No dia 24 de outubro, O Espaço Plínio, no Centro, sediou o evento de lançamento de dois livros focados em direito à moradia: Direitos Humanos e a Colonização do Urbano—Vila Autódromo na Disputa, por Marcela Münch; e Universidade e Luta pela Moradia, por Glauco Bienenstein, Regina Bienenstein e Daniel Mendes Mesquita de Sousa. No evento houve um painel que contou com as autoras Marcela Münch e Regina Bienenstein, e também com Sandra Maria, ativista e moradora da Vila Autódromo e a ativista Lurdinha da Ocupação Manoel Congo e do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM).
A autora Marcela Münch abriu a discussão com uma visão geral da sua experiência como pesquisadora e ativista na Vila Autódromo, o que diretamente deu forma ao seu livro. Fica difícil, ela disse, ser uma acadêmica voltada à ação em um mundo acadêmico que ainda valoriza os pesquisadores que se mantêm distantes dos seus “objetos de estudo”. Sobre o tópico da Vila Autódromo propriamente dita, ela inseriu os recentes e contínuos processos de marginalização, desapropriação, e remoção como parte de um mecanismo que existe no Brasil desde a era colonial, e que é sustentado pelo capitalismo especulativo de hoje em dia. Marcela enfatizou a necessidade de manter uma luta ativa pelo direito à moradia, dizendo que “sem luta, não tem direito que segure nada. A gente precisa estar lutando o tempo inteiro”. De acordo com a autora, os envolvidos na luta devem continuar compartilhando as suas experiências a fim de aumentar a conscientização do público em geral quanto às ameaças e promover o intercâmbio do conhecimento de estratégias para a resistência.
Em seguida, passou-se o microfone para Regina Bienenstein, que também refletiu sobre o relacionamento difícil entre os mundos da academia e do ativismo do direito à moradia. Ela explicou como–nas discussões sobre o papel da universidade–ela e seus colegas começaram a acreditar que a universidade poderia ser um ponto de partida essencial para superar a divisão entre as elites e o resto da cidade. Mas para que isto aconteça, Regina frisou que os acadêmicos e os alunos precisam engajar-se nas realidades da cidade e participar nas lutas da população, “trazendo essa cidade popular para dentro da academia” ao invés de reforçar a distância entre os dois mundos. Neste momento atual, quando muitas comunidades enfrentam ameaças de remoção e estão se mobilizando para resistir, ela clamou por “uma universidade que fique lado a lado–não é na frente e não é atrás–é do lado do trabalhador na defensa dessa cidade que a todos pertence, especialmente aos trabalhadores que a constroem”.
A terceira oradora foi a ativista da Vila Autódromo, Sandra Maria, que recontou a história da Vila Autódromo para dar continuidade ao argumento de Marcela sobre o legado colonial presente nas ameaças de remoção de hoje em dia. Quando as elites atuais–seja autoridades do governo ou repórteres da Globo—se referem aos moradores das favelas como “invasores” da terra que ocupam, parece que estão se esquecendo quem foram os primeiros invasores do Brasil, ela observou. Finalmente, Lurdinha do MNLM delineou o trabalho do movimento e a sua luta contra instituições e corporações poderosas. Ela sugeriu que a corrupção e as políticas de exclusão promovidas por estes atores da elite parecem dificultar constantemente os esforços populares para expandir o acesso à moradia. No entanto, ela observou que o governo geralmente deixa de considerar as mobilizações comunitárias e as raízes significativas que os moradores possuem nas favelas, que podem inspirar nas pessoas uma intensa determinação de lutar pelos seus direitos de permanecer.
Durante todo o evento, a discussão entre os oradores e membros do público sublinhou a importância dos tópicos explorados pelos dois livros para o momento atual no qual o risco de remoção está, mais uma vez, ameaçando comunidades em todo o Rio de Janeiro desde a enorme Rio das Pedras e o bicentenário Horto até o contingente de 15 famílias que estão enfrentando remoções na Estrada de Maracajás.