No dia 14 de novembro, foi realizado na BRICS Policy Center o lançamento da publicação Ninguém Entra, Ninguém Sai – Mobilidade Urbana e Direito à Cidade no Complexo do Alemão, resultado da parceria entre os pesquisadores Sérgio Veloso e Vinícius Santiago, da PUC-Rio, com o Coletivo Papo Reto do Complexo do Alemão.
No evento de lançamento houve um debate com a presença dos dois autores do livro, Sérgio Veloso e Vinícius Santiago, pesquisadores do BRICS Policy Center (BPC); Thainã de Medeiros do Coletivo Papo Reto e Raquel Barros, da Ong FASE.
O estudo quis ressaltar as duas dimensões da mobilidade: para dentro e para fora da favela. Porém, um dado da pesquisa se tornou estruturante a medida que a pesquisa avançou: a violência. No final de janeiro, o conflito armado se intensificou e a Polícia Militar invadiu onze casas na favela de Nova Brasilia, ponto estratégico do Complexo do Alemão. Essa situação levou à suspensão da pesquisa, modificando seu sentido e seu conteúdo. Os pesquisadores passaram a integrar a violência como um dado estruturante da pesquisa. E o direito à vida, ainda mais fundamental que o direito à cidade, surgiu como prioritário.
O que é se sentir seguro no Complexo do Alemão?
Vários riscos são percebidos como sendo mais elevados fora da favela do que dentro, como os de ser assaltado ou de ser abordado pela polícia. A entrada na favela traz para muitos um sentimento de segurança, como expressado por Thainã de Medeiros. Enquanto morador da favela e militante ativo do Coletivo Papo Reto, ele declarou sentir mais insegurança no trecho que ele caminha diariamente entre a estação do metrô e a entrada da favela do que dentro da favela. Durante este trecho, ele sente o medo de ser revistado pela Policia Militar além do medo de ser assaltado. Mas isso não impede que, dentro da favela, outros direitos não venham a ser negados, como o direito de circular e estar na rua, e até o direito de estar seguro dentro da própria casa, por causa dos tiroteios que podem surgir a qualquer hora.
O Estado: entre presença e ausência
“O estado não entra, ele entra só com fuzil”, explica Thainã. Num jogo entre presença e ausência, o Estado do Rio de Janeiro está presente nesta zona através das suas forças armadas, mas está ausente em termos de serviços públicos básicos. A reestruturação das linhas de ônibus foi uma das principais queixas formuladas nos questionários pelos moradores do Alemão, pois depois disso eles não conseguem mais ir diretamente para Zona Sul. Esta reestruturação da rede de transporte público, como também a escolha de certos horários para que “o trem funcione bem na Baixada, mas no fim de semana feche às seis horas, são outras formas de segregação”, disse Raquel Barros. A educadora da Fase interpreta essa ausência do estado como “uma modalidade de presença do estado”.
Estratégias para entrar, sair e circular dentro da favela
Frente a essa presença deficiente do estado, os moradores constroem uma coletividade através do “nós por nós: eu faço por você e você faz por mim”. Desta forma, os próprios moradores criam os serviços e mecanismos que o estado só traz de forma parcial. Os meios de transporte alternativos representam estratégias de mobilidade para acessar à cidade e para circular dentro do Complexo de Alemão. O representante do Coletivo Papo Reto completa: “o favelado é quem mais circula na cidade e para isso ele precisa inventar formas de viver nela: dormir na Central, pular a catraca, andar de Kombi”. Os mototáxis precisam conhecer em detalhe a favela e saber onde podem passar de forma segura, assumindo um papel fundamental para a mobilidade dos moradores. Assim, o estudo mostra que 57% dos moradores da região da Grota e de Nova Brasília utilizam o ônibus, 12% o moto-táxi e 12% a Kombi. Estas estratégias, diante um estado falido e ausente, permitem aos moradores circular e “andar pelo canto”, entrando e saindo diariamente do Complexo de Alemão.