Iniciativa: Muda Maré
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Ano de Fundação: 2011
Comunidade: Complexo da Maré
Missão: “Promover, através dos conhecimentos acumulados nas áreas de educação ambiental e agroecologia, uma interação transformadora com o complexo de favelas da Maré visando articular diferentes segmentos da sociedade através da interdisciplinaridade de suas ações, promover a troca de saberes, a elaboração de ações conjuntas e contribuir para o seu desenvolvimento sustentável.”
Eventos Públicos: Aulas públicas, oficinas, exibição de filmes e projetos de trabalho colaborativos
Como Contribuir: Participar de uma oficina ou se voluntariar para ajudar em um projeto colaborativo
Para Ruth Osório de Lima, o Complexo da Maré sempre foi seu lar. Nascida e criada no complexo de dezesseis favelas, na Zona Norte do Rio de Janeiro, Ruth chama a Maré de uma “cidade completa”, onde moradores podem achar tudo que precisam, de escolas a supermercados.
Enquanto as primeiras memórias de Ruth envolvem passar tempo com sua família e brincar nas ruas de Maré, ela também se lembra de períodos sombrios de tiros e violência, e diz que moradores podem se tornar acostumados com essa realidade. Do mesmo modo, Ruth diz que problemas de saneamento na Maré também são aceitos como normais. Lixo nas ruas, esgoto a céu aberto e transbordante—devido a uma falta de drenagem apropriada—e a proximidade entre as casas e locais de descarte do lixo são alguns dos aspectos aceitos como parte do status quo que aflige todos os moradores da comunidade.
Ruth também nota que pela proximidade da Maré com o Centro, a área tem carência de áreas verdes. “É um tipo de selva de pedras. Só tem construção.” Ao crescer, ela diz: “Não tinha árvores. Não tinha muito espaço de lazer”. Ao passo em que as favelas costumam servir como solução que atende a necessidade de moradia, Ruth sente que os moradores foram forçados a abrir mão de espaços naturais e verdes a fim de encontrarem casas. “É como se as pessoas nem tivessem direito a uma árvore, sabe? As pessoas querem ter uma árvore. Se você perguntar a qualquer pessoa que mora na Maré, ela vai falar que quer um espaço verde, um espaço mais bonito”.
Diante desses desafios, moradores da Maré frequentemente apoiam uns aos outros, trabalhando para melhorar a comunidade. Esse espírito de solidariedade inspirou a criação do Muda Maré, um projeto sediado na UFRJ que foca na educação ambiental e agricultura urbana nas favelas da Maré.
Em 2010, a ONG comunitária Redes da Maré (Redes de Desenvolvimento da Maré) formou a iniciativa Maré Que Queremos, que resultou na criação do Fórum das Associações de Moradores (FAM), que se reúne mensalmente, unindo os presidentes das 16 associações da Maré para planejar projetos com o objetivo de melhorar a qualidade de vida local. Em 2011, procurando ajudar a FAM em abordar problemas com relação ao meio ambiente e saúde, três estudantes da UFRJ decidiram dar início ao Muda Maré como um projeto de extensão universitário. Para sua primeira atividade, Rua da Muda, o Muda Maré colaborou com membros da comunidade para plantar mudas ao longo da Rua Sargento Silva Nunes na comunidade Nova Holanda. Foi neste momento que a adolescente Ruth teve seu primeiro envolvimento com o Muda Maré, se juntando à organização formalmente em 2015. Agora, ela mesma é estudante de engenharia da UFRJ. Ruth é a integrante mais veterana do Muda Maré, administrando projetos e integrando novos membros no quadro da organização.
O Muda Maré foi lançado com a meta de fortalecer o espírito de troca entre a universidade—localizada logo no outro lado do mangue na Ilha do Fundão—e a Maré. Os sete estudantes membros da iniciativa, incluindo Ruth, assim como seu orientador, um professor da UFRJ, todos se empenham em construir uma parceria entre a UFRJ e a Maré. “O que está sendo produzido dentro da universidade tem que ser trocado com quem está fora daquele espaço”, diz Ruth. “É para todo mundo ter acesso ao que está sendo produzido lá dentro [da universidade]. Então, [o projeto de] extensão surgiu nessa iniciativa de troca”.
O Muda Maré frequentemente trabalha em colaboração com a Redes da Maré, especialmente no campo da educação. Essa colaboração inclui ensinar educação ambiental para crianças e jovens inscritos no pré-vestibular da Redes da Maré, assim como estudos de campo projetados para tirar os estudantes da sala. Esses cursos, que cobrem tudo, desde biomas e gestão de resíduos até água e energia, são feitos para ajudar entender melhor as aulas em sala e também a relação entre seres humanos e o meio ambiente.
O Muda Maré luta para abordar esses assuntos pela perspectiva de seus moradores, prestando atenção em problemas específicos que a comunidade enfrenta, e em como moradores estão implementando soluções. Ambos, na classe e em campo, os membros do Muda Maré enfatizam que o meio ambiente não é simplesmente um objeto a ser examinado. Ruth acredita que ela e seus colegas desempenham mais o papel de facilitadores, porque os alunos de suas turmas já possuem amplo conhecimento de temas ambientais.
Além de liderar cursos de educação ambiental e aulas de campo, o Muda Maré também colabora com a Redes da Maré na iniciativa Maré de Sabores, um curso de gastronomia e gênero, de um semestre de duração, realizado para permitir que mulheres locais se tornem chefs de cozinha certificadas e alcancem autonomia financeira. Desde 2013, estudantes do Muda Maré ministraram oficinas para o Maré de Sabores sobre segurança alimentar, soberania nutricional, pesticidas e Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANCs). As oficinas também incluem uma seção teórica focada em problemas com o meio ambiente e com a nutrição do corpo humano, assim como “a desmistificação dos hábitos alimentares” tais como o vegetarianismo, veganismo e a antropoentomofagia (consumo de insetos). Os membros do Muda Maré também guiam mulheres da Maré de Sabores em tours pelo campus da UFRJ, visitando projetos da universidade e espaços dedicados à agroecologia.
Fora da Redes da Maré, o Muda Maré começou a dar aulas de educação ambiental no Colégio Estadual João Borges. Localizado em um prédio previamente abandonado, a escola foi criada por professores e estudantes que ocuparam a estrutura com a visão de promover um ambiente dedicado à educação participativa e conhecimento coletivo. Na Redes, membros do Muda Maré dão aulas e lideram projetos no Colégio Estado João Borges, focando em educação ambiental e desafios ambientais.
Fora da Maré, Ruth e outros membros do Muda Maré estão sempre envolvidos com atividades na UFRJ. Na universidade, o Muda Maré é um membro da Rede de Agroecologia junto com 17 outros projetos de extensão. Como um membro da rede, o Muda Maré ajudou a organizar o Encontro Regional de Grupos de Agroecologia do Sudeste (ERGA-SE), no ano passado no Rio de Janeiro. Além do mais, cada ano Ruth e seus colegas são anfitriões de recepções de boas vindas aos novos estudantes de agroecologia.
Refletindo sobre todas as mudanças do Muda Maré, Ruth afirma que a iniciativa empenha-se em manter uma visão completa e abordagem crítica acerca de problemas ambientais na Maré. Subjacente às atividades da iniciativa há uma visão de sustentabilidade em viver em harmonia com o lugar em que você mora. “Você se identifica com seu território, se reconhece enquanto parte daquele espaço e aí automaticamente vem o respeito [por seu território], e aí vem a convivência harmônica”, comenta Ruth.
*Muda Maré é um dos mais de 100 projetos comunitários mapeados pela Comunidades Catalisadoras (ComCat)—a organização que publica o RioOnWatch—como parte do nosso programa paralelo ‘Rede Favela Sustentável‘ lançado em 2017 para reconhecer, apoiar, fortalecer e expandir as qualidades sustentáveis e movimentos comunitários inerentes às favelas do Rio de Janeiro. Siga a Rede Favela Sustentável no Facebook. Leia outros perfis dos projetos da Rede Favela Sustentável aqui.