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O carnaval do Rio de Janeiro é conhecido mundialmente pelos desfiles das escolas de samba na Marquês de Sapucaí e pelos grandes blocos, que arrastam multidões, no Centro e na Zona Sul. Turistas de outras cidades, estados e países ocupam a rede hoteleira, lotam as praias e transitam, fantasiados, por ruas e avenidas dessas duas zonas da cidade e consideram conhecer o carnaval carioca. No entanto, apesar desse ser o carnaval estampado em propagandas, publicidades e que recebe ampla cobertura da grande mídia, o carnaval carioca é muito maior do que isso. A indústria do carnaval muitas vezes aparta a festa de suas origens.
Foi na Zona Norte o primeiro concurso de escolas de samba. Em 1929, Zé Espinguela, fundador da Estação Primeira de Mangueira, abriu sua casa, onde hoje se encontra a Escola de Samba Arranco do Engenho de Dentro, para que os ranchos carnavalescos da época, Mangueira, Conjunto Oswaldo Cruz (hoje Portela), Deixa Falar (primeira escola de samba da história, que deu origem à Estácio de Sá), disputassem o concurso de melhor apresentação carnavalesca. Quase um século depois, acontece um novo movimento semelhante a poucos quilômetros dali, em Quintino Bocaiúva: a Sambúrbio.
Sambúrbio, abreviação da Liga dos Blocos de Rua do Subúrbio do Rio de Janeiro, idealizada em 2022, tem como objetivo revitalizar o carnaval de rua no subúrbio, resgatando seu caráter suburbano e negro e aproveitando o potencial cultural e turístico da região da Grande Madureira, na Zona Norte. O intuito é realizar grandes cortejos carnavalescos, como os de antigamente. Gregório Filho, 57, morador de Quintino e criador da Sambúrbio e dono da Casa de Jorge, reduto do samba no bairro, explica que:
“A ideia de fazer um desfile reunindo blocos de rua suburbanos é dar para a nossa região um outro tipo de lazer. Por isso que a Liga se chama Sambúrbio. O nosso objetivo é fazer com que os blocos do subúrbio tenham mais respeito e mais vida, como têm os blocos da Zona Sul, que possuem investimento público e recebem ajuda de várias entidades. Estamos tentando fazer isso aqui no subúrbio, para dar mais lazer e representar os moradores.”
Na primeira edição da Sambúrbio, em 2022, três blocos do bairro participaram do desfile. O pódio do evento da Liga do Subúrbio teve o Grêmio Recreativo Bloco Carnavalesco (G.R.B.C.) Alegria de Quintino como campeão, Bola Club em segundo lugar e Quem é Corno Me Acompanha em terceiro lugar.
Contudo, além dos troféus do concurso de melhor bloco, o evento concede medalhas às agremiações como prêmios especiais em alguns quesitos. Em 2022, foram contemplados blocos nas seguintes categorias:
- Garra na Avenida (empolgação) ⇒ Alegria de Quintino
- Agremiação do Povo ⇒ Quem é Corno Me Acompanha
- Agremiação da União (fair-play) ⇒ Alegria de Quintino
- Melhor Casal de Mestre Sala e Porta-bandeira ⇒ João Fernandes, também conhecido como “Joãozinho Flusudo”, e Ana Vitória, ambos do Bola Club
- Melhor Intérprete ⇒ Léo Garcia, do Bola Club
- Melhor Samba-Enredo ⇒ Neguinho, Tide, Oswaldo de Quintino, Leandro Rocha e Léo Gargia, do Bola Club
- Melhor Bateria ⇒ Mestre Grelha, do Alegria de Quintino
- Melhor Personalidade ⇒ Flauzina Macedo da Rocha, do Bola Club
Todos os escolhidos em todas as categorias são avaliados por um grupo de jurados escolhidos pela organização. Em geral, esses avaliadores são sambistas de renome da região, que não tenham relação com as agremiações em disputa naquele carnaval.
Em 2023, em sua segunda edição, o desfile da Sambúrbio acontecerá das 15h às 21h, no domingo de carnaval, dia 19 de fevereiro. Os blocos se concentrarão na Rua da República, em Quintino, e realizarão seus cortejos até o coreto do bairro, na praça de mesmo nome. O desfile Sambúrbio 2023 está recebendo apoio da Secretaria de Cultura do Estado do Rio de Janeiro (SMC), que oferece os troféus para os três primeiros colocados e as medalhas para os prêmios especiais. O evento aproveita toda a infraestrutura fornecida pela Subprefeitura da Zona Norte para o carnaval da Praça da República e a Sambúrbio disponibiliza carro de som para os blocos que participam do evento.
A Liga, ainda em crescimento, tem, como meta para 2023, reunir 12 blocos de rua no desfile de 19 de fevereiro. Até quarta-feira, dia 15, haviam sido confirmadas para o desfile seis agremiações carnavalescas: Alegria de Quintino, Bola Club, Quem é Corno Me Acompanha, Vem Mamar, Banda dos Emotivos e Tô na Merda. Destes blocos, só o Vem Mamar não é de Quintino, é da Taquara.
Um dos fundadores do bloco Bola Club, Leandro Rocha, 37, explica a importância da Sambúrbio e de iniciativas que ponham na rua o resgate da memória do samba, sobretudo para os moradores do subúrbio.
“Uma região que tem escolas do porte de Império Serrano e Portela, entre outras menores como Rosa De Ouro, Arrastão de Cascadura e Tradição, não aparece nos roteiros de guias de blocos de rua. Apesar do importante desfile da Intendente Magalhães, o morador do subúrbio, que não tem condições de se deslocar para a Zona Sul, tem poucas opções para brincar o carnaval de rua no próprio subúrbio.” — Leandro Rocha
A organização espera que a Sambúrbio faça parte do roteiro oficial de blocos da cidade do Rio de Janeiro no Carnaval 2024 ou, quem sabe, em um carnaval fora de época ainda em 2023.
“Houve uma proposta da Prefeitura de fazer um carnaval [fora de época] de blocos de rua no sambódromo em julho de 2023 [chamado de CarnaRio]. Não sei em que pé está isso, mas eu defendo que a Sambúrbio, uma vez oficializada, pleiteie a Riotur e que os três primeiros colocados possam desfilar nesse carnaval aí, caso vá pra frente.” — Leandro Rocha
A Sambúrbio ainda não tem rede social ou canais oficiais para contato, assim como muitos dos blocos citados nessa reportagem. Para inscrever seu bloco ou saber mais informações, é necessário entrar em contato com Gregório Filho, idealizador da Liga, através do WhatsApp: (21) 992179950.
Sobre o autor: Felipe Migliani é formado em Jornalismo pela Unicarioca e tem especialização em jornalismo investigativo. Atua como jornalista independente e repórter freelancer nos jornais Meia Hora e Estadão. É colaborador do Coletivo Engenhos de Histórias, que investiga e resgata histórias e memórias da região do Grande Méier, e do PerifaConnection.
Sobre a artista: Natalia de Souza Flores é cria da Zona Norte e integrante das Brabas Crew. Formada em Design Gráfico pela Unigranrio em 2017, trabalha como designer desde 2015. Lançou a revista em quadrinhos coletiva ‘Tá no Gibi’, em 2017 na Bienal do Livro. Sua temática principal é afro usando elementos cyberpunk, wica e indígena.