Mais de dois anos após a remoção da Favela Metrô-Mangueira, também conhecida como Favela do Metrô, que começou em novembro de 2010–segundo rumores, para abrir caminho para a construção do estacionamento do estádio Maracanã para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016–o processo brutal continua. E os moradores e o público ainda desconhecem para que o local será utilizado.
Desde que as remoções iniciais começaram, a comunidade uma vez pacífica foi removida em três grupos, dependendo principalmente da disposição dos moradores e da capacidade de resistir à pressão constante da Prefeitura. O primeiro grupo de 107 famílias, muitos sendo idosos e os mais frágeis membros da comunidade, não perceberam que a resistência era sequer uma opção, e foram vítimas das demolições das residências, realizadas pela Prefeitura, aparentemente aleatória a partir da semana de 4 de novembro de 2010. Essas famílias foram transferidas para Cosmos, bairro na Zona Oeste, que fica à 40 km de distância da Favela do Metrô (cerca de 2 horas no transporte público), cortando os laços da comunidade e fazendo com que as pessoas necessitem de muitas hora para chegarem ao trabalho. As famílias que mudaram para bairros distantes também se queixam da falta grave de infraestrutura, incluindo o transporte, serviços de saúde e educação.
Após este primeiro grupo ser removido no Metrô, a maioria dos moradores se determinaram a resistir, elegeram uma nova Associação de Moradores e começaram uma luta para ficar, mas os escombros e carcaças de antigas residências foram deixados no local e os serviços públicos (eletricidade e lixo) foram cortados na área. O resultado: uma infestação de ratos, mosquitos e dengue, um afluxo de usuários de drogas e moradores de rua e um excesso de lixo, incluindo seringas nos detritos que entulham os antigos lotes residenciais. A Prefeitura começou citando preocupações de saúde pública como motivo para mais remoções, e a maior parte dos moradores começaram a concordar que a realocação em local próximo seria melhor dado a este estado de ruína. O segundo e terceiro grupo, depois de uma resistência considerável, com apoio de defensores públicos, a Pastoral das Favelas, grupos de direitos humanos e os meios de comunicação internacional, foram transferidos para novos conjuntos habitacionais, originalmente destinados à habitação de renda média, não para eles, na vizinha Mangueira. Os conjuntos habitacionais são conhecidos como Mangueira I e Mangueira II.
De mais de 700 famílias que viviam nesta comunidade dinâmica, apenas 65 restam hoje. A maioria das famílias restantes não tinham a documentação necessária para se qualificar para a realocação e assim foram deixados para uma rodada final, a quarta do reassentamento. Eles serão realocados em um conjunto residencial que está sendo concluído em Triagem, há duas estações de metrô.
A faixa comercial permanece operacional, mas muitos comércios fecharam. Um ex-residente e determinado resistente, Eomar Freitas, aluga o primeiro, e agora o derradeiro boteco de cerca de uma dúzia que lá existiam, e confirma que o negócio caiu. Além disso, o influxo de moradores de rua e usuários de crack causou um aumento da criminalidade na área. Ao contrário das visitas anteriores feitas pelo RioOnWatch onde Eomar e outros membros da comunidade nos guiaram em torno da comunidade sem medo, desta vez ele nos desencorajou a visitar o que resta da favela, mesmo em plena luz do dia. O que nós vemos da principal área ex-residencial da comunidade agora se assemelha as consequências de uma invasão militar, um deserto completo. Eomar aponta para a parede onde sua casa ficava.
Atualmente, a faixa comercial está com as negociações em curso para recolocação. Os donos das lojas estão sendo obrigados a fazer um curso de formação oferecido pelo SEBRAE, para ajudá-los a se prepararem melhor para gerenciar suas lojas, no que promete ser uma nova faixa melhorada, mas menor, chamada “Parque Linear Automotivo Metrô-Mangueira”. Em outras palavras , a Prefeitura está treinando os comerciantes para administrar seus negócios na nova faixa sem que os comerciantes tenham como certo que terão uma loja.
Quando perguntado sobre sua situação de moradia atual na Mangueira II, onde o terceiro grupo de 248 famílias foram realocados, Eomar diz que está satisfeito com o estado geral do apartamento em si: é maior do que o andar que ocupava em sua casa de quatro andares compartilhada com outros parentes, incluindo sua mãe, que recebeu seu próprio apartamento na Mangueira I. (Embora Eomar é rápido ao contar a estória de como ele teve que dar-lhe o seu lugar na fila porque as autoridades inicialmente disseram que ela não tinha a documentação necessária para realocá-la lá.)
O novo apartamento veio mobiliado e Eomar passou a receber serviços oficiais da Prefeitura, que custa cerca de duas vezes mais que na vida na favela. No entanto, muitas pessoas como Eomar já tinham acesso a tais serviços. Eomar explica, com desgosto, “Eu trabalhei duro para ter o meu carrinho … Eu não quero esmolas… O mobiliário é de qualidade extremamente baixa, o colchão é fino”, como ele mostra com os dedos aberto em alguns centímetros. Além do valor sentimental significativo de sua antiga casa, a sua família que ocupava níveis separados da sua casa de vários andares, agora está espalhada em apartamentos separados através do Mangueira I e Mangueira II. E ele diz que os laços que tinham com sua comunidade foram cortados. Ele não se sente seguro chegando a noite, como ele fazia quando conhecia todos os seus vizinhos. Há pessoas de várias zonas de remoção todos vivendo juntos, e poucos se conheciam antes.
A remoção lenta e brutal que a comunidade Metrô-Mangueira tem experimentado ao longo de quase 2 anos e meio se destaca como o exemplo mais extremo em curso de prática de remoções e demolições nas favelas do Rio. Nenhuma consideração é dada ao trauma psicológico ao testemunhar décadas de investimento na parte de famílias inteiras deixadas como entulho, a importância dos laços comunitários e tradições, e as graves ameaças para a saúde e segurança nesta situação.
Metrô-Mangueira também é um testemunho do poder de resistência, sendo que aqueles que resistiram obtiveram melhores resultados do que teriam se tivessem seguido a vontade da Prefeitura, no fim recebendo habitação nas proximidades. Dito isso, é comum moradores concordarem que se as primeiras 107 famílias não tivessem saído, a comunidade unida poderia ter resistido e vencido. Fomos informados que moradores do grupo original enviados para Cosmos solicitaram à Prefeitura o reassentamento junto aos seus antigos vizinhos nas proximidades, mas esta sugestão foi ridicularizada pelas autoridades.
Para ver slideshow com legendas, clique em ‘Show Info’ no Flickr.