Essa matéria é uma contribuição ao Blog Action Day 2013, uma reflexão de blogueiros de todo o mundo sobre o tema desse ano, Direitos Humanos.
Ao longo dos últimos anos tem havido muitos protestos e movimentos sociais sob o slogan ‘direito à cidade’, desde moradores de conjuntos habitacionais em New Orleans que desejam recuperar seus bairros antigos a berlinenses lutando contra a demolição da última parte restante do muro de Berlim para a construção de apartamentos de luxo, ou no Rio de Janeiro com as lutas de moradores resistindo às remoções para as preparações para a Copa do Mundo do ano que vem e das Olimpíadas de 2016. Estas questões concernem ao direito à cidade. Mas o que esta frase realmente significa? O que é este “direito”? Todos têm direito a tal? Por que é importante?
A origem da ideia
O conceito foi desenvolvido pelo sociólogo francês Henri Lefebvre em seu livro de 1968 Le droit à la ville. Ele define o direito à cidade como um direito de não exclusão da sociedade urbana das qualidades e benefícios da vida urbana. No texto Lefebvre escreve sobre a segregação sócio-econômica e seu fenômeno de afastamento. Ele refere-se à “tragédia dos banlieusards”, pessoas forçadas a viver em guetos residenciais longe do centro da cidade. Perante este cenário, ele exige o direito à cidade como uma recuperação coletiva do espaço urbano por grupos marginalizados que vivem nos distritos periféricos da cidade. Na década de 90 as idéias de Lefebvres foram retomadas nas áreas de geografia e planejamento urbano, e se tornou o slogan de muitos movimentos sociais.
Hoje, a cidade centrada no mercado é o foco, incluindo novos métodos de produção e novas formas de segregação e exclusão. Há uma ausência de participação na formação da cidade por aqueles que foram excluídos do desenvolvimento econômico, para aqueles que foram deslocados por meio de gentrificação ou para aqueles que estão sofrendo com políticas de imigração excludentes. Os teóricos sociais David Harvey e Margit Mayer delinearam a demanda por direito à cidade como uma espécie de pedido para todas as pessoas que vivem na cidade.
De acordo com Harvey: “O direito à cidade é muito mais do que a liberdade individual para acessar os recursos urbanos: é o direito de mudar a nós mesmos, mudando a cidade. Aliás, com frequência, não se trata de um direito individual uma vez que esta transformação depende, inevitavelmente, do exercício de um poder coletivo para remodelar os processos de urbanização. A liberdade de criar e recriar nossas cidades e a nós mesmos é, eu quero argumentar, um dos mais preciosos e dos mais negligenciado dos nossos direitos humanos”.
O que isso significa?
O direito à cidade não é para ser entendido como um direito legal individual. Muitas vezes, é visto como uma utopia social e como reivindicações coletivas inspiradas em idéias e sugestões de movimentos sociais para um mundo melhor. Este é um slogan para os movimentos em todo o mundo, que lutam contra as manifestações de muitas cidades modernas, em que os processos e serviços públicos foram privatizados e onde o desenvolvimento é impulsionado principalmente se não exclusivamente por empresas e mercados. Gihan Perera, co-fundador do Right to the City Alliance, descreve-o como :
O direito à cidade é sobre o poder para a classe trabalhadora, para as pessoas de cor, para os imigrantes, os jovens e para todos os outros comprometidos com uma sociedade verdadeiramente democrática. Uma sociedade onde todos os habitantes da cidade têm o poder de moldar as decisões e as condições que afetam nossas vidas. Lutamos por melhorias concretas que resultam em comunidades mais fortes e um melhor estado de ser para os nossos amigos, familiares e para o futuro dos nossos filhos. Nossas organizações defendem campanhas para a conquista de habitação, educação, transporte e emprego. Lutamos por uma comunidade segura e segurança, sustentabilidade do bairro, justiça ambiental e direito à cultura, celebração, descanso e espaços públicos. Estes são os resultados relevantes das nossas lutas para ter de volta a cidade. Estes são os objetivos que emolduram o direito à cidade.
O Direito à Cidade no Rio de Janeiro
No Brasil, o Estatuto da Cidade de 2001 inscreveu o direito à cidade na lei federal. No entanto, no contexto das rápidas transformações em curso no Rio em preparação para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 e a falta de participação pública nestas transformações, o direito coletivo à cidade está seriamente comprometido. Os moradores de favelas são especialmente afetados, com milhares de pessoas enfrentando a ameaça de remoção, passando por remoção ou que já foram removidos de suas casas. Em protestos e debates por toda a cidade, os moradores do Rio estão questionando até que ponto a sua cidade está sendo modelada sem eles e para os outros.