Eleições Rio 2024: O Que Pretendem Os Prefeitáveis Para As Favelas?

Moradores da Rocinha cruzam a passarela de acesso à favela nodia da votação do segundo turno das eleições 2022. Foto: Alexandre Cerqueira/RioOnWatch

Esta matéria faz parte de uma série sobre as eleições de 2024, com enfoque nas perspectivas das favelas do Grande Rio.

“Todas as favelas, a cada eleição que entra, ficam esperançosas de mudanças dentro da comunidade… A favela pode e deve esperar do governo municipal políticas públicas.”

É assim que Ronaldo Rozendo, mestre em geografia e morador do Morro do Cruz, na Tijuca, Zona Norte do Rio, o coordenador do projeto Favela Viva, observa o período eleitoral. Segundo ele, é sempre a mesma coisa, uma verdadeira política do cansaço. Diversos veículos de comunicação comunitária reportam o que a favela quer e precisa. Mas e os candidatos à prefeitura: o que pensam para as favelas?

RioOnWatch analisou declarações e planos de governo dos três candidatos mais bem colocados nas pesquisas de intenção de voto entre todos os candidatos à prefeitura, descritos abaixo na ordem de quem mais trouxe propostas para as favelas. Em uma cidade com 1.074 favelas, uma população favelada de pelo menos 1,4 milhão, totalizando no mínimo 22% do número de habitantes da capital, segundo o IPP, entender o que os prefeitáveis pensam sobre as favelas é fundamental.

Tarcísio Motta (50)

Tarcísio Motta. Foto: Will Shutter/Câmara dos Deputados
Tarcísio Motta. Foto: Will Shutter/Câmara dos Deputados

Tarcísio Motta (PSOL) é o que apresenta mais propostas para as favelas. Sendo uma das primeiras ações em seu programa de governo, ele pretende criar o programa Habita Rio, que visa “combater a especulação imobiliária, reduzir o déficit habitacional da cidade e oferecer uma moradia digna para pessoas em situação de rua”. Ele quer promover uma política de urbanização das favelas, por meio do programa Favela é Cidade. “Vamos investir em obras de saneamento ambiental nas favelas, para garantir água limpa e esgoto tratado nas comunidades, oferecendo vagas de trabalho para os moradores dos locais onde forem realizadas as obras”, diz o documento. 

O candidato também quer “reforçar a estratégia Saúde da Família nos bairros e ampliar a rede de Agentes Comunitários de Saúde nas favelas”. Ainda sobre saúde, Motta quer zerar a taxa de tuberculose na cidade, a começar pela Rocinha, que concentra a maioria dos casos. No campo da tecnologia, a proposta é criar o programa Rio Digital, que visa lançar, até 2028, um sistema de internet 5G sem fio no município, gratuitamente. Para assistência social e habitação, ele pretende “integrar o trabalho dos profissionais da assistência social às políticas habitacionais da prefeitura, e em especial, aos serviços prestados nas favelas pelos Postos de Orientação Urbanística e Social (POUSO)”. O candidato também quer investir em obras de saneamento ambiental, começando pelas favelas.

Na área de trabalho e renda, Motta colocou em seu programa de governo “incentivar e oferecer condições para a organização produtiva de mulheres em condições de vulnerabilidade social em suas localidades”. No campo da segurança pública para as favelas, o candidato pretende “repudiar a política de ocupação e gestão militar de favelas e bairros populares por parte do Governo do Estado”. Quando o assunto é pavimentação, o programa de governo indica que haverá “reformas nas ruas, calçadas, praças e parques para garantir a ampliação da iluminação pública, a retirada das grades e o aprimoramento da acessibilidade”, além de “promover a ocupação cultural das praças e parques”.

Por meio da sustentabilidade, Motta quer criar um “Programa Municipal de Pontos de Inovação Sustentável para distribuir bolsas e premiações para pequenos projetos de sustentabilidade já existentes nas favelas e periferias da cidade”. Para desastres socioambientais, o programa de governo traz a ideia de elaborar uma Cartografia de Riscos Hidrológicos e expandir a Cartografia de Riscos Geológicos da cidade; em gestão, fortalecer o Fundo Municipal de Saneamento, orientando dotação específica para investimento em favelas; ampliar a tarifa social para os serviços de abastecimento de água; implementar uma tarifa social para os serviços de esgotamento sanitário.

Sobre resíduos sólidos, Motta, se eleito, quer criar programas específicos de coleta seletiva e limpeza urbana nas favelas. Tem o objetivo de descentralizar investimento público no fomento direto e indireto; garantir que a política de fomento tenha linhas específicas que contemplem linguagens artísticas e manifestações culturais tradicionais da cidade, em especial nas favelas e periferias.

No campo do audiovisual, “Fortalecer a RioFilme para apoiar a produção e distribuição de obras audiovisuais na cidade, como foco no estímulo à formação de novos realizadores no campo audiovisual, em especial, nas favelas e periferias da cidade”. E, para os protetores de animais, o candidato quer “projetos de assistência social, econômica e educacional ao segmento de protetores de animais em situação de vulnerabilidade, principalmente nas favelas e em áreas próximas a unidades de conservação ambiental”.

Eduardo Paes (55)

Eduardo Paes. Foto: Leo Martins / Agência O Globo
Eduardo Paes. Foto: Leo Martins / Agência O Globo

Atualmente, a cidade do Rio está sob a gestão de Eduardo Paes (PSD), que está em seu terceiro mandato e segue liderando as pesquisas, com 57% das intenções de voto para um quarto mandato.

Segundo as propostas de governo de Paes, depositadas no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a favela está entre os oito objetivos centrais do prefeito. Se eleito, ele pretende “seguir ampliando os investimentos sociais e infraestruturantes, sobretudo nos bairros da Zona Norte, Oeste e nas comunidades e favelas do Rio, sempre visando melhorar a qualidade dos serviços públicos, recuperar a infraestrutura já existente e criar frentes de trabalho para gerar emprego e renda para a nossa população mais economicamente vulnerável”.

Ainda de acordo com o documento, o candidato visa “ampliar a cobertura dos programas Morar Carioca e Bairro Maravilha em toda a cidade; promover melhorias habitacionais em 20.000 moradias de famílias identificadas em situação de vulnerabilidade social pelo programa Casa Carioca; criar o programa HUB Favela Empreendedora, de apoio e suporte aos empreendedores das favelas e comunidades da cidade”. Paes também diz querer ampliar o Programa de Capacitação Profissional voltado para o empreendedorismo feminino em comunidades e bairros com elevado índice de vulnerabilidade econômica.

Alexandre Ramagem (22)

Alexandre Ramagem. Foto: Divulgação Marcos Oliveira/Agência Senado
Alexandre Ramagem. Foto: Divulgação Marcos Oliveira/Agência Senado

Alexandre Ramagem (PL), por sua vez, não cita a palavra favela em seu programa de governo. Lá diz que “nossas comunidades precisam de atenção prioritária. Lá vivem milhares de famílias, de trabalhadores e trabalhadoras de bem, da nossa juventude”. De acordo com suas propostas de governo, ele quer criar o programa Habitação Carioca e Comunidades, que “foca na necessária regularização fundiária, a melhoria urbana e o fortalecimento de programas sociais nas comunidades”.

Para a segurança pública, o candidato diz que “é fundamental que a prefeitura esteja engajada na segurança pública não apenas por meio da presença física, mas também por meio de programas de prevenção à violência, de apoio às comunidades vulneráveis e de incentivo à participação cidadã”. Na educação, propõe o programa Bora Aprender de ensino integral: “Vamos oferecer turnos de no mínimo sete horas a todos os alunos da rede pública e turno integral, de dez horas, nas comunidades mais vulneráveis. Também providenciaremos a presença de psicólogos e assistentes sociais nos quadros das escolas da rede pública municipal”.

Já em relação a esportes, o projeto de governo prevê a criação do programa Esporte na Veia, que será “em áreas vulneráveis e estará focado em melhorar a infraestrutura, potencializar os recursos humanos das vilas olímpicas e criar espaços esportivos em comunidades”. Em cultura, se eleito, Ramagem quer criar o programa Cultura Carioca, que vai proporcionar capacitação de profissionais de comunidades para escolas de samba e outros programas de formação contínua para artistas, técnicos e gestores culturais, possibilitando atualização constante e a empregabilidade no setor”.

O Que As Favelas Esperam do Novo Prefeito

Jovino Neto é missionário na organização Jovens com Uma Missão, presente no Borel há mais de 25 anos. Ele diz que o novo governo precisa olhar para questões como saneamento, habitação e ampliação das vias:

“As ruas do Borel nós só temos uma via que sobe. Não é possível descer lá pela Grota, pela Rua Nova [localidades da favela]. Tinha um projeto em 2014 de indenização das casas e ampliação da rua, mas esse projeto não foi à frente.”

Ele também afirma que determinadas ações são necessárias nas favelas, a começar pela juventude:

“Não houve nenhum programa voltado para a juventude para a formação profissional ou despertando a expectativa do que eles pensam em relação ao futuro. Se vier, será muito bom.” 

Em relação ao que as favelas podem esperar de um governo municipal eleito, Jovino diz que um diálogo real entre o poder público e as favelas é o melhor caminho. “Poderia fazer um colegiado de diálogo dos presidentes de associações com os subprefeitos. Cada região poderia colocar as demandas, que vão desde a educação infantil, saneamento, saúde, segurança, meio ambiente, emprego e renda.” 

Ronaldo Rozendo, do Morro do Cruz, também concorda com Jovino e diz que serviços básicos são ações primordiais em favelas. “Dentro dos desafios, estão a questão da infraestrutura, saúde, educação, segurança, participação comunitária, regularização fundiária, emprego e renda, cultura e lazer, políticas habitacionais. São esses os principais assuntos que o prefeito tem que tratar com a favela.”

Os entrevistados fazem coro à questão das habitações em favelas. “Como morador de comunidade, eu vejo a falta de infraestrutura como uma das ações que mais assolam as comunidades, as periferias, as favelas. Falta de uma infraestrutura e de segurança nas habitações”, complementa. O líder comunitário vê a ausência de aparelhos de cultura e lazer, frutos da negligência do Estado. “Parece que não dão a devida importância para esse tópico nas comunidades e faz bastante falta”, conclui.

Sobre o autor: Igor Soares é cria do Morro do Borel e jornalista pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atualmente contribui com o #Colabora e atua como freelancer. Tem experiência em cobertura de cidades, direitos humanos e segurança pública, já tendo passado pela redação do Estadão, do Portal iG e produzido reportagens para a Folha de São Paulo.


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