Iniciativa: CocôZap
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Ano de Fundação: 2017
Comunidade: Complexo da Maré
Missão: Fazer o debate acerca do saneamento básico dentro das favelas ser mais acessível a partir da ação direta do cidadão na produção de dados, do monitoramento das políticas públicas, da geração de narrativas contra-hegemônicas em debates públicos e de mutirões.
Eventos Públicos: O CocôZap organiza mutirões comunitários na Maré e fóruns públicos sobre problemas de saneamento.
Como Contribuir: Doar, colaborar com a coleta de dados e ajudar a aumentar a visibilidade do projeto.
Nas favelas do Complexo da Maré na Zona Norte do Rio de Janeiro, o data_labe está usando dados para disseminar novas narrativas por moradores de favelas e das periferias urbanas. Nascido do Observatório das Favelas, também situado dentro da Maré, em 2016, o data_labe era originalmente composto por cinco jovens versados em dados quantitativos. Além de gerar reportagens baseadas em dados públicos, o grupo também realizou programas de treinamento para jovens e mapeou iniciativas de comunicação nas favelas.
O data_labe se tornou uma entidade independente em 2017, e a organização agora emprega dez membros de diferentes origens em sua equipe. O trabalho é focado em três frentes distintas: jornalismo, educação e produção de dados gerados pelo cidadão (DGC), o que, de acordo com o coordenador do data_labe Gilberto Vieira, consiste em “como que as pessoas podem produzir dados por si mesmos, e como elas podem se engajar na produção de dados sem ser um instituto de pesquisa formal”. Para Gilberto e toda a equipe do data_labe, os dados públicos e os DGC constituem ferramentas poderosas para influenciar as narrativas sobre a cidade do Rio e seus moradores.
Uma das principais áreas de DGC do data_labe é o saneamento básico. Motivados pela ideia de “construir um canal de denúncia, debate e proposição para saneamento básico”, Gilberto e seus colegas formularam planos para uma nova iniciativa em 2016: o CocôZap. O CocôZap dá aos moradores a oportunidade de fazerem denúncias acerca de violações de saneamento na Maré. Os moradores que encontrarem vazamentos de águas residuais não tratadas, lixo não coletado ou falta de acesso à água limpa podem enviar uma mensagem e fotos a uma conta de WhatsApp administrada pelo data_labe. Gilberto e outros membros da equipe do CocôZap então sobem o relato para um banco de dados online, que inclui data de observação, descrição do problema sanitário, categoria do problema, frequência na qual o problema ocorre e localização. Além do banco de dados, a equipe do CocôZap mapeia cada problema reportado. Uma vez que os dados estão organizados e mapeados, Gilberto e seus colegas usam a informação para criar relatórios e apresentações sobre os problemas sanitários e seus impactos sobre os moradores da Maré.
No futuro, a equipe do CocôZap espera que esses relatos baseados em dados auxiliem os moradores no diálogo com o setor público. Historicamente, foram os próprios moradores da Maré e de outras favelas da cidade que garantiram a infraestrutura de saneamento para eles mesmos, a partir de mobilizações para pressionar o governo a proverem serviços públicos básicos. O CocôZap espera proporcionar um avanço tecnológico a essa mobilização já profundamente enraizada. “CocôZap ajuda manter os moradores da Maré em um lugar de protagonismo político”, explica Gilberto. Por promover a coleta de DGC e produzir conteúdo baseado em dados locais, o CocôZap está trazendo o debate do saneamento de volta à população.
Seguindo o planejamento inicial do CocôZap, Gilberto e seus colegas decidiram inscrever sua apropriação do conceito de DGC no Desafio de Financiamento Comunitário Inicial do DataShift, patrocinado pela Organização Não Governamental internacional CIVICUS. O CocôZap ganhou a competição e o prêmio em dinheiro permitiu que a equipe do data_labe pusesse seus planos em ação. Primeiro, eles começaram a mobilizar os moradores da Maré com o propósito de levantar dados para o CocôZap, treinando participantes interessados em como encaminharem suas descobertas. A equipe também instruiu os colaboradores a divulgarem o número de WhatsApp do CocôZap e a recrutarem mais participantes.
Uma vez que a mobilização para coleta de dados estava encaminhada, o data_labe sediou eventos com foco no saneamento básico e em problemas ambientais na Maré, incluindo dois mutirões de plantio de árvores e coleta de lixo. Mais tarde, a equipe do CocôZap organizou um fórum público para os moradores discutirem problemas de saneamento básico com as autoridades civis, apresentando ativistas locais, membros de coletivos e outras organizações da comunidade, oficiais de saúde pública, assim como representantes da Comlurb e da CEDAE. O fórum foi bem sucedido na criação de uma lista de demandas e soluções para quatro principais áreas de risco para os moradores da Maré, sendo elas lixo e segurança pública, saúde e bem-estar, fornecimento e conservação de água e esgoto e a recuperação da Baía de Guanabara.
Além do financiamento inicial da CIVICUS, o CocôZap recebeu apoio financeiro do Fundo Socioambiental Caixa e da Heinrich Böll Foundation. Ao longo do caminho, o CocôZap também foi beneficiado por parcerias estabelecidas com outras organizações sem fins lucrativos, como a Redes da Maré e a Casa Fluminense. Finalmente, o CocôZap mantém parcerias de pesquisa com a Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e o Departamento de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Por meio dessas parcerias, o CocôZap almeja fomentar diversidade na produção de conhecimento, incluindo nos campos do jornalismo, pesquisa e monitoramento de políticas públicas.
Até o momento, mais de 65 moradores já enviaram dados de saneamento básico ao CocôZap, a maioria dos quais reside nas favelas de Nova Holanda, Rubens Vaz e Parque União. O data_labe também contratou jovens locais para trabalharem como “mobilizadores”, ajudando assim a recrutar colaboradores para o projeto e coletar dados. Um desses mobilizadores, Maykon Sardinha, testemunhou em primeira mão o conflito entre as autoridades públicas em relação à administração de lixo e esgoto na Maré. “O que é feito com o nosso lixo e nosso cocô, por parte do poder público, diz muito sobre como nós favelados somos enxergados pela sociedade”, diz Maykon.
Outra mobilizadora, Gabrielle, da Nova Holanda, participou de um programa de estágio durante três meses com o CocôZap. No primeiro mês, ela recebeu instruções de natureza política, assim como sobre políticas públicas nas favelas. Nos dois meses seguintes, Gabrielle foi às ruas e interagiu com moradores e organizações locais num esforço para aumentar o envolvimento com o CocôZap. Com o passar de seu tempo como mobilizadora, ela se tornou mais atenta às dificuldades que sua comunidade enfrenta quando o assunto é saneamento básico, mas também ao quão frequentemente as conquistas comunitárias passam despercebidas. “O mais impressionante na minha experiência nas ruas foi perceber que os moradores tem consciência sobre o lixo e esgoto e, pouco em pouco, eles fazem pequenas ações com seus vizinhos e mantêm sua rua limpa para as crianças brincarem”, diz Gabrielle.
Gilberto acredita que um dos desafios mais sérios que os moradores da Maré—e das favelas no geral— têm que superar é o racismo ambiental, ou como as políticas relativas ao acesso ao saneamento público mudam de acordo com o local onde o indivíduo mora. “Nas áreas mais ricas da cidade, você tem políticas de coleto de lixo, de distribuição de água e de esgotamento sanitário diferentes das que são feitas em algumas áreas das periferias da cidade”, explica Gilberto, que atribui a disparidade no tratamento a uma política de segurança pública que segrega a favela do resto da cidade. A partir de uma abordagem sistemática e organizada de coleta de dados e produção narrativa, Gilberto e a equipe do CocôZap esperam auxiliar a Maré e outras comunidades a superarem esses estereótipos racistas. Por aproveitar a resiliência dos moradores em continuar seu legado de mobilização comunitária, o CocôZap luta para diminuir a disparidade entre ricos e pobres nos serviços sanitários.
No futuro, Gilberto e o resto da equipe esperam envolver um maior número de moradores da Maré no CocôZap. Gilberto acredita que, com mais dados, o CocôZap vai gerar frutos mais significativos para a comunidade. Uma vez que o CocôZap alcançar um nível mais alto de participação comunitária na Maré, Gilberto espera expandir o projeto para outros lugares. “Eu acho a partir do momento em que [o CocôZap] tiver importância e relevância comunitária, a gente vai conseguir levá-lo para outros lugares, para outras favelas, e para um lugar de fato na política pública”.
*CocôZap é um dos mais de 100 projetos comunitários mapeados pela Comunidades Catalisadoras (ComCat)—a organização que publica o RioOnWatch—como parte do nosso programa paralelo ‘Rede Favela Sustentável‘ lançado em 2017 para reconhecer, apoiar, fortalecer e expandir as qualidades sustentáveis e movimentos comunitários inerentes às favelas do Rio de Janeiro. Siga a Rede Favela Sustentável no Facebook. Leia outros perfis dos projetos da Rede Favela Sustentável aqui. Participe da Rede se inscrevendo aqui.