Eleições 2022: Quais São as Propostas das Candidaturas à Presidência da República para a Moradia no Brasil?

Principais candidatos à presidência da República em debate.
Principais candidatos à presidência da República em debate.

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Nesta reportagem especial, o RioOnWatch reúne as propostas do plano de governo registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de todas as candidaturas à Presidência da República, destacando as políticas públicas do plano de governo dos candidatos e das candidatas voltadas ao direito à moradia ou que impactam o cotidiano das favelas.

Apesar do número de favelas no país ter dobrado nas últimas décadas, e de pesquisa preparatória para o Censo Demográfico de 2022 do IBGE revelar que existem pelo menos 13.151 favelas entre 743 municípios em todo o país, nenhuma das onze candidaturas à presidência da República cita as favelas por nome nos planos de governos registrados no TSE.

Na Constituição, o direito à moradia digna emerge da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III), da inserção da moradia entre as necessidades básicas da pessoa humana a serem atendidas pelo salário mínimo (artigo 7º, IV), e da competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para promover programas de construção de moradias e melhorias das condições habitacionais (artigo 23, IX). Inclusive, é da responsabilidade e competência da União—isto é, do governo federal—instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação (artigo 21, XX), entre outros.

O dado foi revelado pelo mapeamento preliminar dos “aglomerados subnormais” (favelas) como preparação para o Censo Demográfico de 2020—que foi adiando para 2022 devido a crise sanitária mundial. Segundo nota técnica do IBGE:

“Os dados estimados de domicílios revelam que, apesar do fenômeno da proliferação de precarização habitacional ser comumente associada aos Aglomerados Subnormais presentes nas grandes cidades como Rio de Janeiro (19,27%) e São Paulo (12,91%), o fenômeno ocorre em grande proporção em cidades pequenas como Vitória do Jari – AP (74%) e em outras capitais da Região Norte como Belém (55,5%) e Manaus (53,37%) e Nordeste, como Salvador (41,83%). Ainda no Sudeste, o Estado do Espírito Santo, além da sua capital, Vitória (33,15%) possui o segundo maior percentual de estimativa de domicílios em Aglomerados Subnormais na escala estadual (26,1%), atrás somente do Amazonas, na Região Norte, com 34,59%.”

Ao todo, foram apresentados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 13 candidaturas para o pleito eleitoral para presidente da República, mas somente onze candidatos seguem na disputa, pois a candidatura de Roberto Jefferson (PTB) foi indeferida—isto é, não foi aceita pelos ministros do TSE, em 1 de setembro, pois ele está inelegível até 24 de dezembro de 2023, por conta da condenação por corrupção em 2012.

Já Pablo Marçal (PROS) teve a candidatura cancelada pelo TSE em 6 de setembro após a confirmação da anulação da convenção do partido, que agora aderiu a legenda à Coligação Brasil da Esperança, que tem como candidato o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

São candidatos e candidatas à Presidência da República: Ciro Gomes (PDT), José Maria Eymael (Democracia Cristã), Felipe D’Avila (NOVO), Léo Péricles (UP), Sofia Manzano (PCB), Soraya Thronicke (União Brasil), Vera Lúcia (PSTU), Simone Tebet (MDB), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).

Um Brasil Sem Teto

O problema da moradia no Brasil não é novo, mas a pandemia escancarou a situação de vulnerabilidade social das famílias brasileiras. Em 2019, pesquisa realizada pela Fundação João Pinheiro apontou que o déficit habitacional em todo o Brasil era de 5,8 milhões de moradias, das quais 79% concentraram-se em famílias de baixa renda.

Segundo levantamento realizado pela Campanha Despejo Zero, entre março de 2020 e maio de 2022, durante a pandemia de coronavírus, mais de 125.000 pessoas foram despejadas em ações coletivas das suas casas e outras 569.000 pessoas estão ameaçadas de despejo em assentamentos coletivos urbanos e rurais. Do total de pessoas despejadas durante a pandemia, estão mais de 20.000 idosos, 21.000 crianças e 75.000 mulheres.

A situação fez com que, em abril de 2021, o PSOL interpôs um pedido de ADPF 828 ao Supremo Tribunal Federal (STF), com objetivo de suspensão dos despejos e remoções. A liminar foi concedida pelo Ministro Luiz Roberto Barroso, reconhecendo a tutela do direito à moradia e à saúde de pessoas vulneráveis no contexto da pandemia.

Com a ADPF 828, que já foi prorrogada três vezes, a Campanha Despejo Zero em conjunto com movimentos sociais e organizações da sociedade civil vêm conseguindo barrar a remoção e despejos de mais de 142.000 famílias em âmbito nacional.

A Campanha Despejo Zero lançou uma carta-compromisso direcionada aos candidatos e candidatas a todos os cargos em disputa nas eleições de 2022 (presidência da República, governadores, senadores, e deputados federais e estaduais). O objetivo é que as candidaturas se comprometam com a defesa dos direitos humanos, especialmente os movimentos de luta por moradia.

Porém, o prazo para a proibição das remoções e despejos garantido pela ADPF 828 terminará em 31 de outubro—um dia após o 2º turno das eleições de 2022. Em dezembro de 2021, segundo cadastros no CadÚnico, eram 158.191 pessoas vivendo nas ruas do Brasil. Em maio deste ano, o número saltou para 184.638. Foi um aumento de 16% em seis meses.

Propostas dos Candidatos sobre Moradia

O RioOnWatch elaborou uma síntese das propostas dos planos de governo registrados no TSE de todas as candidaturas a presidente da República, destacando as políticas públicas voltadas à moradia. Importante ressaltar que o acesso aos demais serviços sociais como saúde, educação e emprego, além do acesso à políticas públicas sociais é atrelado ao território onde cada cidadão se encontra.

No dia 2 de outubro, primeiro turno das eleições de 2022, 156.454.011 eleitoras e eleitores poderão comparecer às urnas para escolher os novos representantes políticos. Neste ano, estão em disputa os cargos de presidente, governador, senador e deputado federal, deputado estadual ou distrital.

Chama atenção que em nenhum plano de governo das onze candidaturas, as favelas do Brasil são citadas de forma direta pelos candidatos, muito menos a necessidade de programas de integração e urbanização de tais territórios, respeitando sua importância para a história nacional.

Luiz Inácio Lula da Silva (PT)

Lula no debate para presidente na eleição 2022No plano do ex-presidente Lula, com 121 pontos, a palavra moradia é citada duas vezes. No item 29, o documento afirma que:

“Nas cidades brasileiras, vivem 85% da nossa população. Retomaremos as políticas de garantia do direito à cidade, combatendo desigualdades territoriais, em direção a uma ampla reforma urbana, reduzindo as desigualdades socioterritoriais e promovendo a transição ecológica das cidades por meio de investimentos integrados em infraestrutura de transporte público, habitação, saneamento básico e equipamentos sociais. Apoiaremos e incentivaremos as cidades criativas e sustentáveis.”

A proposta, refletida no item 30, é retomar a construção programas habitacionais com mecanismos de financiamento adequados a cada tipo de público:

“Voltaremos a ter um amplo programa de acesso à moradia, com mecanismos de financiamento adequados a cada tipo de público. Ter uma moradia digna, proteção primeira da família, é um direito de todos e todas e um requisito para um Brasil desenvolvido e soberano.”

O programa habitacional dos governos Lula, o Minha Casa Minha Vida, foi criado em 2009 para facilitar o acesso à moradia enquanto garantindo um suporte para a economia brasileira durante a recessão mundial. O programa subsidiava a compra da casa própria para famílias de baixa renda e oferecia juros menores no financiamento do imóvel para famílias com renda mensal de até R$9.000. Ao longo dos anos o programa foi enfraquecido. Cada vez com menos verba, um menor alcance e mudança de regras. Ainda assim, o Minha Casa Minha Vida construiu moradias para 5,5 milhões de famílias brasileiras.

Jair Bolsonaro (PL)

Já o plano de governo do presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição, menciona a palavra moradia três vezes. Para acesso ao direito à moradia, o documento cita a continuidade do programa Casa Verde e Amarela (página 31):

“Por meio do programa Casa Verde e Amarela, que promove o direito à cidadania, a fim de universalizar o acesso à aquisição de moradia em áreas urbanas, foi disponibilizada ao cidadão a menor taxa de juros da história para o financiamento de imóveis residenciais, a partir de 4,5% ao ano. O governo reeleito desenvolverá programas visando à capacitação e orientação técnica para elaboração de projetos para investimentos públicos pelos entes federados, com foco nos municípios do interior, com vistas a melhorar a qualidade dos investimentos públicos.”

Porém, nos últimos dois anos o dinheiro destinado pela União ao programa habitacional caiu de R$4,8 bilhões em 2019 para R$2,7 bilhões em 2020, o menor valor desde 2012.

Ciro Gomes (PDT)

Ciro Gomes no debate para presidente na eleição 2022O plano de governo registrado no TSE do candidato Ciro Gomes, no item “Reforma Urbana e Regularização Fundiária” (página 15), afirma:

“Implementaremos um amplo programa de regularização fundiária para garantir a escritura da casa e do terreno para quem hoje vive com medo do amanhã. Outro programa, complementar, irá financiar a reforma de moradias populares, preferencialmente com contratação de mão-de-obra da própria família ou da comunidade.”

Segundo pesquisa Datafolha, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) segue na liderança, com 47%, Jair Bolsonaro (PL), tem 33% e Ciro Gomes (PDT) registrou 7%.

Simone Tebet (MDB)

Simone Tebet, no seu plano de governo, afirma que a moradia é “a real porta de entrada para a cidadania… com tudo o que representa de bem-estar e melhoria de vida, com boas condições de habitação e saneamento“. Ela cita mais duas vezes a moradia prometendo:

“Retomar programas de construção de moradias subsidiadas, voltadas a famílias de baixa renda e mais vulneráveis (atual “faixa 1” dos programas de habitação), sobretudo as lideradas por mulheres, e promover o crédito habitacional para famílias de renda média, com incentivo a moradias com desenho universal e/ou acessibilidade.”

Ela também promete:

“Promover a regularização fundiária, com certificação e documentação dos imóveis, sobretudo em áreas urbanas; (e) criar condições para acelerar o cumprimento de metas de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgotos previstas no Marco Legal do Saneamento.”

José Maria Eymael (Democracia Cristã)

Em seu plano de governo, o candidato José Maria Eymael cita a moradia como um direito social:

“Ter como política de Estado, assegurar moradia para a população economicamente carente. A ausência de renda não pode representar a ausência de moradia.”

Léo Péricles (UP)

Léo Péricles tem um plano de governo de 12 páginas, onde menciona moradia quatro vezes. Ele visa a:

“Garantia de moradia digna, saneamento e coleta de lixo para todas as famílias brasileiras; destinar os imóveis abandonados para resolver o déficit habitacional; realização de uma profunda reforma urbana; (e ainda a) garantia da função social das propriedades urbanas, através de alíquotas progressivas de IPTU, fiscalização e vistorias, combatendo a especulação, para toda a população ter moradia, acesso fácil ao trabalho e ao lazer, e viver com dignidade.”

Sofia Manzano (PCB)

Sofia Manzano traz um plano de governo com 19 páginas traz sete menções à moradia, afirmando:

“Confisco sem indenização os imóveis ociosos nos grandes centros urbanos, aliado a um vasto programa de reforma e construção de habitações populares, de forma a superar o déficit habitacional no período de quatro anos.”

Também propõe:

“Acessibilidade arquitetônica das casas populares, para a garantia de moradia digna às pessoas com deficiência. Construção de centros de moradia independentes para pessoas com deficiência, com trabalhadores em horário integral para oferecer o apoio necessário.”

Soraya Thronicke (União)

Soraya Thronicke menciona a moradia duas vezes ao longo de 76 páginas do seu plano com sua proposta principal para o tema sendo à remoção:

“Implantar, em parceria com governadores e prefeitos uma política real e efetiva de transferência de moradias em áreas onde a convivência com os riscos naturais não é viável, de forma segura; (e) implantar um programa eficaz de fiscalização do uso desordenado e ilegal do solo em áreas de risco.”

Vera Lúcia (PSTU)

Em 26 páginas do seu plano de governo, Vera Lúcia incorpora uma seção sobre a ótica de habitação para todos do, falando da falta de moradia nas cidades e no campo sob uma ótica de política pública citando o déficit da habitação de quase seis milhões:

“Trata-se de um problema emergencial, que afeta duramente a qualidade de vida de uma parte considerável dos trabalhadores”.

Vera completa que as “ocupações de terrenos pela população desesperada, são respondidas com violenta repressão policial”. Promete um “plano de obras públicas para a construção de habitações populares, desapropriação dos imóveis dos grandes proprietários que vivem da especulação imobiliária” e lançar um “programas de empregos e moradia popular voltados às LGBTIs”.

Destaca-se como sendo a única candidata que traz no plano de governo, como fará caso eleita e de onde conseguirá o dinheiro para investir na construção de casas populares:

“(1) Plano de obras públicas para a construção de habitações populares, saneamento básico e obras públicas em todo o país. Esse plano pode absorver boa parte dos desempregados; (2) Defendemos também a desapropriação dos imóveis dos grandes proprietários que vivem da especulação imobiliária. Isso possibilitaria a ocupação desses imóveis por uma parte da população sem teto; (3) O dinheiro para construir essas seis milhões de casas e demais equipamentos públicos necessários à população virá integralmente dos R$ 346,6 bilhões de isenções de impostos que o governo dá todos os anos às grandes empresas; (4) Propomos também a imediata legalização das ocupações de terrenos, com urbanização e saneamento adequados.”

Felipe D’Ávila (NOVO)

Não há qualquer menção a moradia, casas populares ou programa de habitação nas 36 páginas do plano de governo do candidato Felipe D’Ávila registrado no TSE.


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