No dia 3 de agosto, a Frente Parlamentar Contra Remoções, Despejos e Violação do Direito à Moradia sediou um debate público intitulado “Direitos à Moradia e a Luta contra Remoção”, na Prefeitura. Com mais de cinquenta pessoas presentes–incluindo ativistas de favelas de toda a cidade–o debate procurou chamar a atenção para comunidades que atualmente enfrentam remoções, e fortalecer a comunicação entre moradores de favelas, movimentos sociais e autoridades municipais.
O vereador Renato Cinco, que organizou o evento, abriu o debate discutindo a longa história de remoções no Rio e argumentando que a administração do Prefeito Marcelo Crivella só serviu para exacerbar a situação das favelas que enfrentam a remoção. Desde o início do mandato de Crivella, a prefeitura introduziu várias propostas e iniciativas que podem facilitar remoções, incluindo o estabelecimento de uma meta para remover casas localizadas em áreas de alto risco ambiental e a criação de um grupo de trabalho para tratar do “reassentamento” de famílias que vivem em “ocupações irregulares”.
A primeira palestrante a falar foi Emília de Souza–moradora do Horto, ex-presidente da Associação dos Moradores e Amigos do Horto (AMAHOR) e membro do Conselho Popular. Emília falou sobre a realidade das pessoas da classe trabalhadora e dos moradores de favelas no Rio, apontando que: “As comunidades foram criminalizadas, despejadas, excluídas e proibidas de morar na Zona Sul em benefício da especulação imobiliária. Este é o histórico do Rio de Janeiro”. Após seu discurso, Emília compartilhou uma apresentação visual, destacando as lutas de várias comunidades face às remoções, à injustiça ambiental e à restrição de serviços públicos–ao mesmo tempo em que expressava as demandas dos moradores e reconhecia suas vitórias.
Maria da Penha, moradora da Vila Autódromo, continuou a conversa observando que sua comunidade não foi respeitada–apesar do acordo coletivo de reassentamento negociado pelos moradores que conseguiram resistir à remoção e, finalmente, puderam permanecer. “Eu fico indignada porque um município, uma prefeitura, tem um acordo assinado com vinte famílias, junto a defensoria pública, e não estão nos respeitando. Dois anos se passaram e nada foi feito”, afirmou Maria da Penha. Ela argumentou que o fracasso da prefeitura em cumprir suas promessas representa mais uma estratégia para expulsar os moradores remanescentes.
Adriana Bevilaqua, uma representante do Núcleo de Terras e Habitação (NUTH), juntou-se à conversa, observando que é obrigação do governo prover moradia adequada para todos. No entanto, esse direito não foi cumprido porque há muito poucas medidas para a proteção contra remoções, sugeriu ela. Como resultado, no período pré-Olímpico entre 2009 e 2015, 22.059 famílias (cerca de 77.000 pessoas) foram removidas de suas casas no Rio de Janeiro.
Baseando-se nas palavras de Adriana, Maria de Lourdes “Lurdinha” Lopes Fonseca, do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), argumentou que devem haver novas ferramentas e caminhos para enfrentar as remoções e reverter a lógica especulativa que caracteriza cada vez mais a cidade.
Após esses palestrantes, Verônica Cristina de Oliveira–representando a Subsecretaria Municipal de Infraestrutura e Habitação–compartilhou algumas palavras sobre a atual situação de moradia no Rio de Janeiro. O discurso de Verônica girou principalmente em torno de esclarecer o propósito do “reassentamento”. Ela observou que o processo de reassentamento procura conservar estruturas organizacionais preexistentes dentro das comunidades e que o processo é realizado de forma participativa. Além disso, Verônica afirmou que as famílias só serão reassentadas quando forem impactadas por condições específicas, como o risco ambiental. Ela argumentou que o processo é transparente e que, por meio do reassentamento, a prefeitura busca reassentar as famílias perto de sua comunidade original, em vez de deslocá-las para áreas precárias.
Após o discurso de Verônica, moradores de várias favelas foram convidados a expressar suas preocupações e demandas. Marcello Deodoro, da Indiana, na Zona Norte, expressou fortes críticas às autoridades da prefeitura, especificamente ao Prefeito Marcelo Crivella, afirmando que muitos moradores de sua comunidade ainda carecem de serviços básicos e lutam para cobrir o aumento do custo da moradia. Antônio Cardoso, de Rio das Pedras, na Zona Oeste, cuja comunidade obteve uma grande vitória na luta contra as remoções no final de 2017, destacou os custos emocionais e psicológicos das remoções.
Edivalma “Di” Souza da Cunha, representando as comunidades de Maracajás e Rádio Sonda na Zona Norte, observou que as duas pequenas comunidades são extremamente vulneráveis diante da ameaça de remoção. É difícil para os defensores públicos apoiarem os moradores em seus momentos de necessidade devido aos regulamentos rígidos de entrada na base da Força Aérea, que restringe o acesso a essas comunidades. Ana Frimerman, de Araçatiba, na Zona Oeste, observou que sua comunidade entrou em contato com a prefeitura para apoiar sua batalha contra a remoção pelas autoridades federais, mas a prefeitura não conseguiu facilitar e nem tomou medidas para apoiar o caso. Outro morador enfatizou a indignação dos moradores de favelas que carecem de segurança da posse da terra: “Como é possível que não possamos ser os donos de nossas próprias casas, mas os estrangeiros?…Sim, eles são. Que indignação!”
Após ouvir cada representante das comunidades falar, Verônica respondeu, defendendo o processo de reassentamento da prefeitura. Ela pontuou: “Quando falo sobre intervenção, não estou falando de intervenção com remoção, mas de intervenção com urbanização”. Verônica continuou: “É importante pensar no reassentamento como um potencial para a urbanização local, não é uma questão de remoção ou reassentamento”. Ela afirmou que existem processos em andamento para as comunidades se engajarem de maneira participativa durante o processo de reassentamento.
Fechando o debate, outros oradores enfatizaram que a prefeitura até hoje não conseguiu dialogar com as comunidades que estão sofrendo ou que estão sendo ameaçadas de remoção, e que as promessas às comunidades não foram cumpridas. Mobilizando-se por meio da Frente Parlamentar Contra Remoções, moradores de favelas de todo o Rio esperam que a prefeitura abra espaços de diálogos para abordar essas preocupações e garantir coletivamente o direito à moradia.