A Associação de Moradores e Amigos do Horto (AMAHOR) da histórica comunidade do Horto localizada próxima ao Jardim Botânico, lançou cursos gratuitos de costura, artesanato e cerâmica no início deste ano. Os cursos são realizados semanalmente na sede da AMAHOR em parceria com três organizações de arte e buscam oferecer tanto uma alternativa econômica e espaço para socialização como apoio emocional dentro de uma comunidade que tem lutado contra remoções durante décadas. Enquanto a maioria dos alunos são mulheres da comunidade do Horto, a participação de alunos de comunidades de todo o Rio também é bem vinda.
A professora de cerâmica nascida no Horto, Tatiana Costa, ingressou nesta área por acaso. “Me ofereceram um emprego para trabalhar num atelier, e na minha mente eu acreditava que aquilo era um atelier de moda. E quando eu fui, era um atelier de cerâmica e eu me apaixonei de primeira”. Tatiana imediatamente se apaixonou por esta arte, mas enquanto estava sendo treinada para o emprego, rapidamente reconheceu a alta barreira econômica que existe para ingressar na atividade. “Havia um ceramista que tinha o seu próprio espaço e dava aulas. Vi um grupo de pessoas que, financeiramente falando, podiam pagar a aula de cerâmica, mas 90 porcento estavam focadas na cerâmica como lazer. Sempre me questionei, porque não também trazer um público que não têm os recursos financeiros para pagar, mas para quem a cerâmica poderia ajudá-los a entrar no mercado de trabalho?”
“Então a partir daí eu fiquei com esse objetivo de aprender, buscar…tudo que eu pudesse dentro da cerâmica, conhecer pessoas no meio da cerâmica que pudessem fazer parcerias ou pudessem me indicar lugares onde eu pudesse encontrar preços mais acessíveis, pra futuramente, que é o meu agora,…poder oferecer todo meu conhecimento, toda minha busca, todo meu processo…para quem quer aprender”, ela fala com entusiasmo. Apesar de Tatiana atualmente estar morando na favela Parque da Cidade nas proximidades, ela encontrou na AMAHOR uma parceira interessada e espaço acessível para tornar a sua organização Cerâmica Para Todos uma realidade.
Tatiana Costa, assim como a professora de costura Cristina de Souza e a professora de artesanato Fabíola Key das organizações Divinas Axilas (uma ONG criada em 2008 pelos fundadores do bloco carnavalesco Suvaco do Cristo, referindo-se à sua localização debaixo do braço da estátua do Cristo Redentor) e Fada Remendeira, realizam os seus cursos gratuitamente em troca do espaço na sede da AMAHOR. “Este projeto é uma troca sem nenhum incentivo governamental ou institucional”, explica a ex-presidente da AMAHOR, Emília de Souza. “[As professoras] precisam de um espaço para desenvolver o trabalho delas, e fornecem para a gente a formação das meninas. Então não existe aqui aquela coisa de que ‘aqui não há dinheiro então não vai acontecer'”.
“A gente também não está fechado aqui só para mulheres da comunidade do Horto”, diz Cristina de Souza. “Não é uma proposta que é só aqui para a gente. Está aberta para outras comunidades que queiram participar, e mesmo se não seja de comunidade. As pessoas de fora que tenham condições de pagar e que queiram fazer o curso pagam para poder estar apadrinhando quem não possa estar pagando. Um ajuda o outro e o outro puxa o outro a partir da solidariedade”. Os líderes da comunidade esperam que os alunos de fora da comunidade do Horto que participam dos cursos descubram a verdade em primeira mão sobre a resistência da comunidade à remoção ao invés de acreditar nas deturpações da mídia.
“Estamos mostrando que a comunidade tem o potencial de se afirmar em termos de solidariedade, sustentabilidade e geração de renda. E com isso a gente vai passo a passo conscientizando as pessoas que não existe essa coisa de invasores depredadores. Que a gente está aqui para construir e contribuir com a sociedade”, explica Cristina.
Estas aulas são um ressurgimento da bem-sucedida cooperativa de costura que a AMAHOR anteriormente organizou no premiado clube comunitário Caxinguelê, que o Jardim Botânico fechou em 2014. “Vimos a necessidade de estar fazendo alguma coisa em benefício das mulheres [do Horto]. Havia tanto sofrimento sem qualquer tipo de terapia ou assistência psicológica. Algo que não fosse só nas reuniões, nas assembleias, aquela coisa de discutir o direito, a permanência, enfim”, lembra Cristina. Ao reabrir o curso de costura, os moradores estão afirmando a sua dedicação de permanecer na terra que os seus ancestrais receberam quando construíram o Jardim Botânico.
A AMAHOR está considerando a possibilidade de tornar o curso de costura uma nova cooperativa, dependendo do interesse dos alunos. De acordo com Cristina, os objetivos das aulas são a geração de autoestima e de renda, as duas principais funções dos empreendimentos econômicos solidários (EESs), mas ela manifesta preocupação quanto ao partidarismo. “Temos muita vontade de participar do projeto de economia solidária, mas temos medo que é um projeto da prefeitura. Porque se [a economia solidária] é um projeto que pensa em benefício da geração de renda então eles não têm que estar botando bandeira do partido A, B ou C”.
Em 2013, 68% dos EESs mapeados no estado do Rio de Janeiro através do projeto Nacional de Mapeamento SIES eram informais e apenas 6% cooperativas, devido em parte a complicações logísticas que tornam a formalização dos EESs um desafio e aos altos níveis de taxação das cooperativas. Graças ao protagonismo entre os atores da comunidade, uma qualidade primordial da economia solidária, a necessidade de apoio do governo é mínima, mas o presidente da AMAHOR, Emerson de Souza, diz que as opções de comercialização, como o circuito de feiras Rio EcoSol estabelecido pela prefeitura, são incentivos para formalizar uma cooperativa, pois dão apoio às mulheres para desenvolverem as suas novas habilidades transformando-as em negócios bem-sucedidos.
A crise do desemprego no Brasil atingiu o pior nível visto pelo país em 20 anos, recentemente chegando a 15,6% no Rio de Janeiro. “Hoje o desemprego é muito alto. Por isso temos que ter várias profissões, para se não der certo em uma, ir para a outra”, comenta Antônia Pereira Alves, aluna dos cursos de costura e artesanato na AMAHOR. “Assim, se uma ocupação não der certo, podemos seguir para a próxima”. Ela pretende usar as habilidades que está aprendendo para ajudar a financiar a sua formação em oncologia. Antônia também aprecia como Fabíola e Cristina insistem em usar materiais reutilizáveis nas suas aulas de artesanato e costura. “Acho muito legal essa parte da sustentabilidade porque como tá todo mundo falando que o país está em crise, então, muitas vezes o dinheiro está no lixo, o lixo que vira luxo.”
Tatiana Costa espera que algumas das suas alunas se encontrem na cerâmica como foi o caso dela. “Talvez futuramente eu faça uma exposição com os alunos, para mostrar um outro lado da cerâmica. Minha arte vende no MAM e no MAR. Hoje já tem uma busca por arte e por exposições. Mas quando eu vi meu trabalho lá dentro eu vi a possibilidade que existe de encontrar talentos que estão escondidos por aqui.”
A AMAHOR está promovendo o evento Arte de Agosto, aberto à visitação na sua sede, mostrando os trabalhos de arte produzidos pelos moradores nas aulas, datas e local abaixo:
Agosto 19, 20, 26 e 27 das 12-20 horas
Estrada Dona Castorina, 69 Estrada Dona Castorina, 69
Horto – Jardim Botânico – RJ
Para mais informações sobre as aulas na AMAHOR, entre em contato com:
Emerson Souza – Presidente da AMAHOR
Celular/WhatsApp: +55-21-99923-5885
Email: associacaodemoradoresdohorto@gmail.com