Com o Rio de Janeiro estando cada vez mais imerso na crise financeira, o setor de educação do estado tem sofrido grandes retrocessos. Para combater a possibilidade de falência, o Estado anunciou que até 1.000 escolas públicas seriam fechadas nesse próximo ano. Enquanto professores, estudantes e grupos de defesa do Rio têm lutado arduamente contra os fechamentos de escolas em massa, o sistema de educação pública parece estar perdendo o controle.
O Estado do Rio nunca é aleatório ao escolher quais escolas fechar. De acordo com Luiza*, professora de uma escola pública na Zona Sul, o governo pensa duas vezes antes de fechar uma escola em uma área nobre, ao passo que fechar uma escola em uma favela ou bairro de baixa renda tornou-se algo facilmente resolvível. “Você fecha muito mais tranquilamente uma escola onde as pessoas ricas não veem. A política é de criminalização da pobreza.” Quando uma escola fecha, os alunos são mandados para outra escola pública que tem espaço, mas não necessariamente na mesma região. Muitas vezes, esses alunos têm de viajar mais de uma hora para chegar à escola. “A gente recebe alunos de muitos lugares diferentes. Quando eles fecham escolas em bairros periféricos, os alunos vêm para a Zona Sul.” A mistura dos alunos, em seguida, cria uma questão de superlotação. “Muitos lugares funcionam como duas escolas em uma”, disse Luiza.
Em novembro de 2016, alunos e professores realizaram uma audiência com o Secretário de Educação convocada pela Comissão de Educação da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) para discutir o estado das escolas públicas, especialmente os fechamentos. Elaine Melchiades, uma aluna de 16 anos de um colégio fechado recentemente em Novo Friburgo, expressou preocupação com os direitos de seus companheiros de classe e professores. “Somos pessoas, somos ideias! Se a democracia tem que ser feita, que ela seja feita corretamente. Principalmente com as pessoas que vão usufruir disso que estão nos oferecendo”, disse Elaine Melchiades.
A professora de história Simone Duarte, que também estava na reunião, descreveu alguns aspectos da realidade que os membros da comunidade enfrentam quando uma escola de bairro é fechada. No ano passado, a escola na qual Simone ensinava em Niterói foi fechada indeterminadamente, e ela viu os efeitos em primeira mão. As repercussões dessa decisão, ela explicou, eram enormes. “O problema é a ideia de pertencimento. A escola atende a comunidade há 102 anos, é centenária, só nesse prédio a gente está há 48 anos. A comunidade tem a escola como referência. Os alunos ficam de fora (das decisões), os pais dos alunos, que também foram alunos da escola, ficam de fora. Não houve comunicação, não houve consulta popular com a comunidade. O governo quer ignorar também a ideia da diferença entre as comunidades. O que se oferece aos alunos é uma escola que fica em uma outra comunidade, isso traz para o aluno e para a família esse sentimento de insegurança e medo”, disse Simone Duarte.
O fechamento de escolas é apenas um aspecto dos muitos problemas enfrentados pelo sistema de escolas públicas no Rio hoje. Embora seja muito improvável que o governo feche a escola de Luiza na Zona Sul, as condições de trabalho tornaram-se praticamente insuportáveis. Ela mencionou que seu salário em uma escola não é suficiente para pagar o aluguel, então ela trabalha em mais de uma. Uma das escolas que ela está trabalhando agora não tem dinheiro suficiente para contratar o pessoal administrativo básico–nem mesmo um porteiro ou pessoal de limpeza. A qualidade do ensino também é extremamente preocupante. “Praticamente não há mais professores de física ou química no sistema de ensino público, todos os qualificados estão encontrando outros empregos melhor remunerados.”
Embora a atual crise financeira tenha afetado a grande maioria das pessoas em todo o estado do Rio de Janeiro, as comunidades de baixa renda têm sido as mais atingidas. Luiza expressou sua frustração com a decisão da prefeitura de realizar os megaeventos recentes, apesar de sua incapacidade de fornecer serviços básicos para os cidadãos. “No meu entender, nós tivemos a Copa que demonstra que a gente não estava sem dinheiro. Agora chegou a hora do governo pagar a conta. Mas está usando o dinheiro das pessoas que precisam. É uma crise de moral, mais de moral do que econômica. Tiram dinheiro da educação. Nós estamos lidando com alguns problemas muito sérios.”
*Alguns nomes neste artigo foram alterados para proteger os entrevistados.