Em 2003, Presidente Luiz Inácio “Lula” da Silva lançou o programa Bolsa Família para promover progresso social entre famílias de baixa renda. Este e outros programas foram implementados em um esforço para diminuir a infame elevada desigualdade social no Brasil. Na época o Brasil ocupava anualmente o primeiro, segundo ou terceiro lugar entre os países mais desiguais do mundo. Incorporando o que antes eram quatro programas distintos sob a égide do Ministério do Desenvolvimento Social, o programa social Bolsa Família tornou-se conhecido como um dos mais bem sucedidos na redução das taxas de pobreza não só no Brasil, mas em todo o mundo. A ampla avaliação positiva do Bolsa Família levou à sua expansão em 2008, e hoje cerca de 22 milhões de famílias recebem seus benefícios. Hoje, o Brasil ocupa a posição de décima sétima economia mais desigual.
O que é o Bolsa Família?
O Bolsa Família fornece um subsídio de renda básica para as famílias mais pobres em todo o país. O programa fornece uma transferência direta de renda, de forma condicional, estimulando um alívio imediato da pobreza, enquanto as outras condições, como a estipulação de que as crianças devem estar matriculadas na escola e não podem perder mais de 15% de suas aulas, combatem à pobreza em longo prazo. Como resultado, o programa combate à pobreza, enquanto promove simultaneamente o acesso a serviços públicos, como educação e saúde.
Como Funciona
A participação no Bolsa Família é baseada na renda de uma família. Aqueles que se qualificam passam a receber uma quantidade específica de apoio financeiro no cartão Bolsa Família. Este cartão só pode ser usado para retirar essa quantia especificada de dinheiro em um determinado banco, e só pode ser recebida pelo chefe da família, sendo dada a preferência à mulher da casa (mãe ou avó). O benefício de cada família depende do tamanho da família, idade das crianças, e renda total da família. Como a política visa estimular o uso de serviços de educação e saúde, os benefícios podem ser revogados se, por exemplo, o registro de freqüência escolar de uma criança não cumprir as normas.
O que os Beneficiários Dizem
Conversando com presidentes de associações de três favelas do Rio, diferentes umas das outras, a reação global para o programa foi extremamente positiva. No entanto, enquanto os beneficiários elogiam o sucesso, as lideranças comunitárias são mais críticas em relação ao potencial de redução da pobreza em longo prazo.
Fogueteiro
Localizado em Santa Teresa, no centro do Rio, Fogueteiro é uma comunidade que tinha uma história violenta com o tráfico de drogas antes de receber a 15a UPP, em fevereiro de 2011. A comunidade começou a ter acesso aos benefícios do Bolsa Família quando o programa foi lançado em 2003. Cíntia Luna, presidente da Associação de Moradores do Fogueteiro, estima que hoje cerca de 70% das famílias da comunidade recebem benefícios. Segundo ela: “O acesso é difícil e muito fácil ao mesmo tempo. É fácil se a renda qualifique, mas têm pessoas que necessitam do Bolsa Família, e porque tem renda de 20 ou 30 reais acima, elas não estão enquadradas para receber o Bolsa Família”. Ela critica a rigidez do sistema que tanto pode ser impossível de acessar, ou ser tão simples para se cadastrar, entre duas famílias com renda mensal quase idêntica. Embora frustrada com essa divisão rigorosa, ela aplaude o sucesso do programa em ajudar uma elevada percentagem da comunidade. Cíntia também reflete sobre o principal objetivo da política, o de combater à pobreza. Cíntia menciona que alguns moradores abusam do programa. Em sua opinião, um bom número de pessoas buscam a renda do Bolsa Família como um substituto para o emprego, fomentando uma dependência do apoio do governo.
Cíntia também reconhece os benefícios do desenvolvimento da Bolsa Família, louvando a ênfase do programa sobre a frequência escolar. A freqüência escolar aumentou substancialmente no Fogueteiro. Ela considera a motivação monetária para educar a nova geração um pouco inquietante, porém: “O Bolsa Família foi a forma que o governo forçou a educação. Alguns não tem interesse em educar as crianças então o governo paga para haver o interesse. Agora eles têm algum interesse em educar os filhos”.
Asa Branca
Localizada na Zona Oeste do Rio, Asa Branca recebeu recentemente investimentos do município em infra-estrutura e é uma comunidade pacífica e plana que fica perto do futuro Parque Olímpico. O Presidente da Associação de Moradores, Carlos Alberto “Bezerra ” Costa tem apenas comentários positivos em relação ao Bolsa Família.
Imediatamente após o lançamento, em 2003, aqueles que se qualificaram receberam o benefício pretendido, e hoje, Bezerra estima que 80% dos moradores da Asa Branca recebem o benefício do programa. Os 20% restantes, ele afirma, ou melhoraram com sucesso nas suas situações econômicas ou nunca precisaram da assistência. Bezerra também aponta um grande aumento na mobilidade social: ele próprio pediu para deixar de receber o subsídio mensal, já que para ele não é mais necessário o apoio extra. Ele diz: “Não é uma coisa que queremos, estar desempregados. Queremos trabalhar. O que o Bolsa Família e outras bolsas da governo nos dão é para girar as coisas”, continua ele, orgulhosamente enfatizando os efeitos que o programa teve sobre a geração mais jovem: “Realmente, hoje por causa da implementação do Bolsa Família, que exigi que as crianças estejam na escola, isso melhorou muito. A gente não têm mais crianças todo dia na rua, isso mudou muito. Os pais fazem questão de manter o filho na escola”.
A partir da sua perspectiva, Bezerra reflete sobre uma visão geral do Bolsa Família, que é difundido pela imprensa nacional e internacional. De acordo com um artigo de 2010 do Economist: “É de comum acordo, que o programa de transferência de benefício condicional tem sido um sucesso impressionante e é muito popular… E nas palavras de um ex-presidente do Banco Mundial, é um ‘modelo de política social eficaz’ que tem sido exportado para todo o mundo”. O programa, efetivamente, conseguiu reduzir os níveis de pobreza, dado que o número de famílias pobres (renda mensal inferior a R$800) caiu mais de 8% em uma base anual desde 2003. No entanto, o Presidente da Associação de Moradores de Pica Pau, Irenaldo Honorio da Silva, oferece uma perspectiva diferente sobre o verdadeiro impacto do Bolsa Família.
Pica-Pau
Pica-Pau, uma favela na Zona Norte do Rio de Janeiro, com problemas significativos de infra-estrutura, a qual também foi prometida recentemente a urbanização através do programa municipal Morar Carioca que está parado. O Bolsa Família, por outro lado, introduzido na comunidade em torno de 2009 (após a expansão de 2008), tem sido bastante firme em seu apoio à comunidade. De acordo com Irenaldo: “Hoje quem necessita vai receber. Se não recebe, é por falta de documentação, ou porque os filhos não vão para escola. É problema da família, isso é minha opinião. Você quer receber Bolsa Família, você vai receber”. No entanto, de acordo com Irenaldo, apenas 40% das famílias do Pica-Pau recebem o Bolsa Família. Isso pode ser devido a vários fatores, entre eles a relativa novidade do programa e, portanto, a falta de consciência, ou baixos níveis de escolaridade.
Quando perguntei diretamente quais são os problemas existentes com o Bolsa Família, Irenaldo afirmou que o programa falha por não educar suficientemente a comunidade: “Sabe quantas crianças estão na escola hoje, que não podem ler nem escrever? Quantas sabem ler e escrever, na quarta série? Não sabem como escrever seu nome! É um problema do sistema de educação no Brasil. Uma criança não deve estar sentado na cadeira mesmo o dia inteiro. Tem que ter uma mudança. Você vai ter aula disso, de música, de teatro, de esporte. ‘Eu sei cantar!’ ‘Pois canta aí’. ‘Quero tocar instrumento’, então vamos tocar um instrumento. Tem que estimular a criança, dá-lhe razão para ir a escola”.
Irenaldo defende a necessidade de educar não só crianças, mas a família como um todo. Ele destaca dois pontos: “Precisamos de educação, mas não só educação dos filhos. Todos precisam de educação: a mãe e o pai. Temos mães de 13 anos. Uma mulher com 20 anos sem filho é raro. Você quer acabar com o pobreza, aumenta educação e a cultura… Um país que investe em educação e cultura, é um país rico. Um país que não tem, é um país pobre, miserável”. Promover a educação no Brasil vai permitir que a geração futura interrompa o ciclo da pobreza, e promova uma cultura de desenvolvimento para a situação sócio-econômica em que vive.
Não só Irenaldo mostra que há uma lacuna educacional na comunidade, ele também critica a falta de educação financeira: “Para ser franco, você acha que realmente compram o que realmente tem que comprar? Não compram. Acha que essas pessoas estão mantendo essas crianças, realmente, porque recebem Bolsa Família? Se vê na comunidade crianças descalças!” Devido ao Bolsa Família e outros programas de assistência do governo, continua: “As pessoas ficam cômodas, dependentes, desestimuladas. Porque a pior coisa do mundo é quando você é desestimulado… Se você não estimula as pessoas, não haverá mudança na situação delas”. A avaliação de Irenaldo ultrapassa o alívio imediato que o Bolsa Família pode apresentar, e reconhece o verdadeiro problema subjacente em comunidades desafiadoras: “Tem que mudar o pensamento das pessoas. Tem que mudar o sistema de educação. Isso tem que melhorar”.
As estatísticas indicando o sucesso do Bolsa Família não podem ser ignoradas. O Bolsa Família tem ajudado milhões de pessoas a enfrentar condições econômicas terríveis e, simultaneamente, promove serviços sociais. Ele reduziu a desigualdade em todo o Brasil (veja linha verde clara no gráfico). Irenaldo ainda aponta para uma limitação: a qualidade da educação, para os alunos já matriculados na escola, precisa melhorar, como evidenciado por recentes relatórios que constam que o analfabetismo no Brasil aumentou pela primeira vez desde 1998. A amplitude da educação, também, deve alcançar a comunidade como um todo, a fim de alcançar o desenvolvimento sustentável das comunidades. Sem um forte sistema educacional, o Bolsa Família pode vir a não conseguir atingir sua meta de redução da pobreza em longo prazo. No Rio de Janeiro, apesar do acesso ao Bolsa Família, a desigualdade não diminuiu (veja a linha turquesa no gráfico), o que vai contra a tendência nacional, o que é particularmente preocupante.