Recentemente, foi realizada uma nova edição do singular tour Rolé dos Favelados, dessa vez questionando a revitalização da Zona Portuária que antecedeu as Olimpíadas de 2016. A ideia por trás do Rolé dos Favelados é a de vivenciar uma visão crítica do Rio de Janeiro em tours conduzidos por guias e ativistas de favelas. Até agora, os tours já aconteceram no Morro da Providência, Santa Marta e Vila Autódromo. Cada um deles foi conduzido por um ativista comunitário diferente e tinha por objetivo combater a estigmatização das favelas do Rio.
Envolvido em todos os tours é o guia turístico da Providência, Cosme Felippsen, que no caso do tour da Zona Portuária estava acompanhado pela atriz e produtora Cintia Sant’Anna. Cosme, graduado em turismo, começou a trabalhar como guia turístico aos oito anos, reconhecendo a necessidade de mudar as percepções negativas que as pessoas que não moram em favelas têm delas. Cintia, também nascida na Providência, é uma jovem inspiradora que criou em 2015 a plataforma online Entre o Céu e a Favela, visando unir, divulgar e valorizar os produtos culturais, a arte e o desenvolvimento social no Morro da Providência e no vizinho, Morro do Pinto. Ela também é co-fundadora da companhia Bando Teatro Favela.
Ambos desejam divulgar uma mensagem mais profunda sobre as favelas como locais de valor histórico e criativo, ricos culturalmente e socialmente, e em constante transformação. Eles veem os tours como uma oportunidade para os moradores quebrarem os estereótipos negativos que dominam as narrativas da mídia e dos formuladores de políticas sobre as favelas e seus moradores. Ainda mais importante neste tour específico, eles querem desconstruir a narrativa oficial que propaga que a Zona Portuária estava “abandonada” antes de sua “revitalização” pelo projeto Porto Maravilha, que essencialmente transformou a área em uma atração turística.
Essa área abriga o Morro da Providência, a primeira favela do Rio e também outros pontos históricos de importância crucial para a cultura afro-brasileira, como o Instituto Pretos Novos (IPN), o Cais do Valongo, o Jardim Suspenso do Valongo, e a Pedra do Sal. O tour teve seu início na Praça da Harmonia e Visitou o IPN, o Cais do Valongo, uma galeria de arte de rua, a Pedra do Sal e terminou na renovada Praça Mauá, em frente ao Museu de Arte do Rio (MAR). Os participantes eram sobretudo brasileiros, alguns deles estudantes de arquitetura e urbanismo, professores e jornalistas.
1. Instituto Pretos Novos, ou IPN
Este museu situado na Região Portuária do Rio abriga o maior cemitério de escravos da América, um dos principais locais que preservam o legado da cidade como o maior porto de entrada de escravos da história mundial.
2. O Cais do Valongo
O cais foi o maior ponto de chegada de africanos escravizados trazidos ao Brasil–ou a qualquer lugar. Recentemente, foi reconhecido pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade. De acordo com a UNESCO, “é o mais importante vestígio físico da chegada dos escravos africanos ao continente americano”. De um ponto de vista histórico, “é um local de memória, que remete a um dos mais graves crimes perpetrados contra a humanidade”.
Nesta parada, Cintia mostrou e explicou os diferentes aplicativos existentes–que permitem que os visitantes aprofundem seus conhecimentos sobre a Região Portuária do Rio, sobretudo a região conhecida como Pequena África–tais como o Museu do Ontem e Passados Presentes.
3. Galeria de Arte de Rua
A galeria de arte de rua é uma das entradas do Morro da Providência que foi usada por Cosme durante o tour na favela. Belos grafites feitos pelos artistas locais são exibidos nos muros. Cosme escolheu este local para fazer a sua importante pergunta habitual ao público: “O que é uma favela?”
4. Pedra do Sal
A Pedra do Sal, onde o sal e outras mercadorias foram comercializadas por centenas de anos–quando as águas da Baía de Guanabara ainda à alcançava, antes de ser aterrada–abriga um quilombo e nos últimos anos novamente se tornou popular, devido as rodas de samba semanais que são realizadas no local, às segundas e às sextas, bem como por outros eventos. O local é considerado o berço do samba brasileiro, já que diversas canções originais do ritmo foram escritas lá, há mais de cem anos. De acordo com Cintia, o açúcar também era negociado na Pedra do Sal, em quantidades maiores do que as de sal. Moradores locais sempre realizaram festas na Pedra do Sal, mas desde a revitalização da região, Cintia afirma que existem mais turistas do que locais. Ela utilizou essa parada para discutir as últimas tentativas de criminalização do funk, lembrando que a criminalização dos movimentos populares culturais já aconteceu muitas vezes na história do Brasil, inclusive com o samba. Cintia explicou que, no geral, as autoridades gostam de manter o controle sobre as atividades relacionadas às favelas. Até mesmo um recente festival de arte organizado por Cintia na Providência foi parado pela polícia, que esteve presente durante todo o evento, dissuadindo os moradores de participarem.
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