No dia 28 de janeiro foi realizada no Quilombo do Dendê, no Recôncavo Baiano, a primeira reunião do ano do Conselho Quilombola da Bacia e Vale do Iguape em Cachoeira, Bahia. O conselho atua diretamente e indiretamente com mais de 3500 famílias, pois é composto por quatorze comunidades quilombolas que estão distribuídas nos distritos de Santiago do Iguape e São Francisco do Paraguaçu, sendo elas: Kaonge, Kalembá, Kaimbongo, Velho, Kalole, Dendê, Imbiara, Engenho da Ponte, Engenho da Praia, Engenho da Vitória, Tombo, Engenho Novo, Engenho da Cruz, e Brejo.
O Conselho Quilombola da Bacia e Vale do Iguape é uma rede organizada pelas comunidades quilombolas, onde dialogam, trocam experiências e se organizam para pressionar os poderes públicos em relação a suas demandas. O conselho tem como objetivo reunir todas as comunidades quilombolas da região, mobilizar as demais comunidades para o processo de luta, regularização fundiária, acesso a políticas públicas e articulação com outros movimentos. Através do I Encontro Baiano de Comunidades Quilombola, o Conselho participou da criação do Comitê quilombola da Bahia em Ação, do Conselho da Resex Baia do Iguape e do Núcleo Gestor Território de Recôncavo entre outros.
As comunidades que compõem o conselho passaram por processos organizativos distintos, alguns desenvolveram formas organizativas apenas esporádicas e outros experimentaram processos mais consolidados através de lutas e associações.
Durante a primeira reunião do ano, foram debatidas diversas pautas importantes para as comunidades. Além dos conselheiros, estavam presentes representantes do IPHAN, da Escola de Biologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Conectando Territórios, Instituto Awuré e associações locais.
Uma das pautas apresentadas pelo membro da comunidade quilombola Kaonge, Ananias Viana, foi a agroecologia para um alimento saudável, onde foram apresentadas melhores práticas de produção sem desmatamento por queimada para a produção de produtos de qualidade e sem uso de agrotóxicos. Também foi discutida a organização dos agricultores familiares e a certificação para esses agricultores e a valorização da história e cultivo do dendê.
A ampliação do turismo comunitário foi uma outra questão debatida. As comunidades se organizam em torno do tema a partir do Núcleo de Turismo Étnico Rota da Liberdade.
A comunidade do Kaonge falou sobre a sexta edição da Caminhada Ancestral que ocorreu no dia anterior, com a participação de parceiros, estudantes de biologia da UFBA, turistas e um secretário de Estado. Essa caminhada de mais de quatro horas representa o percurso feito pela matriarca da comunidade, que saia às 4 horas da manhã, vendia e voltava no mesmo dia. Durante décadas ela fez esse caminho para vender os produtos em Acupe.
Outra pauta de discussão foi sobre a participação das comunidades quilombolas no Fórum Social Mundial que será realizado em Salvador no período de 13 a 17 de março. Foram apresentadas questões relacionadas a dificuldade em conseguirem hospedagem para as comunidades quilombolas. Milena Nascimento do Instituto Awure, organizadora do Fórum Social Mundial, enfatizou sobre a importância das comunidades quilombolas estarem presentes e terem sua própria voz para que “as comunidades tradicionais possam resistir e não ser mais invisibilizadas”.
O tombamento das comunidades do Vale do Iguape pelo IPHAN e Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC), foi uma outra demanda apresentada por carta pelas comunidades.
Outras pautas, como capacitação para mediação de conflitos que será realizada em julho pela Universidade de Virgínia (EUA), um projeto financiado pela União Européia para as comunidades e uma apresentação de um projeto proposto pela Escola de Biologia da UFBA, também foram apresentados durante a reunião.
Foram trazidas questões de grande relevância sobretudo com intervenções em relação a regularização dos territórios. No final da reunião representantes de cada comunidade se organizaram em um grupo de trabalho para tratar desses assuntos.
As comunidades quilombolas da Bacia e Vale do Iguape, ao formarem o Conselho, lutam coletivamente pela efetivação de seus direitos e pelo poder de falar por elas próprias.
Thais Rosa Pinheiro é mestra em Memória Social pela UNIRIO e é fundadora do Conectando Territórios.