Tentativas do Estado para controlar favelas do Brasil não vão melhorar a questão habitacional – as próprias comunidades devem tornar-se agentes de mudança. Veja a matéria original publicada no The Guardian aqui.
Em outubro de 2012 cidadãos de todo o Brasil seguiram a notícia de como policiais, apoiados por carros blindados e helicópteros, moviam-se para assumir o controle de duas favelas do Rio de Janeiro notórias por crimes do tráfico de drogas. Esses ataques foram parte de uma política conhecida como “pacificação”, projetada para ajudar as autoridades estaduais a ganhar uma presença maior em favelas do país. Ao mesmo tempo, o Brasil vem tentando “limpar” suas regiões mais perigosas tendo em vista a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.
Não é nenhum segredo que os assentamentos informais são um dos maiores problemas de habitação global, e como a taxa de urbanização continua a subir, ainda vamos enfrentar enormes desafios em nossas maiores cidades. Recentes pesquisas classificaram São Paulo como a 10ª cidade mais cara do mundo, com o Rio de Janeiro na 12 ª posição. Ao mesmo tempo, o Brasil tem até 8 milhões a menos de imóveis residenciais do que precisa, e as comunidades mais pobres sentem o impacto desse déficit habitacional.
Estima-se que mais de 50 milhões de brasileiros vivem em habitações inadequadas. A maioria destas famílias têm renda inferior a um salário mínimo de R$675 (cerca de US$330) por mês. Cerca de 26 milhões de pessoas que vivem em áreas urbanas não têm acesso à água potável, 14 milhões não têm serviço de coleta de lixo e 83 milhões não estão conectados a sistemas de esgotos.
Nós, obviamente, precisamos de algumas soluções para esses problemas o mais rápido possível. Remoções, ou ações estatais para se livrar de favelas, não serão eficazes. Nosso trabalho no Brasil mostrou que só pelo envolvimento das comunidades locais, poderemos atingir uma solução de longo prazo para a crise habitacional. Os habitantes das comunidades precisam se tornar seus próprios agentes de mudança. Esta abordagem pode garantir o direito a uma habitação sustentável e melhorar a qualidade de vida.
Para isso, os profissionais de habitação e o público brasileiro precisam encontrar respostas para dois problemas fundamentais. Em primeiro lugar, é preciso vencer a discussão legal sobre os direitos à terras e a proteção de posse para os grupos mais vulneráveis. Quando os moradores tiverem segurança em sua casa própria, eles estarão mais dispostos a investir na renovação e modernização da habitação existente.
Em segundo lugar, temos de encontrar novas formas de financiar melhorias e reformas nas habitações. Famílias de baixa renda não podem reformar ou reconstruir as suas propriedades em uma única etapa. Eles preferem tomar empréstimos de pequenas quantias e investir em reparos incrementais ao longo do tempo. Uma vez que as principais obras são feitas os residentes quitam o empréstimo inicial, liberando-os para pedir mais e realizar os trabalhos adicionais.
Nós tentamos esse modelo nas favelas de São Paulo. Cada renovação custa cerca de US$3000 (R$6.130,00) por família – uma quantia significativamente menor do que seria necessária para construir uma casa inteiramente nova. Tais melhorias nas casas podem melhorar radicalmente a saúde de uma família e, finalmente, promover um ciclo de desenvolvimento local.
Esta matéria foi escrita por Demóstenes Moraes, Diretor Nacional para o Brasil da Habitat for Humanity e Katerina Bezgachina Gerente de Mídia da Habitat for Humanity Europe e profissionais do The Guardian.