeça até o pé. Hoje não consegue mais andar e depende das crianças da comunidade para comprar pão, carne, etc.
“É muito bom ter amigos”, comenta ele sobre as crianças e jovens que o conhecem e o respeitam, porém sua vontade é de voltar a sua cidade natal para lá mesmo falecer ao lado de suas irmãs, que não vê desde a década de 70. “Eu não quero mais dar trabalho a ninguém só quero descansar” conclui seu Mangará.
Durante nossa visita aparece um rapaz que quer saber se o Manga conserta ventiladores e ele responde positivamente ao mesmo dizendo: “conserto sim pode levar, tá tudo queimado” e o rapaz sorri da brincadeira e diz a marca do ventilador e oferece o ventilador para seu Manga como doação, ele agradece e o rapaz sai.
Pergunto a ele há quanto tempo ele conserta ventiladores e ele me responde: “eu nem conserto, eu dou um jeito” aponta para uma pilha de telas e grades de ventilador e diz: “isso aí foi tudo ventilador que se jogou fora porque não funcionava mais”, e mostra uma raquete de matar mosquitos e diz que consertou e que o rapaz que lhe pediu que consertasse deu a raquete a ele.
Mangará me conta: “eu to querendo sair dessa casa, o que eu tinha eu gastei nessa casa comprando tijolo, pagando tudo essa laje aí não é pré-moldada é uma laje maciça, eu gastei tudo aí, essa laje tem 17 metros e são 51metros quadrados aqui em cima e embaixo, são mais de 100 metros quadrados contando tudo, e esse chão também foi comprado, a minha esposa que comprou, a minha velha”.
Indago se ele precisaria do papel da escritura para ter a indenização da prefeitura e ele disse: “não porque aqui ninguém tem nada, e querem tirar as casas, agora tem um detalhe, nós somos um país democrático para me tirar daqui ou tem que me dar um dinheiro, ou então me dar um lugar para eu morar, o que eu não quero, eu quero é um dinheiro pra eu voltar pra minha terra”.
“eu comprei já havia comprado uma casinha lá, mais minha irmã não ficou bem ai eu dei pra ela, na rua do Jatobá 571” nos conta.
“Tô com vontade de voltar a minha terra
Rever meu pé de serra e meu povo que eu deixei lá
Não tem remédio que acabe a minha dor
Meu coração ficou na rua do Jatobá.”
Esse é um dos versos do Seu Mangará.
Conheça mais alguns versos do seu Mangará no vídeo abaixo.
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