O Crescimento do Movimento Global do TTC, Parte 4: França—Institucionalização da Habitação Participativa

Institucionalização da Habitação Participativa

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Em comemoração ao 50º aniversário do New Communities, o primeiro Termo Territorial Coletivo* do mundo, e à medida que planejadores e moradores de TTCs se reuniram para comemorar de 2 a 5 de outubro na Conferência ‘Recuperando Terrenos Baldios 2019’ em Atlanta, Geórgia, o RioOnWatch emitiu uma chamada por matérias destacando o crescimento atual do movimento TTC em todo o mundo. Colaboradores de várias partes do mundo escreveram histórias sobre a expansão de TTCs—tanto em número quanto em abordagem—no MississippiReino UnidoBélgicaFrança, Porto Rico, Rio de Janeiro e Flórida. Esta série variada tem como objetivo disseminar notícias dos sucessos do modelo TTC à medida que se adapta a novos tempos e circunstâncias, chamando mais atenção para esta solução inovadora para garantir o direito à moradia e ao desenvolvimento comunitário, e seu potencial na resolução da crise habitacional global.

A matéria de hoje, da assistente da Comissão Europeia e ex-voluntária da Comunidades Catalisadoras Katja Majcen, explica os processos legais por trás do crescimento dos TTCs na França.

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Na França, a noção de habitat participatif (habitação participativa, autogerenciada e/ou autoconstruída) tem tido grande sucesso. Reforçado pelo movimento hippie e várias décadas de tensão no setor imobiliário, o apoio ao movimento atingiu um pico após os tumultuosos eventos de maio de 1968, em meio à crescente pressão sobre o mercado imobiliário e ao aumento de preços. Na década de 1970, as tendências sociais e iniciativas voltadas para comunidades em todo o país começaram a dar lugar a soluções alternativas às práticas habitacionais convencionais, confrontando o legado do Código Civil Napoleônico, onde a propriedade da terra e da edificação estão intimamente entrelaçada.

Projetos participativos continuaram a se organizar na década de 2000, especialmente em grandes cidades como Grenoble, Lille, Estrasburgo e Paris. Erguendo-se para abordar questões de acesso à moradia, os projetos foram apoiados pela presença de poderosos grupos ativistas, incluindo movimentos cooperativos e autogestionados, grupos de ação municipal, grupos de educação popular, entre outros.

Para ganhar legitimidade e visibilidade nacional, esses grupos uniram forças. Em 2007, eles começaram a organizar reuniões nacionais anuais, reunindo moradores, arquitetos, senhorios sociais, representantes de autoridades públicas e outros, com o objetivo de divulgar suas ações e reunir recursos e conhecimentos. Uma reunião, em 2010 em Estrasburgo, marcou um verdadeiro ponto de virada, levando ao estabelecimento de uma Rede Nacional de Comunidades para Habitação Participativa (RNCHP), incluindo associações, profissionais e funcionários eleitos. O RNCHP é uma plataforma para compartilhar experiências e uma ferramenta operacional para incluir a habitação participativa como um componente de políticas públicas. É uma rede aberta à comunidade e outras instituições, e também funciona como um grupo de pressão política.

Ao mesmo tempo, o interesse no modelo do Termo Territorial Coletivo (TTC) começou a aumentar na França, após a implementação bem-sucedida de TTCs na Inglaterra e em Bruxelas. No final de 2013, a associação Community Land Trust France foi criada para promover os princípios e valores dos TTCs, adaptá-los ao contexto francês e aumentar a conscientização entre grupos e proprietários de terras.

A rede nacional participou regularmente do grupo de trabalho liderado pela então Ministra da Igualdade Territorial e Habitação Cécile Duflot, fazendo pressão efetiva e obtendo maior reconhecimento nacional. A rede também desempenhou um papel importante na adoção de novas estruturas legais para implementar iniciativas habitacionais participativas, incluindo TTCs, na França.

Diferentemente de seus colegas na Inglaterra e nos EUA, que começaram a implementação antes de obter apoio legislativo, os TTCs franceses surgiram através do processo legislativo. Após anos de incubação nas redes associativas e ativistas, habitação participativa foi reconhecida e regulamentada pela primeira vez em 2013, quando Duflot apresentou à Assembléia Nacional um projeto de lei (projeto nº 1179), conhecido como projeto de lei ALUR. O texto foi discutido, emendado e votado, entrando na lei em 2014, com um capítulo intitulado “Criando novas formas de acesso à moradia através da habitação participativa”. O texto também incluía um artigo (L 200-1) que foi introduzido no Código de Construção e Habitação do país, descrevendo a habitação participativa como uma abordagem cidadã, que permite que indivíduos contribuam para o projeto, bem como na definição e, se necessário, na gestão e construção coletiva de sua habitação.

A lei permitiu, assim, a criação dos Organismes Fonciers Solidaires (OFS), baseado no modelo do Termo Territorial Coletivo, mas não igual. A lei de Crescimento, Atividade e Igualdade de Oportunidades Econômicas, conhecida como “lei Macron”, de 6 de agosto de 2015, concluiu as adaptações legais necessárias, criando um bail réel solidaire (“concessão de solidariedade real”) para melhor atender a certas restrições relacionadas ao direito contratual, incluindo um limite de 99 anos para arrendamentos enfitêuticos (que obrigam os arrendatários a melhorar suas propriedades com a construção), bem como desassociar terras do próprio edifício, diminuindo o preço da habitação.

Esse novo arcabouço legal viabilizou “corporações habitacionais participativas” destinadas a apoiar indivíduos na construção ou aquisição da propriedade para sua habitação, bem como em espaços compartilhados. Esses indivíduos são considerados parceiros e cada um adquire ações correspondentes ao seu lote. Cada um deles tem o mesmo peso no processo de tomada de decisão, participa ativamente do processo de design e, quando necessário, no gerenciamento da propriedade.

Essas empresas habitacionais participativas podem assumir a forma de uma “corporação de alocação e autodesenvolvimento”, na qual cada morador detém ações ou uma “cooperativa de moradores”, adotando uma lógica de propriedade coletiva, na qual os moradores têm o duplo status de parceiros e inquilinos. Eles então pagam uma taxa mensal para reembolsar o empréstimo coletivo.

O modelo francês se destaca devido ao papel do morador no processo. O papel essencial dos moradores nos projetos ingleses e norte-americanos está relacionado à sua ancoragem bastante local, no nível do bairro. O modelo francês, no entanto, mantém um foco na questão da habitação em si, com uma missão social em um escopo além do nível local. A ação urbana na França continua sendo em grande parte responsabilidade da comunidade pública, que representa todos os moradores do território de maneira democrática. Ao acompanhar a criação de um coletivo envolvido na questão da habitação, no entanto, e ao se concentrar mais no próprio bairro, os OFSs podem incentivar e apoiar a construção de iniciativas populares.

Os OFSs representam, portanto, oportunidades para incentivar uma nova forma de mobilização cidadã na França. Seu maior foco nos moradores pode ser essencial para superar a função puramente técnica do OFS (isto é, da propriedade da terra), chamando a atenção para o papel social do morador e valorizando essa nova forma de propriedade desassociada e seus beneficiários.

Essa é a quarta matéria da nossa série sobre o crescimento global do movimento de TTCs.

*O TTC é um arranjo fundiário onde os moradores são donos ou inquilinos nas suas casas, enquanto todos, coletivamente, através de uma associação, são donos da terra e zelam pela comunidade como um todo. Tirando a terra da equação do valor das moradias, os moradores são resguardados em relação aos impactos nocivos de terras em áreas de especulação.